Vinte Linhas 337

Nemésio tem razão, o amigo de Onésimo não

Na crónica de Abril na Revista Ler Onésimo Teotónio de Almeida refere uma conversa com um seu amigo sobre a Margarida de Mau Tempo no Canal que vai à missa em Sexta-Feira Santa, coisa impossível pois (segundo esse amigo) esse dia não tem missa.

Não é bem assim. Tenho a meu favor dois argumentos: a minha memória pessoal e um livro editado em 1850 – Horas da Semana Santa. Nasci em 1951 e lembro-me bem de, com dez anos de idade, ajudar á missa em dia de Sexta-Feira Santa. Era aquilo que em linguagem simples (de sacristão) o meu avô chamava missa seca pois não tinha nem consagração das partículas nem comunhão aos fiéis. Apenas o celebrante tomava uma partícula consagrada no dia anterior. E era naturalmente uma missa muito mais rápida dos que as outras. A minha memória não me deixa mentir.

O livro de 1850 que obviamente estava em vigor quando Nemésio concebeu o romance, ele que nasceu em 1901 e veio para Lisboa em 1919 fazer a tropa, o livro explica textualmente «E omitindo tudo o mais que se pratica nas outras missas prossegue, dizendo: Pai nosso que estás nos céus…» Refere assim na sua página 372 esse «salto» na liturgia pois passa por cima da consagração e a comunhão fica restrita ao celebrante. Conclusão: Nemésio tem razão, o amigo de Onésimo não.

Para mim este episódio vem recordar um dos mais belos salmos que eu tenho memória de ouvir: «Meu Povo, que te fiz Eu ou em que te contristei? Responde-me! Porque te extraí da terra do Egipto, preparaste uma cruz para o teu Salvador.»

Toda a tragédia do Mundo em duas linhas de versos…

6 thoughts on “Vinte Linhas 337”

  1. Toda a tragédia do mundo em duas linhas de versos. Isso podia ser uma cadeia daquelas em que cada pessoa tentava os seus dois. Assim de repente e numa onda pascal um tanto reaccionária vem me à cabeça o Augusto Gil:

    (…)
    Mas as crianças Senhor,
    Porque lhes dais tanta dor?
    (…)

    Foi o que consegui arranjar:)
    Para uma versão mais longa de um tragédia mas essa nacional e sem fim à vista sugiro http://tinyurl.com/cyu7e5, um sistema que precisava de um terramoto.

  2. Sim, mas quem não sabe os salmos, diz que é por morrer uma borboleta aqui que há um tremor de terra acolá. Às tantas estou a inventar o sustituto do salmo, mas a ideia é a mesma.

  3. JCF,

    O texto «Meu Povo, que te fiz eu? Ou em que te contristei? Responde-me! Porque te extraí da terra do Egipto, preparaste uma cruz para o teu Salvador» não é um salmo.

    É um texto cristão, e mais exactamente um dos “Impropérios”, lidos ou cantados nos ofícios de sexta-feira santa.

    Chamar-lhe “salmo” é, em proporção, chamar “cantiga de amigo” a um poema de “Os Guarda-redes Morrem ao Domingo”.

  4. Sim, está errado, foi como se tivessa chamado antífona ou outra palavra errada. Falhou mas foi um bocado da pressa, estava de partida de Lisboa para a provincia profunda. Peço desculpa, errei.

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