Nos mais difíceis momentos, nós, sós
somos o campo na cidade, a surpresa:
– a luz eléctrica, o autoclismo, o jornal à porta
(Era assim quando chegámos, debruçados
na fotografia amarrotada da nossa alma).
Eram eles que há vinte anos partiam
procuravam nomes, ruas, padrinhos vagos,
e, mal pagos numa selva de secretárias,
iam estudar à noite, procurar.
Partimos, saímos mas voltamos sempre
ao pó, quando os carros passavam tão poucos,
quando os moinhos hoje páram tão cansados
quando os rios morrem nos peixes mortos
para lá do horizonte e da ganância.
Eram eles que dormiam mal, sós,
cavaleiros dum selo de correio para a mãe
dez tostões de palavras trémulas
entre os pontos e o relógio de ponto.
Partimos, saímos, o Império a chamar
tínhamos tido um tio em Cabo Verde
um primo na Índia, anos depois,
nós mesmos temos encontro marcado
seja em África ou num qualquer regimento.
Eram eles que tremiam na voz do padre
nos domingos na missa campal ao sol
e a mãe desmaiava nos braços da avó
ou no coração da tia mais sentimental.
Partimos, saímos, mal habituados
aos cinemas no Inverno, legendas breves,
os olhos a piscar, dois Cineclubes, a voz
– entretanto um remorso a crescer
nos mais difíceis momentos
quando somos o campo na cidade.
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in «Leme de Luz» 1993 edição «Sol XXI Poesia»
Era um pesadelo, um cais inteiro a acenar ao nosso medo !
Muito belo o poema e o selo de cavalinho que os areogramas não tinham, eram de borla.
O álcool, o tabaco e o correio eram três coisas fortemente subsidiadas d’ além mar.
Outras eram de borla.
Obrigado pelo louvor (à ordem) grato pela simplificação.
Jnascimento
Um abraço J Nascimento valeu a pena ter um leitor assim disponível. Só por isso está justificado o trabalho de o ter recuperado de um livro «perdido» porque houve uma inundação na distribuidora que era na cave…
bonito poema, e incisivo,
com mãe e avó eu gosto sempre. :-)
O poema: se se encontrou com a minha alma, tem alma.
:)