Ainda trazia no braço direito o baixo-relevo de um vinco do lençol amachucado, quando chegou. «Ola beibi», dizia o matutino sms. O tratamento carinhoso vindo de um perfeito desconhecido é quase tão comovente como o que vem de um desconhecido perfeito. Intrigada com o número, que não consta dos meus contactos, devolvo um «quem é?» e recebo esclarecimento. Alguém a quem chamo amiúde, explica, reclamando por não identificar o seu número. Mais: alguém com quem estive intimamente ainda há pouco e cujo nome sou desafiada a adivinhar. Pouco depois ligou-me – e eu numa reunião, oh sorte. Tremo agora de curiosidade, ansiosa. Quero, e não quero, saber. Mistério da empatia. Alguém me conhece tão bem que recorda experiências minhas, recentes, das quais não conservo memória.
susana
ó beibi, agora fiquei curioso.
Mas quem és tú, que pouco depois da intimidade, nem te recordas de com quem estiveste?
Uma PUTA qualquer?
afixe, também eu.
beibi, não. uma qualquer, não.
Esse beibi parece que está a cumprir um qualquer acordo ortográfico ibérico. Digo-o por causa do “tú”, que só leva acento em castelhano e quando é pronome pessoal.
Natural a curiosidade da Susana, que deve ser normal em quem esquece e finge não ter esquecido. E bem debulhada no texto.
Beibi, lamento, é uma abordagem clássica…
(e você merece algo mais sofisticado…)
Susan, leio que o seu coração se divide entre polissemias e anamneses. O amor, pois, o amor é fodido. Sobretudo quando não é amor.
Beibi, vá chatear e insultar outra e de caminho aproveite para aprender a escrever português e inglês. Mas antes de partir, pode explicar o que é para si intimidade? Decerto perceberemos todos como incorre num qualquer mal entendido maldoso.
A minha memória só me falha para nomes de ruas ou lojas ou flores.
daniel, verdade, verdadinha, já tínhamos chegado à fala. a minha dúvida: seria uma brincadeira de uma amiga, ou um engano. era a segunda. uma mulher, de voz murcha, insistiu que não, que o meu número era de um amigo dela. que, naturalmente (já sou eu a fazer histórias, novamente…) lhe ligou muitas vezes de número oculto, deu um nº errado, e se esqueceu dela depois da dita «intimidade».
leãozinho, saudades suas. :) como vê, não era abordagem, hehehe. por cada coisa que acontece há uma infinidade de possibilidades. válido, também, para o não acontecer. escolhi um momento anterior ao desfecho para contar a história e a possibilidade de uma interpretação sem a minha presença consciente. os meus disparates, já os conhece…
doctor strangelove, se dizes que o amor é fodido porque é difícil, tens toda a razão. de resto o amor é bom, toda a gente sabe disso. quando é que não é amor, a pergunta que te deixo.
da «anamnese» já sabes a realidade. quanto à polissemia, falei em espaço polissémico. amor é amor, mas os amores diferenciam-se. naquele caso, escrevi o texto depois de ter estado a olhar o céu ao lado da excitação fascinada e reverente do meu filho mais velho. agora foi a vez do mais novo, com expressão mais luminosa que os clarões, a mostrar-me o deslumbramento. e eu deslumbro-me com o deslumbramento deles, renova o meu. lembrei-me do ano anterior e voilá.
suspeito, ainda, que no contexto o beibi interpretou «intimidade» como devia…
cláudia, a minha falha nos títulos e autores. lembro-me de livros e filmes com grande nitidez e quando quero indicá-los… chapéu.
Ó Susana, se o(a) desconhecido(a) tiver 70, quaisquer 10 anos é “recente” para ele(a).
http://expresso.clix.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/113297
z, li. Não concordo a 100%. Se os homens se fiarem essencialmente na beleza, estão feitos ao bife. Nem tudo o que brilha é ouro. Quanto ao beijo, bem, bem… já não digo nada. lol. E é bom sermos deliciosamente primitivos.
Mas o artigo só comprova cientificamente que somos indubitavelmente primitivos. E até têm razão, porra.
concordo que é bom sermos primitivos, e o beijo vale
o beijo vale porque é a coisa mais perigosa que esta puta de natureza inventou
ó, ó.
ok, susana, eu porto-me bem. aliás, vou nanar. estou a dever dias à cama.
o que faz o sono…