O presidente do conselho vai acabar com a corrupção

Muito me ri a ver o debate entre o Ventura e Mendes. Até que deixei de rir.

Ventura é asqueroso, e ele aposta nisso. Ainda não apareceu quem saiba lidar com a porqueira em que transforma qualquer debate. Por isso continua a repetir a técnica feirante que cativa os grunhos e os néscios. Só que ele não é pior do que Marques Mendes, seja qual for o critério de análise. Qualquer.

Marques Mendes é uma personalidade política mais insidiosa, mais perigosa, do que Ventura. O debate entre os dois exibiu essa diferença de forma inequívoca. E foi quando tal ficou patente que deixei de rir.

Há um momento em que Ventura diz isto: “Está lá Ferro Rodrigues! [no Manifesto dos 50] Sabe bem, sabe bem, como eu também sei, o papel que Ferro Rodrigues teve nos últimos anos — como aliás Paulo Pedroso e outros.” Qual foi o papel de Ferro Rodrigues, Paulo Pedroso e “outros” nos últimos anos? Só há uma hermenêutica possível destas palavras: o chegano está a insinuar que Ferro Rodrigues, Paulo Pedroso e “outros” cometeram crimes de “pedofilia” e obstrução ou manipulação da justiça. Porque é isso que anda a repetir impunemente há anos. Ora, o super-Mendes ouviu a abjecta calúnia e calou. Portanto, consentiu-a, confirmou que também sabia. Se “sabia” tanto como Ventura é indiferente, o seu silêncio estabeleceu pragmaticamente que sabia o “essencial” da referência feita com nomes explícitos. O mais certo é ter tido conversas com Ventura onde alinhou nessa ignomínia, e o calhordas estava enfaticamente a lembrá-lo disso.

Muito bem. Imaginemos agora uma situação qualquer em que Marques Mendes se cruze socialmente com Ferro Rodrigues e/ou Paulo Pedroso. De certeza absoluta que os trataria com os códigos da proximidade pessoal que tiver com cada qual, com os salamaleques da praxe. Provavelmente, poderá até ter intimidade com Ferro Rodrigues, dado o trajecto político paralelo de tantas décadas. Porém, frente a Ventura não foi capaz de defender o seu bom nome, a sua honra. E isto, sendo grave, não é tão grave como a consequência última do seu silêncio: estando no estatuto de candidato presidencial, num debate em que o rival na campanha viola a decência e o Estado de direito democrático, Marques Mendes não foi capaz de defender a Constituição. Pelo contrário, deixou-se pintar como cúmplice do ataque à mesma. Porque a Constituição existe, entre outras coisas, para defender o bom nome e a honra de todos nós de pulhas como o Ventura.

Estranho? Nem um nanómetro. Minutos depois, picado pela cassete da corrupção virada contra si, foi buscar Joana Marques Vidal para mostrar que era ele o rei da pulharia. E largou esta maravilha: “Joana Marques Vidal teve uma coragem impressionante no combate à corrupção! Designadamente no caso José Sócrates. Poucas pessoas, poucos procuradores-gerais da República, teriam aquela atitude. Eu estou do lado das pessoas que combatem mesmo a corrupção.” Estamos perante um tripla no totobola da canalhice: 1. O cidadão actualmente inocente, de seu nome José Sócrates, já transitou em julgado como condenado por corrupção no charco moral que preenche a consciência deste também conselheiro de Estado. X. Um número indeterminado de ex-procuradores-gerais da República ficam carimbados como cobardes (ou será que é como íntegros?) na comparação com a falecida Vidal. 2. Combater “mesmo” a corrupção para esta luminária, pelos vistos, consiste em montar um processo judicial contra um adversário político, pejado de crimes originados no Ministério Público, cuja acusação foi declarada fantasiosa por um juiz que esteve quase 4 anos a analisar toda a prova e todos os testemunhos recolhidos, num processo que já leva 12 anos sem que ninguém tenha conseguido identificar o acto de corrupção que teria valido 10, 20 ou 30 milhões de euros.

Marques Mendes declarou que a “Justiça estava doente” e anunciou que “era preciso acabar com os diagnósticos e ter iniciativa, ter acção, e ter soluções“. Donde, assumiu solenemente, quando for Presidente vai fazer um Conselho de Estado sobre a corrupção — aquele tipo de corrupção que a Joana Marques Vidal ensinou a apanhar e tratar. Os conselhos de Estado servem para alguma coisa a não ser despachar diagnósticos sujeitos a dever de sigilo por 30 anos? Não, mas é esta a iniciativa que o Mendes considera urgente. Porquê? Porque ele e o amigo Marcelo transformaram os Conselhos de Estado em palcos de intriga e chicana. Se lá chegar, talvez alguém da imprensa lhe possa perguntar se Portugal está finalmente em condições de apanhar a “rede que durante vinte anos, ou mais, tentou controlar o Partido Socialista, a banca, a comunicação social, as grandes empresas (tipo a antiga PT) e a Justiça“.

