O que me preocupa, para além do episódio Miguel Sousa Tavares, é que para as instituições é muito mau quando o Presidente da República se encontra num contexto em que é possível que as pessoas lhe chamem nomes que não são mero ataque político, não é apenas a discrepância política, é uma coisa que é insultuosa. Porque depois, de repente, o diálogo democrático torna-se praticamente impossível.
Marcelo tem toda a razão: quando o Presidente da República passa a ser objecto de insultos generalizados algo está podre do reino da Dinamarca ao reino da Madeira. Mas, e não por acaso, foi preciso elegermos a figura mais importante da direita para vermos a Presidência da República conspurcada ética e politicamente para além do que pudéssemos imaginar nas eleições de 2006 e 2011. Acresce que o titular do cargo é um activo agente de suporte a um Governo que faz do empobrecimento fanático e do crescimento da miséria o seu programa político, pelo que ver a revolta popular a apontar impropérios na sua direcção será tão fatal como ver os rios a correrem para o mar.
Descontemos a situação e fiquemos pelo porta-voz da moralidade apregoada. Marcelo é um dos mais poderosos influenciadores da opinião pública, correspondendo esse poder a uma posição sem paralelo onde faz semanal, ou diária, propaganda ao serviço dos interesses do PSD e da oligarquia. Será que este passarão exige de si a decência que reclama ao povoléu? É ler:
Ele teve sorte e tirou proveito disso. É o que se chama o chico esperto. Fez um curso mais facilmente que o comum dos mortais e na casa comprou a mesma casa, que os outros compraram mais cara, mais barata.
Marcelo Rebelo de Sousa considera que José Sócrates tem “uma relação difícil com a verdade”.
O antigo líder social-democrata disse ontem, na RTP, que “é muito difícil manter um mentiroso como primeiro-ministro, mas a situação do país impõe-no”, sublinhando que “está tudo mal explicado” na história de José Sócrates.
Sócrates é daqueles cães que filam as canelas.
Corrupto, mentiroso e cão raivoso. Eis o que a prédica domingueira lhe permite dizer de um primeiro-ministro em funções, sem que se apanhe a contas com berbicachos no Ministério Público ou veja reduzido o cheque milionário com que se faz cobrar como super-vedeta da política-espectáculo.
Tenho especial admiração pelo topete de usar o insulto canino. Estamos perante um picanço daqueles que estão a chamar imediata resposta a punho e pontapé na falta de bengalas por perto. É que enquanto o vocábulo “palhaço” contém uma bonomia que, ao limite, ainda mantém uma ligação simpática, ou até empática, com o alvo, já “cão” transporta uma herança ancestral de absoluto desprezo que vem das profundezas da Idade Média e da mourama. Marcelo conseguiu assim dizer, para milhões de espectadores, que Sócrates era um filho da puta da pior espécie – ou seja, um cão que fila as canelas.
Marcelo, é o seu trabalhinho, nunca se inibiu ao longo do tempo em que Sócrates governou de explicar que a posição do Presidente da República era sui generis pois podia atacar o Executivo e o PS sem temer represálias, dada a punição popular usual para quem respondesse na mesma moeda ao Chefe de Estado, símbolo impoluto da unidade nacional. Isto era dito com um sorriso rasgado e constituía-se como público apelo para que Cavaco liderasse a oposição. Cavaco nunca se fez rogado, nem de tal motivação precisaria, tendo merecido o aplauso de Marcelo aquando do comício da tomada de posse em 2011, passando Marcelo a louvar-lhe o empurrão decisivo para derrubar Sócrates. Contudo, ainda mais obsceno é o branqueamento do Professor ao outro Professor, ocorrido no momento em que a Inventona das Escutas tinha sido desmascarada e havia que rapidamente conter os danos e salvar a face a Cavaco. Foi assim, fica como ex-líbris da palhaçada que é a direita portuguesa:
Marcelo Rebelo de Sousa considera que o caso das alegadas escutas do Governo a Belém não passa de um «equívoco» que se resolve com um «puxão de orelhas» ao assessor, que terá sido a fonte da notícia.
ou a cicuta marcelinha da democracia.
Apesar de na segunda vez não ter votado no Eng Sócrates por ter discordado das políticas do seu primeiro governo sempre me fez espécie os insultos pessoais que lhe fizeram e vem agora o marcelinho armado em virgem falar dos insultos a múmia.
Este excelente texto de Valupi traz-me à memória a veemência de Almada Negreiros e o desejo de mais uma vez gritar com ele esta a esperança:
“PORTUGAL, PORTUGAL INTEIRO HA-DE ABRIR OS OLHOS UM DIA – SE É QUE A SUA CEGUEIRA NÃO É INCURÁVEL – E ENTÃO GRITARÁ COMIGO, A MEU LADO, A NECESSIDADE QUE PORTUGAL TEM DE SER QUALQUER COISA DE ASSEADO!”
Esperemos que a sua cegueira não seja incurável, coisa de que cada vez estou menos certo!
poderia marcelo ter referido a gigantesca manifestação frente aos jerónimos, no sábado passado, que não foi junto ao palácio de belém vá-se lá saber porquê; mas onde se exigiu a demissão de um presidente que, apesar das seis maiorias absolutas que logrou alcançar — sempre com a prestimosa ajuda de marcelo — aparenta não ser capaz de desempenhar a liderança de que se viu investido, em época assáz ajustada às qualidades de um winston churchill; pois a teoria da probabilidade prevê, neste e noutros casos de mecânica repetição, que quem mais petisca mais arrisca;
poderia também o comentador tentar explicar a razão por que este presidente, qual von hindenburg face ao führer, prefere contemporizar com as trapalhadas de coelho e de gaspar, em vez de lhes exigir apenas o que é muito bonito: respeitinho; aliás, foi só por isso que o sátiro, com o faro no descrédito de que o nosso eleito se viu banhado, o filou com tão feroz ataque pessoal;
poderia, por fim, nos dizer o motivo por que há uma maioria sociológica de portugueses que, a coberto do anonimato das conversas de rua, dirige ao chefe de estado infâmias bem mais suculentas, quiçá inspiradas numa longa tradição que remonta ao poeta bocage…
como dizia a minha avó: para se ser respeitado, é preciso saber-se dar ao respeito.
ouvir o afilhado de marcelo caetano, é motivo suficiente, para mobilizar milhares de saudosos do antigo regime!