«"Há uma solução que é um Governo PSD, CDS e PCP."
Para Bagão Félix "há uma solução que é um governo PSD, CDS, PCP. Uma ideia 'provocative'. Não estou a dizer que pode vir a acontecer, mas nós precisamos de abanar a cabeça senão morremos atrofiados. É quase impossível chegar a acordo com o PCP, mas, se alguma vez se chegar a acordo, este será cumprido. O PCP é muito respeitador, institucionalista."
"Não me repugnava que, num governo deste tipo, o PCP tivesse uma pasta social ou do trabalho. Jerónimo de Sousa é um homem sincero, um homem autêntico, um político sério. A certa altura sinto-me asfixiado pelas soluções equacionáveis. Precisamos de abrir o horizonte teórico das soluções".
"Sendo absolutamente não comunista, respeito o actual PCP e não o ponho no gueto."»
Jornal i, 5.3.2011
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5 de Março de 2011. Cavaco tinha sido reeleito em Janeiro. O mês de Fevereiro foi passado com o secreto frenesim do Governo e da Europa na procura de uma solução que evitasse o resgate de emergência cruzado com o secreto frenesim da direita que planeava derrubar o Governo para precisamente afundar o País e obrigá-lo a aceitar o FMI e a cobertura que os senhores estrangeiros a aterrarem na Portela dariam à tentativa de reengenharia económica e social ambicionada pelos fanáticos da austeridade salvífica a salivar de gula com os olhos postos nos colossais negócios que a fúria de desmantelar e diminuir o Estado iria proporcionar.
5 de Março de 2011. Dentro de quatro dias, Cavaco iria à Assembleia da República fazer um comício contra um Governo minoritário seguro por arames e cercado por todos os lados. Nele declarou que não era político, que não queria mais sacrifícios (ou seja, que não queria a austeridade até então imposta pela Europa ao Governo socialista desde a eclosão da crise das dívidas soberanas um ano antes), e que a rua tomada pela “juventude” se devia levantar contra a classe política. Foi um Grândola Vila Morena tocado ao contrário. A 23 de Março vimos a esquerda sectária a entregar o poder à direita rapace, traindo o seu mandato eleitoral e as revolucionárias promessas de defesa dos trabalhadores, dos pobres, dos fracos.
5 de Março de 2011. Para Bagão Félix, como para toda a direita, Sócrates é um inimigo que parece invencível. Que parece, apesar de tudo o que foi lançado contra ele e ao longo de tantos anos, ir conseguir ficar à frente do PSD numas próximas eleições. Era o que diziam as sondagens ao tempo. Se 2009 se voltasse a repetir, o desespero no PSD e no CDS atingiria níveis psicóticos, a oligarquia começaria a limpar as armas. Este o ambiente mental de grave perturbação emocional que levou o Bagão para um repente “provocative” que, nove anos depois, ganha uma inusitada e triste actualidade.
O que o argumento diz de Jerónimo é convencional, destituído de surpresa, pese vir de uma figura da direita. O 25 de Novembro tinha há muito acabado com o papão comunista. Ao longo dos anos 80 e 90, com as profundas alterações económicas e sociais advindas da entrada na CEE e depois na União Europeia, o PCP foi garantindo um mercado eleitoral estável que, por causa da demografia e do aumento dos serviços, no entanto via diminuir a sua influência sindical numa dinâmica inexorável. O desaparecimento da URSS e do bloco soviético também não ajudou à saúde da ideologia, pelo que o PCP foi sempre um dos mais importantes aliados da direita ao se manter granítico na recusa de fazer qualquer acordo com o PS para lá da esfera autárquica. Os socialistas, por sua vez, jamais iriam cometer o suicídio de abandonarem o socialismo democrático defendido heroicamente por Mário Soares, pelo que o bloqueio durou até 2015, não entrando sequer na fértil imaginação do Félix em 2011.
