A música dos gatos entre Elza e Fernanda
O gato de Fernanda faz do seu telhado uma ameia de castelo. Não há invasores capazes de vencer a muralha de indiferença superior deste gato. Perto da febre do trânsito, os passos vagarosos do gato de Fernanda, no fim da tarde, pelas telhas, são música no lugar onde a chaminé projecta sombra. Não foge; afasta-se. Não teme; desvia-se. Não vacila; avança até ao limite do espaço do telhado, feito uma ameia de castelo.
O gato de Fernanda fica sempre por cima. Nenhum conflito o envolve, nenhuma guerra o mobiliza, nenhuma disputa o desgasta. Sobranceiro e distante, afasta-se para o outro lado das telhas, solene e vagaroso. Procura o sorriso de Fernanda, uma espécie de vírgula num discurso de amizade partilhada, algures no esgaço e no tempo da janela onde os seus dois mundos se misturam de modo apropriado, rápido e feliz.
A música dos gatos passa veloz e intensa do telhado para a tela em acrílico. O mesmo é dizer do telhado de Fernanda para a Galeria de Arte de Elza. Ali, na Rua da Misericórdia nº 30, perto do Chiado, o sol incide sobre as linhas do eléctrico 20 (Cais do Sodré – Gomes Freire), percurso há muito desactivado. O brilho do sol faz dos ferros um espelho que devolve às telhas um resto dos compassos de João Sebastião Bach.
A música dos gatos oscila entre os olhares de Elza e de Fernanda. De um lado a paixão do rigor das imagens, dos pormenores quase infinitos que podem caber numa tela de reduzidas dimensões. Do outro a ternura derramada que começou nas prateleiras de álbuns da livraria e passou para o perímetro da casa com a janela aberta para o castelo invisível onde o gato permanece de atalaia. Quando o telhado parece um castelo.
Belo texto, jcf.
Há gatos felizes?
Há gatas felizes !
Jnascimento
É verdade – na tela e no telhado, entre Elza e Fernanda, meu caro. Um abraço
Só agora reparo, o gato de Elza tem bigodes de republicano e ficam-lhe muito bem neste primeiro centenário.
Será que toca a quatro mãos ou piano e pauta são só para a fotografia ?
Que outras prendas poderá ter o gato de Fernanda a vadiar nos telhados, a bater a sorna à sombra da chaminé ?
Jnascimento
Vou ver se a Elza dá essas explicações todas; ela vive em Faro mas vou tentar…