8 thoughts on “O presidente do conselho vai acabar com a corrupção”

  1. O retonho e o chegano.

    Dois puro sangue pulhitanos.

    — O problema da verdade é entender por que as mentiras têm tanto sucesso. Henri Lefebvre

  2. Marques Mendes chegou a firmar que o 25 de novembro salvou uma ditadura de esquerda ou extrema esquerda, ou de CENTRO ESQUERDA. Em 1975 a direita portava-se como a seita Bolsonarista no Brasil: eram na maioria uns cobardes, Mário Soares enfrentou com coragem a deriva revolucionária. As referencias a Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso deveriam constituir crime de injúria e difamação, ou então a liberdade que vá bardamerda!

  3. Sabes o que eu às vezes me ponho a pensar?7
    Assumamos que o Ventura sabe tão bem como qualquer pessoa informada que o caso do Paulo Pedroso/ Ferro Rodrigues foi pura efabulação do MP.
    Convenhamos que ser perseguido pela justiça do nosso país por um crime grave que não cometemos é de facto dos pesos morais mais tenebrosos que nos pode acometer. Ora isto é verdade para o Ferro Rodrigues, para mim, para ti, para qualquer um, e também provavelmente para o Ventura.
    Ora contudo, o Ventura continua a fazer a conversa tascosa.

    Isto a mim sugere-me que ele está bastante seguro que efabulações do MP não o podem atingir a ele. Ora isso a mim preocupa-me até muitissimo mais que o Ventura. Porque deixou de ser uma organização do Estado, passou a ser a organização política. E o que se faz com organizações políticas das quais discordamos? Acho que a resposta é simples: combate-se.

  4. “e: 1. O cidadão actualmente inocente, ” na esfera da Justiça , que não é a nossa , na nossa é claramente culpado. e o ventura e o mini mendes não são trabalhadores da Justiça , a sua área de dolce fare niente é outra.

  5. Eu percebo e conheço pessoas do PS que se assanham e indignam descontroladamente com a questão Paulo Pedroso. Algumas ficam rapidamente à beira da invocação de processos por difamação ou autoflagelações por Pedroso, que alguns fanáticos religiosos invejariam. É um direito que têm.
    Eu não sei se Paulo Pedroso é ou não inocente, nem irei contra as convicções dos que o defendem, se necessário, a ferro e espada. Mas não me peçam para ignorar a convicção com que se manifestou Catalina Pestana e o facto de até à sua morte (em Dezembro de 2018) não ter mudado de posição.
    Nem me peçam para ignorar que depois de tudo o que disse, e manteve, não foi objeto de quaisquer processos por parte de Paulo Pedroso.

    Quanto a socrates, valupi, eu já não digo nada, só o seu terapeuta (ou talvez um exorcista) o poderá ajudar a ultrapassar.

  6. “… um aluno que me tinha falado em Paulo Pedroso telefonou-me e disse-me que tinha sido o dia mais feliz da sua vida. Aquilo incomodou-me muito, mas perguntei-lhe porquê. “Porque ninguém acreditava em mim”, respondeu. Depois apareceu no meu gabinete e contou-me tudo, nomeadamente descreveu-me sinais do dr. Paulo Pedroso que eu ia sempre tentando desmontar: “Mas isso podias ter visto numa piscina!”. E ele contrapunha: “E os sinais que estão por baixo dos calções, como é?”. E eu fui murchando, como um balão que vai esvaziando. Nesse dia, falei com amigos comuns, que estavam desfeitos, como é evidente. Mas, depois de falar com o rapaz, eu já não era a mesma pessoa.”

    “Se querem que vos diga, custou-me mais ver pessoas que respeitei a minha vida toda – como o dr. Manuel Alegre ou o dr. Alberto Martins – a solidarizarem-se com aquela encenação. Alegre chegou a dizer: “Hoje é um segundo 25 de Abril”. Isso desfez-me por dentro. Manuel Alegre nunca foi acusado de ser abusador; foi exilado político, preso, lutou, foi um ícone da minha juventude, viveu o 25 de Abril com a força com que também o vivi, é um homem inteligente. Assisti no meu gabinete, gelada, à vergonha da entrada apoteótica do dr. Pedroso na Assembleia! Tive de segurar as vítimas: uns choravam, outros propunham-se quase a esfaqueá-lo… E lembro-me que nessa altura, quando saiu da prisão, o dr. Paulo Pedroso disse uma coisa de que ainda estou à espera, sentada: que era objetivo dele descobrir quem foram os abusadores daqueles miúdos. Porque eles tinham sido abusados, não por ele, mas por outros, e que ia investir na procura desses abusadores. Eu e as vítimas estamos à espera.”

