Palavras em jogo 03

Charneca, Lezíria e Bairro

Vivi em Vila Franca de Xira de 1961 a 1966 e fui colega de turma do Álvaro Pato mas só há muito pouco tempo soube da existência do livro de contos do seu tio Carlos Pato que a PIDE matou com 29 anos de idade em 26 de Junho de 1950.

O livro «Alguns contos» foi editado por Alves Redol em 1951 e contém apenas três contos. O primeiro («Ao receber a jorna») tem como heroína Maria Alexandrina, trabalhadora rural que leva duas filhas para o campo porque não há creches nem infantários. Depois da semana de trabalho chega o dia de receber a jorna: «Uma cantou para que o tempo passasse; as outras ouviram caladas».

O segundo conto («Valados») mostra que o campo não é só paisagem («Tejo bom quando dá pão, mau quando o leva e não o dá») mas também lugar de luta. A falta de assistência médica é o drama em gente desta história.

O terceiro conto («Graxas») fala de um grupo de miúdos que brinca no Tejo. Nesse grupo de engraxadores nem todos sonham com o campo. Divididos entre trabalho e desporto, entre a Estação da CP e a aberta do Tejo onde nadam, eles são um elo na corrida de estafetas por um mundo melhor. Também perguntam entre si «Quando virá o dia que a gente muda de vida?» para logo um deles responder: «Não vem longe, Chico!».

Carlos Pato poderia ter sido um grande escritor. Há na tessitura dos seus contos a ampla respiração de um talento criador e um domínio perfeito da nossa língua. Mas a PIDE não deixou. Tal como não o deixou conhecer os filhos: a Clara tinha 8 meses quando o pai foi preso, o João Carlos nasceu em 2-12-1949 ou seja 5 meses depois da prisão do pai.

4 thoughts on “Palavras em jogo 03”

  1. A pouco e pouco, com a ajuda de poetas como tu, que nunca fizeste porra nenhuma contra o “fascismo”, a lista dos “assassinatos” vai aumentando. Aproveita estares com a mão na massa e pede aos vários blogues “comunistas” que publicaram a lista abaixo e pede-lhes que a completem, pondo lá o nome de Carlos Pato. Vais ver como te agradecem. E até sabes o dia: 26 de Junho de 1950. Melhor que isto só a data exacta da fundação do Sport Lisboa e Benfica.

    …..”1948
    António Lopes de Almeida, operário da Marinha Grande, é morto durante a tortura; Artur de Oliveira morre no Tarrafal; Joaquim Marreiros, marinheiro da Armada, morre no Tarrafal após doze anos de deportação; António Guerra, operário da Marinha Grande, preso desde 18 de Janeiro de 1934, morre quase cego e após doença prolongada;

    1950
    Militão Bessa Ribeiro, operário e dirigente do PCP, morre na Penitenciária de Lisboa, durante uma greve de fome e após nove meses de incomunicabilidade; José Moreira, operário, assassinado na tortura na sede da PIDE, dois dias após a prisão, o corpo é lançado por uma janela do quarto andar para simular suicídio; Venceslau Ferreira morre em Lisboa após tortura; Alfredo Dias Lima, assalariado rural, é assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Alpiarça;

    1951
    Gervásio da Costa, operário de Fafe, morre vítima de maus tratos na prisão;

    1954
    Catarina Eufémia, assalariada rural, assassinada a tiro em Baleizão, durante uma greve, grávida e com uma filha nos braços;

    1957
    Joaquim Lemos Oliveira, barbeiro de Fafe, morre na sede da PIDE no Porto após quinze dias de tortura; Manuel da Silva Júnior, de Viana do Castelo, é morto durante a tortura na sede da PIDE no Porto, sendo o corpo, irreconhecível, enterrado às escondidas num cemitério do Porto; José Centeio, assalariado rural de Alpiarça, é assassinado pela PIDE” …

  2. é uma vergonha, Estaca, vir para aqui querer branquear a PIDE.

    como não deve ser nenhum ignorante, sabe que a lista é bem mais longa…

    não sei se felizmente ou infelizmente, o que é facto, é que a maior parte dos portugueses passaram ao lado da realidade do salazarismo e marcelismo. muitos fingiam que não viam o que se passava, mesmo que fosse ao seu lado…

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