Na passada segunda-feira, à tardinha — uma hora e tal depois de Marcelo ter descansado os criminosos do Ministério Público afiançando que Parlamento, Governo e Presidência não iriam mexer uma palha para defender o Estado de direito democrático, a legalidade e a vítima Ivo Rosa — saiu um comunicado da Procuradoria-Geral da República onde se confirmava o que já era público: o agora Desembargador tinha sido perseguido e devassado durante três anos.
A imprensa destacou a seguinte passagem: “não foram efetuadas quaisquer interceções telefónicas“. Fixe, né? Sugere que houve cuidado em proteger a privacidade do alvo, e que tudo não terá passado de um acto contemplativo bué à distância, sem qualquer importância. Acontece que não se discrimina a seguir o que realmente foi feito a Ivo Rosa. Não sabemos se para os procuradores e agentes da Judiciária as mensagens por SMS e WhatsApp entram no âmbito conceptual de uma comunicação telefónica. Seguramente, o correio-electrónico não. O que se sabe é outra coisa, farfalhuda, que reza assim: “A prova, uma vez recolhida, careceu de análise.“
Essa frase é uma tautologia. Qual a prova (a prova!), uma vez recolhida num inquérito judicial, que não carece de análise? Inclusive para batráquios e anémonas, nenhuma. Pois se é a prova, estúpido. Porém, abre-se uma perspectiva interessante, a de que a frase esteja a implicar que haja inquéritos no Ministério Público onde a prova não careça de análise. Por isto ou por aquilo. Alguém lá dentro decide “Eis a prova”, e depois não se procede à sua análise, segue direitinha para a acusação. Com sorte chega ao tribunal com a virgindade intacta. Admitindo esta metodologia, a frase teria como objectivo mostrar uma especial deferência para com Ivo Rosa, como quem diz “Vejam, até analisámos as provas por ser para ele, um juiz”. Porém, aplicando os celebérrimos “padrões do homem médio” com que os juízes despacham a torto e a direito, uma outra hipótese aparece como muito mais provável: o comunicado contém essa frase para justificar os três anos da devassa.
Indo por aqui, começa a parecer lógica, inevitável, a demora. Repare-se: a denúncia anónima dizia que Ivo Rosa tinha comprado um Audi TT com dinheiro fresco, em notas, vindo do Sócrates. Se fosse outra marca, especialmente outro modelo, teria sido muito rápido averiguar a credibilidade da suspeita. Podiam até usar a matrícula para ficar a saber tudo sobre o carro em minutos, caso não quisessem incomodar o actual proprietário com a pergunta. Só que, azar do caralho, tratava-se de um Audi, e logo de um TT, modelo mundialmente famoso por se esquivar a revelar a idade e as relações que já teve com pessoas que lhe põem as mãos no volante (e noutros sítios…). Assim, os coitados dos procuradores tiveram de recorrer a meios alternativos, sofisticados, criativos. Por exemplo, geolocalização do alvo. Começando a mapear as deslocações do juiz, acrescentando uns agentes à paisana para tirarem umas fotos e tal, a esperança era a de que pudesse aparecer uma pista acerca da data em que o TT primeiro acolheu o meritíssimo traseiro na berlinda. Outros procuradores, já impacientes com a dificuldade na obtenção da prova, resolveram ir a Fátima de joelhos, mas com um desvio pelo Pedro dos Leitões na Mealhada. ‘Tá claro que isto tudo atrasou o inquérito, e até podemos ponderar se três anos não terá sido, afinal, muito pouco tempo para a investigação dada a magnitude do desafio: apanhar o Documento Único Automóvel de um Audi TT.
Conclusão. Temos de agradecer ao Ministério Público por ter vindo a terreiro, com exemplar transparência e incrível coragem, garantir que não se fizeram intercepções telefónicas ao maldito juiz. Creio ser justo reconhecer, a partir desse gesto magnânimo do actual procurador-geral da República, que o Ministério Público também nos está a transmitir que Ivo Rosa (ainda) não foi torturado. Provavelmente, pela mesma razão que levou aos três anos da exaustiva investigação: os procuradores andaram assoberbados de trabalho na análise da prova, não tinham tempo nem cabeça para pensar em mais nada.
!ai! que riso TT, um riso sobre este texto sobre o TT tesão triste do MP nisto que é aTT tortura tranquila que aceitável e consentidamente pratica. que nojo. inhac. porcos. badalhocos. asquerosos. trambiqueiros.
mas agora, com o riso, apetece-me uma sandes de leitão do Zé Pacheco.