«Coincidências Voluntárias» de Rocha de Sousa
Rocha de Sousa (n. 1938) retoma alguns dos seus temas de sempre. Comecemos pela origem do título: «Durante as minhas incursões em diferentes campos operativos de carácter artístico, assumi na primeira exposição da AICA (Secção Portuguesa) a condição paralela de pintor e de crítico de arte, pela base demonstrativa de um quadro meu baptizado com o título Coincidências Voluntárias». Depois a possível definição do que é um quadro: «Todos os quadros são projectos falhados no mais nobre sentido da expressão – são uma soma de destruições, segundo a palavra cintilante de Picasso, e eu entendo-os em parte assim, sentimentos, recomeços, dilacerações, uma luta contra a indiferença».
Pintor e crítico de arte, eclético e sonhador, este autor foi também jornalista: «alcancei por mero acaso a área do poder transitando do Jornal do Fundão para um jornal da tarde, o Diário de Lisboa. Foi um bom tempo de aprendizagem, sob a vista afiada do Vítor Silva Tavares e do escritor José Cardos Pires». As mudanças no mundo da Arte do século XX dão origem a um comentário: «Nunca a arte sofreu tão profundas e consequentes mudanças. Claro que não é difícil apontar causas de ordem tecnológica e técnica, o advento da fotografia, o cinema, imperativos sociológicos e culturais». A memória da guerra está também presente: «estivera nessa guerras sem nome e sem préstimo, pelas picadas de Angola, logo no início do pesadelo em 61, ouvindo os estalos das balas cortando o ar por cima das cabeças e vendo no pó, na orla dos ataques, o medo dos meus colegas traduzido pela linguagem das rajadas de disparos em resposta, cada pontaria ao caso para dentro da floresta, cabrões a romper as gargantas, insultos inúteis de quem nos mobilizava durante vinte minutos contra a margem terrosa do capim». Voltando ao princípio, um desafio: «A obra de arte é um espaço do desejo, da comunicação e da revolta» – disse o autor num papel para os alunos nas Belas Artes.
(Editora: Edita-me, Capa: Miguel Ministro, Revisão: Patrícia Figueiredo)
“Todos os quadros são projectos falhados” disse o Rocha de Sousa. E outras tristezas, melancolias, azares ele refere.
Pois, jcfrancisco eu acho precisamente o contrário. Para tristezas já nos basta o governo que temos.
As minhas pinturas são executadas com alegria tal como a minha poesia.
A propósito de pintores e poetas aqui vai mais uma:
O CHICO PINTOR
O Chico que é pintor
diz que ele é o maior,
qu’ isso não é garganta,
e se alguém o chateia,
se não meter tareia
o Chico até pinta a manta!
Num dia de muita sorte
esteve perto da morte,
quando pintava um hotel.
Ele caiu das alturas,
quando andava nas pinturas,
mas agarrou-se ao pincel!
S’ alguém lhe tira valor
o Chico muda de cor,
fica com bastante mágoa.
Ele pinta em todo o lado
seja parede ou telhado,
pinta até debaixo d’ água!
Disse-lhe outro pintor,
que pintava com amor
e uma santa pintou.
Quando acabou a função,
era tal a perfeição
qu’a santa até chorou!
Ora isso não é nada
disse o Chico ao camarada,
muito melhor ele pintava.
Também pintou uma santa,
a perfeição era tanta
qu’a santa até falava!
Conta o Chico com paixão,
num dia de procissão,
ia ele mais o Vilaças.
Ela viu o mafarrico,
olhou e disse: – Oh! Chico,
vai pintar par’o caraças!!!
Isto sim! É poesia e da boa!
Falhaste numa coisa – faltou-te escrever «no mais nobre sentido da expressão». Perdeste o essencial. Tem cuidado porque se fosse numa coisa em que a tua vida estivesse dependente estavas lixado…
cada vez mais estou convencida que só com a exclusão da vaidade temos artista – e obra de arte. uma coincidência voluntária – a minha opinião com o que percepciono no texto.
Obrigado Olinda – não por acaso esta editora é do Porto. Um abraço JCF
agradeço e retribuo com vontade – coisa involuntária, Zézinho.:-)