Como dizia Unamuno

Falar do que aconteceu em Março de 2011 não é falar do passado. Na dimensão histórica, esse período pertence à contemporaneidade. E na dimensão política, o que aí se passou explica parte fundamental do presente e condiciona parte essencial do futuro. Pela mesma lógica, falar de 2011 implica falar de 2009. Nesse ano, um Governo foi deixado em extrema debilidade para ser boicotado todos os dias e todas as horas por interesse antipatriótico do PSD, CDS, BE, PCP e Presidente da República. De finais de 2009 a 2011, a crise económica mundial profunda começada em 2008 veio a agravar-se de forma drástica e caótica para Portugal com a erupção da crise das dívidas soberanas. Pois nem uma situação de inescapável, prolongada e imprevisível emergência nacional levou as forças políticas a abdicarem dos seus calculismos oportunistas e sectários e a terem um gesto de magnanimidade em ordem a proteger os portugueses.

Passos e Portas queriam governar com o FMI. Fizeram campanha para a capitulação do País aos mercados, chegando ao ponto de recusar o acordo que o Governo socialista tinha obtido na Europa para evitar/adiar o resgate. Aceitaram governar com o Memorando, dito conter as soluções que o próprio PSD proporia mesmo sem Troika a aterrar na Portela. E ainda receberam da população uma inércia, ou indiferença, ou complacência, ou cumplicidade, ou um pouco de cada, que permitiram desrespeitar de forma radical as promessas eleitorais e deturpar de forma insana o acordo inicial com os credores. O povo comeu e calou, nem sequer reagindo aos insultos raivosos com que os trafulhas foram colorindo a sua colossal incompetência. Foi preciso chegar-se à proposta da TSU, em Setembro de 2012, para a comunidade finalmente abandonar a letargia.

A grande lição do modo passivo como os portugueses reagiram ao facto de terem sido tratados como gado para abate é esta: teria sido possível em 2011, e ainda mais algures em 2010, ter celebrado um acordo entre as forças políticas para constituir um Governo dedicado ao combate contra uma Europa que estava disposta a oprimir os países mais atingidos pela pertença à moeda única. As elites portuguesas não o permitiram, preferindo entregar a gestão da maior crise nacional após o 25 de Novembro nas mãos do casal Passos-Relvas. As elites portuguesas, a começar em Alcácer-Quibir, tiveram sempre uma fatal atracção para o suicídio.

14 thoughts on “Como dizia Unamuno”

  1. Mmmmh, isto até nem esta mal visto. Agora que penso nisso, acho que conheço um comentador politico completamente obcecado por Alcacer Quibir. Tenho o nome mesmo na ponta da lingua…

    Mais a sério : sim as elites falharam completamente naquilo que tu dizes. Serias mais convincente se admitisses que a recusa de encontrar um compromisso falhou por parte de ambos os lados. Geralmente, quem defende que foi apenas culpa do outro, apenas confirma que o falhanço teve a ver com a sua propria instransigência…

    Boas

  2. “… a recusa de encontrar um compromisso falhou por parte de ambos os lados.”

    não falhou nada, ganhou o lado mais forte, a santa aliança psd+cds+pcp+be.

  3. “a recusa de encontrar um compromisso falhou”
    Esta frase é tão imbecil que se desdiz a si própria!

  4. ai o meu desejo ardente de meter a pá no forno e que a lenda se torne real, marota: eleve-se a Portugalina, mulher-alma, e que renasça aljubarrota!

  5. Que renasça Aljubarrota?! Como há dias lembrou a Teresa de Sousa, a “direita” de então (aristocracia e clero) estava toda, com honrosas excepções, do lado do invasor espanhol. Valeu-nos o Mestre de Aviz, o Condestável, o João das Regras e o Fernão Lopes, que não hesitaram em “conluiar-se” com o povo e a “arraia miuda” para espantarem o espanhol!

    Como se vê, e de novo com honrosas exceções, a traição dos “direitolas” está inscrita nos seus genes. É por isso que estou muito de acordo contigo, Olinda! “Que renasça Aljubarrota para ver se corremos com estes “vende-pátrias” que com tanta pressa correram para o “pote” mas levam tempo a saciar-se!

  6. O atento tem razão : o que eu queria escrever é “tentativa” e não “recusa”.

    Boas

  7. As elites portuguesas sempre souberam muito bem defender os seus interesses. Mesmo que para isso tivessem de sacrificar o interesse geral. Com a ajuda dos idiotas úteis está bem de ver.

  8. a mim parece-me que o PR deu o seu amen ao governo para continuar a cagar na constituição.Está louco e não podemos fazer nada quanto a isso.A constituição não permite.

    (jafonso, por muito que custe admitir, os idiotas úteis foram todos os que deram a maioria a estes que as “elites” (entre muitas aspas, que as elites deste poder são uns pategos da política e de tudo) lhes impingiram).”O sistema somos nós”.

  9. Pois é, o sempre eterno problema das “elites” ou falta delas, elites. O sempre eterno problema das elites que se bandearam para Espanha à procura da prata das Américas e das rendas que esta gerava; o problema das elites que se lambuzavam nas migalhas da mesa real em Vila Viçosa, zurzindo na piolheira ao mesmo tempo que a empurrava para o Brasil e se preparavam para a ostracizar no seu novo riquismo de torna-viagem; o problema das elites do condicionamento industrial, da mão-de-obra a pataco, que exportou os miseráveis para os arredores de Paris, criadora de maçons e concierges, ao mesmo tempo que usava as remessas destes para equilibrar o orçamento;o problema das elites que condenaram uma geração à guerra, à emigração, ao pior dos exílios que é o de o viverem na sua própria PÁTRIA; o problema das elites que vendo que algo estava a mudar, não se coibiram de aprofundar uma das maiores crises deste país para simplesmente mudar a relação de forças e repor a “ordem”… das elites; o problema das elites que encheram o bojo das naus de miseráveis e esfomeados para não morrerem de fome à portas de Lisboa (Clenardo dixit) e enche agora outros meios de transporte, naturalmente mais modernos e rápidos, de mestres e doutores, novos e velhos, e os exporta novamente a pataco, mas que ao contrário dos outros, já não voltam. O problema dos serviçais das elites, dos “gauleiters” do nosso quotidiano que alçámos ao poder através do exercício que nos proporciona o sistema democrático e com a ajuda dos idiotas úteis. Sim o sistema somos nós, mais os monstros que criámos, as universidades que os concebem, mas mesmo prefiro conviver com eles em democracia que os aturar em ditadura.

  10. jafonso

    Subscrevo as tuas palavras. Por isso sou a favor de uma sociedade liberal e contra este Estado pesado, responsável por 50% do PIB, onde as elites se entretêm a repartir o bolo do orçamento, a começar pelas elites politicas e económicas, cabendo, no fim, ao povo pagar a fatura.

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