Chegou aos 62 anos e morreu.
Hesitei muito sobre se escreveria acerca deste homem brilhante, controverso, com o qual se concorda e discorda, mas cuja pena nunca gerou indiferença. Não serve de nada dizer mais do que isto, sei o que guardo do que ouvi, do que li, do que me disse aqui mesmo em Portugal. Sei, sobretudo, que há gente mais habilitada do que eu para escrever sobre este ser humano, como o escritor Salman Rushdie. O escritor condenado, escondido várias vezes em casa de Hitchens, testemunhou uma dificuldade nos serões intelectuais em que participou com outros nomes de relevo e, claro, com Hitchens: o dono do mais resistente fígado do mundo estava sempre dez passos à frente, porque pressupunha que os outros conheciam os seus pontos de partida. Não conheciam, não sabiam, não tinham lido tanto, disse Salman Rushdie numa garagalhada.
Não me interessa revisitar a lista de adjectivos atribuídos a Hitchens. Interessa-me apenas um que tenho a liberdade de constatar lendo a sua vasta obra: Hitchens era excepcional.
Há tempos, com ironia e num sorriso, disse que o chato de se estar a morrer é saber-se que a “festa” continua sem nós, mas logo acrescentou que mais aterrador é a ideia de uma “festa” eterna, com ou sem o nosso consentimento, para sempre, subjugados a um ser superior e privados da nossa razão crítica.
Hitchens morreu e com ele um pouco de todos os que, como eu, não lhe perdíamos o rasto. Mas conseguiu, numa obra que fica para além dele e para além de nós, isto: a verdadeira e mais bela eternidade.
uma referência de direita que escrevia para fascinados
“mais aterrador é a ideia de uma “festa” eterna, com ou sem o nosso consentimento, para sempre, subjugados a um ser superior e privados da nossa razão crítica.”
realmente deve ser terrível acreditar num ser assim. e o pior é que são as religiões que criam estes crentes.
hummm….cultivava um pouco o culto da personalidade (dele)…a do herói que prefere o sofrimento eterno à beatitude…Tá bem, tá no seu direito. Mas o eterno não é divino?
… Hitchens não sabe se ganhou a eternidade que combateu mas merece ser revisitado…
gostei que colocasse em causa, no seu último artigo, o aforismo de que o que não nos mata faz-nos mais forte.
“mais aterrador é a ideia de uma “festa” eterna, com ou sem o nosso consentimento, para sempre, subjugados a um ser superior e privados da nossa razão crítica.”
Aterrador, de facto. Não sei como nos é possível viver com esta medonha verdade!…
Leonor Costa pinto
Pavorosa ilusão de eternidade,
Terror dos vivos, cárcere dos mortos;
D’almas vãs sonho vão, chamado inferno;
Sistema de política opressora,
Freio que a mão dos déspotas, dos bonzos
Forjou para a boçal credulidade;
Dogma funesto, que o remorso arraigas
Nos ternos corações, e a paz lhe arrancas:
Dogma funesto, detestável crença
Que envenena delícias inocentes!
mais um neoconeiro que se vai sem escrever o manual, ficam só as ameaças, à semelhança dos testículos do salmão, companheiro de quarto.
Requiem aeternam…
O maior “castigo” que provavelmente terá é ir direto para o Céu. Que no fundo, se muito bem calhar, até mereceu…