É uma das frases feitas já não se sabe por quem essa de que os publicitários pavoneiam conseguir vender políticos aos eleitores com a mesma facilidade, ou as mesmas técnicas, com que vendem sabão aos consumidores. Colhe lembrar que as frases feitas nunca o teriam sido caso fossem irredimíveis e completos disparates. Esta na berlinda é um completo disparate, sim, mas não dos irredimíveis. Há nela a mesma verdade que se encontra na ideia de que uma costureira pode fechar feridas de guerra com o mesmo jeitinho e à-vontade usado para fazer bainhas em calças de ganga.
A publicidade é alvo de uma antipatia ideológica que a vê como braço armado do capitalismo – portanto, do imperialismo – ou do consumismo – portanto, do capitalismo – ou da alienação – portanto, do consumismo. E por aí fora. Extremidades de esquerda e de direita podem convergir no mesmo anátema, causticando a modernidade e suas modernices na forma dos simpáticos e apatetados anúncios. E uma das maiores críticas que muito boa gente faz à indústria dos reclames é a de ela criar necessidades, de influenciar a sociedade através da geração de carências. Ora, estaria tudo muito certinho não fora dar-se o caso de ser inconcebível uma indústria publicitária desligada de uma cultura, uma economia e uma moral – ou várias.
O publicitário é um especialista em antropologia prática. O seu talento depende de saber um pouco de tudo e de tudo um pouco. No mesmo dia pode ser desafiado para entender de rajada o problema de um refrigerante, de um banco ou de um preconceito. Em qualquer um deles será julgado pela relevância, originalidade e eficácia da sua solução. E a qualquer momento corre o risco de ser descoberto como a fraude que, inevitavelmente, ele é. Mas, enquanto durar o simulacro de talento, o publicitário consegue tocar sete instrumentos e animar a dança dos felizes gastadores.
Eis um filme que nos conta a história de um publicitário que usou a sua arte manhosa para conseguir uma extraordinária vitória política. Esta é a superfície da obra. No seu fundo, outros são os seres que encontramos: a ambiguidade de todos os poderes, a violência como expressão da estupidez, o amor a puxar pela coragem, a liberdade como o mais belo triunfo da criatividade.
Espero que este anúncio faça de ti um fatal consumidor deste apetitoso e saudável produto. E tão barato que ele está, quase dado.
:-)
sabes, acho que vender talento que se transforma em dança não é vender a alma ao talento mas antes vender talento carregado de alma. interessante é pensar que só a alma consegue vender quando é aquela que está interdita, interdita por mim e por ela – pela alma da alma – de ser vendável.
(aqui está a prova que contraria a teoria de que o que é bom tem de ser caro)
O único pecado da Publicidade é colocar a inteligência e a criatividade ao serviço da ignorância e da estupidez.
Há um texto magnífico, luminoso, sobre o filme do crítico de cinema João Lopes. A não perder
desta vez não gostei assim tanto do texto do João Lopes, Ernestina – se não tivesse lido este também passava-me ao lado por não fazer referência ao fundo que é, bem visto, o que me interessa no mundo e no cinema que nasce precisamente do mundo.
eu diria precisamente o oposto, anel, já que só a sabedoria e a inteligência conseguem perceber – e por isso aceitar ou rejeitar – a publicidade.
Olinda, vejo que ainda não interiorizaste que, para se aceitar a Publicidade, especialmente a comercial, não é preciso nada da inteligência e só se carece de zero de sabedoria – por isso mesmo é que 99% da Publicidade mercantil é destinada às crianças, ou aos adultos com idade mental de cinco anos.
e vês bem, Anel de Soturno – não fosse o público das crianças o mais difícil de agradar e conquistar.