    “Um terramoto de grau sete. Quando se fizer a história deste processo, todos verão que, se houvesse legislação que permitisse investigar tudo o que foi dito a mim, à Polícia Judiciária e ao Ministério Público, o terramoto teria consequências devastadoras.”
    Tenciona divulgar esses nomes?
    Quando isso acontecer, eu já cá não estarei. Vou deixá-los a quem há de ficar vivo, para só daqui a 25 anos os publicar, como a lei diz.”

    CATALINA PESTANA, Outubro de 2007.

    Quando passam os 25 anos que a lei diz?

  7. “Catalina Pestana, ex-provedora da Casa Pia, disse… … que continua a acreditar que Paulo Pedroso também esteve envolvido no caso de pedofilia que envolveu a instituição.
    «Foi sempre minha convicção que o Dr. Paulo Pedroso não era inocente e continuo a ter essa convicção. Os miúdos que o acusaram descreveram-me, descreveram à polícia e descreveram ao Ministério Público, detalhadamente, as especificidades do seu corpo», disse.
    A antiga provedora da Casa Pia contou ainda que falou com o irmão de Paulo Pedroso, o advogado João Pedroso, «de quem era amiga» e lhe contou o que foi relatado pelos jovens. «E ele disse-me: “mas não é verdade, o meu irmão não tem nenhum sinal”. E eu respondi-lhe: “então óptimo. Amanhã o senhor pede uma junta médica para observar o seu irmão e foram os miúdos que se enganaram. Porque eles descreveram tão detalhadamente que só pode ser de outra pessoa”», contou.
    Catalina Pestana acrescentou que chegou a escrever uma carta para o Ministério Público, a relatar a conversa que manteve com João Pedroso, que ainda guarda a cópia dessa carta, mas que a junta médica nunca foi pedida.”

    CATALINA PESTANA, 03 de Dezembro de 2010.

  8. E persiste a narrativa xuxa da “efabulação do MP”, como lhe chama o MM, na Casa Pia e da perseguição ao pobre PS e aos seus pobres líderes, a começar pelo mártir 44.

    Ó xuxas, em maiúsculas a ver se entendem: TODO O PAÍS VOS SABE CORRUPTOS E PEDÓFILOS. Não é só o chunga Ventura e o anão Mendes, é toda a gente – excepto vocês e os vossos compinchas xuxas. Não, não se fala disto só em tascas. É em todo o lado. Já o ouvi a professores primários e universitários, médicos, enfermeiros, contabilistas, CEOs, estudantes, escritores…

    Mesmo supondo que acreditam sinceramente na inocência do Peidoso, do Ferro, do Farfalha, do Vara, do 44, etc., e nessa cabala global contra o PS, não vos incomoda que todo o país acredite que são culpados? Que arraste há anos essa certeza, acumulando rancor pelos corruptos que mandam nisto e que se safam de crimes horríveis? De onde acham que vem o sucesso do Chega?

    Quando o chunga menciona o Peidoso ou o 44 como símbolos, cada um à sua maneira, da podridão e da impunidade, acham que terem escapado à condenação em tribunal – tantas vezes por prescrição, pelas leis manhosas que cozinham em causa própria, ou no caso do Peidoso por nem irem a julgamento – vos livra do opróbrio e da condenação social? Só mesmo na bolha onde vivem.

    Continuem dentro dessa bolha, agarrados às formalidades viciadas e ao ‘Estado de direito’ putrefacto que gostam de cantar quando vos dá jeito, e depois admirem-se quando a carneirada que votou PS enquanto o via como ‘mal menor’ votar em peso no chunga, ou em qualquer um que denuncie finalmente e com todas as letras o que toda a gente pensa e toda a gente sabe há 50 anos.

    É essa, aliás, a maior diferença dele para o anão Mendes: este pertence ao Centrão Podre que se encobre mutuamente há 50 anos; o chunga já não e por isso pode malhar-vos à vontade. A real crítica do volupi ao Mendes é esta: então não nos defendeste? E o nosso pacto mafioso?

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