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Faltava um?…

Esta é a primeira colaboração de DANIEL DE SÁ no Aspirina. Honra-nos tê-lo connosco. Mas ele proibiu-nos de dar informações sobre o seu (notável, diga-se baixinho) percurso. De modo que é assim. Este escritor acaba de nascer e estreia-se aqui. Também tem graça.

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A minha forte vontade de jogar futebol era vencida pelo fraco jeito que eu tinha. Arranjava-se um lugar na equipa, quase sempre à baliza, quando faltava um. Ou para qualquer outra posição que ninguém quisesse ocupar. Só a de avançado-centro e a de defesa-central me estavam proibidas. Até que houve um dia em que os responsáveis pelos trabalhadores do aeroporto se reuniram para despedir pessoal. Decidiram que haveriam de ser dispensados os homens com menos filhos. Meu pai só me tinha a mim e à minha irmã. O seu foi um dos primeiros nomes referidos. Mas o maioral, boa pessoa, lembrou que eu estava a estudar, que meu pai e minha mãe se sacrificavam muito por causa disso, e suspenderam a sentença. Nesse momento entrou alguém a dizer que meu pai tinha morrido.

A minha mãe e a minha irmã voltaram para S. Miguel. E, de repente, dei comigo, labrego da planície de Santana, em casa do Dr. Pessoa, na Vila. Passei lá o resto do ano, como se fosse da família. A nossa casa – tínhamo-la inventado como casa – era toda ao contrário daquela. E, no futebol, aconteceu um pequeno milagre. Porque nenhum dos novos companheiros me conhecia, fui facilmente escolhido. (Ainda hoje é assim. Quem vem de fora é tido como um ás indiscutível.) Eu usava nesse tempo uns sapatos com a biqueira recta. A primeira vez que apontei à baliza, a bola, de borracha, foi direitinha para onde eu olhara. Fiz isso uma segunda vez. E uma terceira. E várias vezes nesse jogo. E nos seguintes. De uma semana para a outra, o candidato ao lugar do “falta um” passou a ser o primeiro nas escolhas. Quando esses sapatos deram o último pontapé, não mais o milagre se repetiu.

Mas, hoje, estou aqui a anunciar que fui seleccionado. Não para o futebol que nunca soube e já não posso, mas para o jogo das palavras. E para uma equipa maravilhosa. Não sei que lugar ocuparei, mas, como todos os maus jogadores, estou disposto a ir para onde ninguém queira.

DANIEL DE SÁ

Diálogo loco entre Don Quijote y Sancho Panza

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Después de haber leído una carta de Fernando Venancio a José Saramago

– Sancho, hace falta que vayamos a Portugal.
– Señor mío, yo creía que jamás habríamos de salir de Castilla…
– ¿Porqué lo piensas? Si acaso piensas…
– Pues ¿cómo vamos allá? Nuestros animales, estas almas de Dios, no podrán llegar tan lejos.
– Eso será tu burro que no lo puede.
– Si mi señor llama burro a mi borriquillo, yo llamaré caballo a su Rocinante.
– Si llamas borriquillo a ese montón de huesos…
– Más grande es el montón donde mi señor pone el agujero donde terminan sus gloriosas espaldas.
– Que nunca jamás un enemigo ha visto, fíjate bien.
– Pero ¿porqué Portugal?
– Porque, en lucha por nuestro glorioso rey Felipe II, allí estuvo nuestro creador.
– ¿El mismo Dios habrá combatido por nosotros?
– ¡No hagas el tonto!
– No hace falta. Pues si mi señor dice que lo soy…
– Hablo de don Miguel de Cervantes Saavedra.
– Y después a lo mejor querrá irse también a Nápoles, a Venecia, a Chipre… lo que sea…
– ¡Ni pensarlo! Yo no quiero más que hacer peregrinación a Aziñaga, la tierra de un gran español que el mundo no conoce todavía.
– ¿Quién es la criatura?
– Un genial escritor, más que don Miguel. Dicen que si se lleva unos veinte años más viviendo en Lanzarote acabará hablando castellano mejor que nuestro rey Felipe III.
– Pues no le hacía falta ir para en medio de los guanches. Dicen que ahora se enseña el castellano en Portugal más que el francés.
– No pienses que será por amor de España. Es para que se cumpla mejor el problema de las estadísticas del gobierno. El castellano como segunda lengua extranjera dará más altas clasificaciones a los chiquitos. Y, además, les hace falta para comprender la Barca del Infierno.
– ¿Qué es eso? ¿Portugal está así de mal?
– ¡Come hierbas, Pancho!
DANIEL DE SÁDaniel de Sá (São Miguel, 1944) é romancista, contista e ensaísta.