Guerra ao Nobel da Paz II

A cada protesto contra a escolha de Obama para Nobel da Paz, mais acertada realmente fica a decisão. Desconfio que os pacíficos noruegueses não esperavam tamanho sucesso mediático. Talvez estejam como o próprio laureado, também surpresos e humildes. De facto, não há memória recente de se ter dado tanta importância ao prémio como na presente edição, pese o longuíssimo historial de polémicas que esta categoria regista. Eis a força da marca Obama a suscitar crises de urticária. O resultado do bruaá, contudo, é desconcertante: estamos todos a falar da paz como se ela fosse um assunto importante para as nossas vidas, mas não é.

Que é isso, a paz nobelizada em 2009? Os cínicos, eternamente distraídos e sempiternamente distractores, são alérgicos às vanguardas. Tudo o que é novo ameaça a sua inesgotável capacidade de repetição. Aliás, a tarefa quotidiana de um cínico consiste na destruição das novidades. E que poderia ser mais inovador do que dar um Nobel a quem não tem obra? Acaso Obama acabou com alguma guerra, sequer uma discussão doméstica, e a CNN esqueceu-se de nos informar? Este critério, porém, se aplicado desde 1901, teria poupado uma colossal fortuna gasta com lobos em pele de cordeiro ou com palhaços tristes. Só que os cínicos não querem perder tempo a pensar, há muita falácia para despachar. E a principal é essa de nada ter feito. Mas nada de nadinha de nada, mesmo nada?

Obama foi eleito Presidente da democracia militarmente mais poderosa no Mundo, tendo inscrito a ambição de fazer a paz à cabeça das suas promessas. Chocando os belicistas alucinados, e apesar de estar em campanha eleitoral, declarou estar disposto a encontrar-se com qualquer inimigo que queira a paz, seja ele quem for. E ainda garantiu ter sido leitor de Tucídides, revelando a ambição de manter a América como uma superpotência militar sem rival. É que a paz, uma paz que seja pacificadora, não se define como ausência de guerra. Essa será uma definição negativa, pacifista, perigosa. Pelo contrário, a paz, para nações livres, é um implacável combate contra as tiranias. Assim, dizer que Obama ainda nada fez equivale a dizer que o acontecimento do ano de 2008 não aconteceu. Será o mesmo que apagar a esperança com que milhares de milhões acompanharam as eleições americanas, dedicando-lhes mais atenção e afecto do que às eleições dos seus países.

No que talvez os cínicos tenham razão é nisso de, à luz do que mais importa, o Nobel da Paz dever passar a chamar-se Nobel da Esperança.

10 thoughts on “Guerra ao Nobel da Paz II”

  1. Caro postador, o Nobel ainda se chama da paz, e o substrato que o sustenta ainda é a obra feita.
    Querer mudar o nome do prémio e o substrato da nórdica instituição, parece-me algo exagerado para que se justifique o injustificável.

    É, devo ser um reaccionário.

  2. É isso aÍ, Valupi, Esperança de Paz. Quem pensa numa «paz feita», acaba por não mexer um dedo por paz nenhuma, porque procura algo que não existe, nem agora, nem num horizonte próximo. A paz talvez seja a derradeira vitória do homem sobre os seus egoismos. Até lá, continuaremos a ser «homem lobo do homem» ou «o inferno são os outros». Desiluda-se quem pensa que será «um homem», Obama, Dalai Lama ou Jesus, a fazer o que compete a todos nós. Que os profetas da paz sejam laureados, acho muito bem. Como dizes, Valupi, Obama anunciou na campanha eleitoral o objectivo-sonho da paz. E, como temos visto, está a fazer a sua parte. Até onde irá, não sabemos. Vamos com ele e deixemos os «pachecos pereiras» a resmungar o seu despeito mesquinho. Fedorento.

  3. seja como fôr, pelo menos enquanto não estragar, deixa aproveitar. Sinto-me muito sortudo em ter chegado a estes tempos em que se premeia o futuro e aposto que o Bo está farto de dar ao rabo. Este mundo em que memovo quando ando pelas ruas aqui do meu sítio e arredores está delicioso, com geente de todas as cores e misturados, bonit@s com sorrisos e putos, bicicletas, skates, sei lá. E Sol. Obrigado, Pá

  4. Concordo co manifico post de Valupi, não se pode dizer melhor e tãão craro, é um cnto a esperança, e iste premio talvez seja um berro a não sentirmos no mundo a presão BUSH.
    z. Gosto do ” seja como fôr, pelo menos enquanto não estragar, deixa aproveitar”.
    so o idioma português tem essa forma tan breve e cheia de expressão.
    E certo que temos a sorte destes tempos em que há tratar sejam sempre melhores, haja Sol.

  5. haja Sol, reis,

    Só vim cá dizer Bo e me vou esticar patas e aterrar em cima de um tagliatelli não sei quantos, não sei onde, ou melhor não posso dizer porque quero ir incógnito,

    aperto tu.

  6. Não vale a pena estarmos com rodeios. Quando gostamos, admiramos-lhe tudo. Quando não gostamos, nem que reluza a ouro.
    Isso, vamos comemorar o futuro. Seja qual seja. Todos os pretextos são bons para celebrar. Com sal. Ao sol. Para sul.

  7. se for nobel da esperança acho que devia ser para ti , V. estás tão esperançoso que até concordas com o lipe de truz quando o que ele diz é que é injustificável terem dado o nobel ao baminha e que é batota fazer trocadilhos para o justificar?

  8. Isso mesmo, o prémio Nobel da paz tem sempre essa função – esperança! Aliás a origem dos prémios Nobel e os considerandos específicos para a atribuição deste Nobel assim o confirmam.

  9. Eu acho que Michael Moore é quem vai directo ao assunto, com a frase final do parágrafo final do seu artigo sobre este Nobel: “Thank you, Barack Obama, for giving us the opportunity to redeem ourselves. Now for the tasks ahead. We need you to do all that you promised to do. We need it. The world needs it. My prediction for the future? You become the first *two-time* winner of the Nobel Peace Prize! Yeah!”.
    In: http://www.alternet.org/story/143192/michael_moore_debates_himself_over_obama_winning_the_nobel_peace_prize_

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