O que entrou foi uma típica cognição de um típico conservador de direita que descobria num adversário com cara de mau um coração de oiro, tal qual como o seu ou até melhor. A “sinceridade”, a “autenticidade”, a “seriedade” que reconhecia em Jerónimo, essa dimensão moral clássica e essas virtudes também bíblicas, era precisamente o que Sócrates e os socialistas não tinham, bandidos e diabólicos do pior como eram. Já Jerónimo, com ideias parvas e perigosas, ainda assim podia ser influenciado, controlado, dominado caso fosse possível sacar-lhe uma assinatura num acordo. E, homem de fé que é, o céu na terra pareceu-lhe possível, visualizando em transe mediúnico o bom Jerónimo a levar os comunistas para um Governo do imperialismo capitalista a troco de um ministro do Trabalho ou de uma coisa dessas parecida que implique estar sempre em reuniões com o povo. Seria perfeito pois a CGTP passaria a fazer a segurança dos comícios do PSD e do CDS, começou a fantasiar um Bagão cada vez mais alegre e com vontade de dançar sozinho no salão, de saltar gaiato e cantar à janela para acordar os vizinhos.
Trago esta memorabilia para medirmos a distância a que se encontram, em 2020, Rui Rio, Manuela Ferreira Leite e Morais Sarmento, entre tantos outros dirigentes e comentadores direitolas, deste terreno decente, humanista, personalista, em que Bagão Félix arriscou o ridículo em nome de uma convicção que temos a obrigação de aplaudir: a de que a pessoa não é para a ideologia, a ideologia é que é para a pessoa. Nesse pressuposto, caem os sectarismos e podemos ficar juntos, com as respectivas diferenças de projecto político, na defesa do bem comum e na realização do interesse nacional – caso se chegue a acordo, lá está.
Rui Rio, Manuela Ferreira Leite e Morais Sarmento et alia nunca terão de responder a esta pergunta: “Acha que André Ventura é um homem sincero, é um homem autêntico, é um político sério, e que o Chega é um partido respeitador, institucionalista?” Nunca terão de responder porque não há quem lhes faça a pergunta e, mesmo que houvesse, nunca iriam dizer o que pensam a seu respeito em público. Estão, pois, muito bem uns para os outros quanto à hipocrisia e ao cinismo. Eis a decadência da direita no seu irrespirável fedor.
foi um agradecimento bonito e hipócrita do senhor feliz ao senhor contente pela ajuda no derrube do governo do sócras e félixmente não houve necessidade de contratar o gerómino para o governo porque psd e cds tiveram maioria, seria uma colher a mais no pote. agora votam chega, o ventura tira-lhes os subsídios e os gajos dizem que a culpa é dos xuxas que não os obriga a trabalhar, querem apanhar covid e o governo socialista reprime-os, portantes já devem ter assinado a certidão de óbito com o marcelo para dissolução do parlamento no próximo verão e feito o testamento a favor do ventura.
O Bagão, sentindo-se “asfixiado pelas soluções equacionáveis”, admitia no seu delírio que os comunistas talvez quisessem suicidar-se, coligando-se com a direita a troco de uma pasta. A ideia não tinha nada de humanista ou personalista, foi um simples assomo de maquiavelismo, bastante inepto e indigente.
Os Bagões de hoje sentem-se novamente asfixiados e continuam a sonhar com novas equações, mas a única que se lhes depara é uma aliança com o fascistoide do Chega. Não tenhas dúvidas que arranjarão outros argumentos para a justificarem, já que não podem citar a respeitabilidade nem o amor às instituições do dito macaco.
Já ouvi um: se o PS pode aliar-se com o PCP, porque é que a direita não se pode aliar com o Chega? O Bagão iria gostar deste argumento e, para o defender, até poderia lembrar que no passado já admitiu uma coligação da direita com o PCP.
Na anilha sr. não duram mais 4 anos.