Em relação à perspectiva taumatúrgica de Teodora Cardoso, o relatório impiedoso de Louçã faz doutrina: Do milagre segundo Teodora Cardoso aos offshores. Porém, a Nicolau Santos deve-se o mérito de chamar a atenção para a pulhice em curso: Em defesa de Teodora Cardoso.
A pulhice consistiu em retirar do contexto o uso da palavra milagre, a um ponto tal em que a responsabilidade pela introdução do termo na situação mediática que o regista, o qual surgiu pela iniciativa de um jornalista, se transfere para Teodora Cardoso, esta limitando-se a corresponder de boa-fé ao sentido da pergunta e sua conotação metafórica e/ou irónica. A pulhice ganhou peso com os comentários sarcásticos do Presidente da República e do primeiro-ministro, os quais tiveram graça num assunto onde ela não cabe, a deturpação das palavras, da imagem e do nome de alguém, seja essa pessoa quem for e, por maioria de razão, tendo responsabilidades públicas.
Isto recorda-me de um caso similar ocorrido com Maria de Lurdes Rodrigues, o qual se inscreveu na cultura política da pulhice a que a nossa decadente direita recorre por vocação e miséria. Numa comissão parlamentar, um deputado do PSD (se não me falha a memória) referiu-se às obras da Parque Escolar usando a expressão “foram uma festa”. Ali, o referente era irónico e negativo, intencionando ser uma provocação e uma ofensa. Na resposta, a ministra da Educação ao tempo deixou-se tomar pela emoção, indignada com a postura de baixa política do deputado, e pegou na mesma expressão para virar a arma para o atacante, dizendo algo como “Sim, foi uma festa” e de seguida elencando os benefícios que, na sua opinião, tais investimentos tinham trazido para as escolas, para os alunos e para o País.
Na direita, na esquerda, no Parlamento, nos jornais, nas televisões, nas rádios, na Internet, nos táxis, em qualquer recanto onde dois broncos trocassem perdigotos, a ideia de que Lurdes Rodrigues se tinha lembrado de descrever as obras nas escolas como uma festa foi repetida alarvemente milhares de milhões de vezes. Podemos reconhecer que o fenómeno é normal e inevitável do ponto de vista sociológico, psicológico e antropológico. A política é um terreno onde, excepções confirmando a regra, as emoções dominam as cognições e onde a pulsão para destruir o adversário se sobrepõe ao bem comum e à defesa da civilização. Logo, será banal constatar que as oposições jamais deixariam de aproveitar o flanco deixado imprudentemente a descoberto de uma ministra tão fácil de diabolizar precisamente por ser politicamente tão corajosa e tão representativa da coragem de Sócrates como chefe do Governo. Igualmente o ataque a algo incontestavelmente benéfico para a comunidade, a melhoria das instalações escolares no sistema de ensino público, ficava servido de uma munição para a qual não havia defesas pois permitia o berreiro animalesco que destruía qualquer possibilidade de racionalização, aferição e discussão sobre o que estava em causa.
Nestes últimos meses em que a direita decadente tem explorado o caso inconsequente e despachado de um administrador bancário que tentou garantir certas condições pessoais na CGD e viu as suas pretensões goradas por causa do poder da Lei, vários comentadores têm divulgado a posição de que tal, apesar de não passar de baixa política que nenhum benefício traz para os cidadãos e suas preocupações, era inevitável. PSD e CDS estavam a fazer o que tinham de fazer, garantia a elite da opinião publicada, porque a política não passava disso, de uma constante guerra civil onde valia tudo para enfraquecer os adversários e conquistar o poder, inclusive formar uma comissão de inquérito para espiolhar SMS relativos a um assunto já metamorfoseado numa comédia do absurdo. Será que estes cromos, actualmente à frente dos jornais que restam ou com assento nos estúdios de rádio e televisão, têm razão? Não. Zero. Eles são parte do problema, eles e o seu cristalizado cinismo nascido da falta de magnanimidade e da defesa feroz do estatuto e privilégios adquiridos, posto que não combatem pelo fim deste modo disfuncional de usarmos a democracia.
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A politica tornou-se um circo num mundo goebeliano.
https://videlanghelo.wordpress.com/2008/03/03/los-11-principios-de-la-propaganda-de-goebbels/
Vivam pois os heróis descartáveis que há precisamente 25 anos disseram o óbvio.
A hipocrisia é o maior luxo.
https://www.youtube.com/watch?v=Ky4uYnsF3kc
No future.
Muito bem no que diz respeito ao contexto da Teodora, efetivamente não é ela que fala primeiro de milagre, e estas coisas devem ser anotadas. Já a comparação com o caso de M. de Lurdes Rodrigues não colhe: no caso, não se tratou da divulgação de uma afirmação tirado do contexto, mas sim falsa, porque deliberadamente invertida no seu sentido (festa para a direita= gastos perdulários, festa para MLR=melhoria da escola pública). Ela disse, pois, exatamente o contrário do divulgado. Já a Teodora, continuando a não entender por que errou as previsões, concorda com a jornalista (embora com um sorriso) que se poderá falar de milagre. Não foi ela que se lembrou do termo, mas não discorda.
O Costa e a geringonça estão a querer ficar intocáveis.
Já outros socialistas, nem vale a pena mencionar nomes, também governaram intocáveis, até que batíamos contra o muro e lá vinha a direita com maiorias absolutas e arrasava tudo.
A ver vamos! cuidado!
marvl, concordo quanto ao conteúdo, como também explico acima, mas considero a forma igual. Os comentários ao “milagre” da Teodora, e com o agravamento de terem sido proferidos pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro, falseiam a declaração da Teodora pois a fazem autora de uma mensagem que é apenas circunstancial – logo, não justificando a violência e aparato dos sarcasmos. Nesse sentido, e para o que me importa analisar, os casos são exactamente iguais.
«Logo, será banal constatar que as oposições jamais deixariam de aproveitar o flanco deixado imprudentemente a descoberto de uma ministra tão fácil de diabolizar precisamente por ser politicamente e tão corajosa e tão representativa da coragem de Sócrates como chefe do Governo.», …?
Valupi, não penses assim tanto no passado.
Não faz sentido combater um exagero com outro exagero. Colocar ao nível de “pulhice” a reação aos comentários de Teodora Cardoso é, penso, combater um erro potencial com um erro de facto bem maior.
De facto, o termo “milagre” foi lançado pelo jornalista. Mas qual a razão pela qual Teodora Cardoso, não se demarcou de imediato e recolocou o seu discurso nos termos e contextos adequados a uma análise objetiva(!)? Foi ingenuidade ou boa fé quando manteve a sua peroração nesse registo? …?
Também foi isenta quando sentenciou, na sua qualidade de economista do CFP, que acreditar nas metas do défice para 2016 era um ato de fé? Se os críticos de Teodora Cardoso alinharem uma a uma as posições da dita senhora sobre esta matéria não encontrarão razões válidas para serem críticos das suas posições sem cairem no risco de cometerem uma “pulhice”?
Essa ideia de comparar o caso com o de M. L Rodrigues não tem razão de ser por manifesta dissemelhança!
Deve ler-se
“Mas qual a razão pela qual Teodora Cardoso não se demarcou de imediato e recolocou o seu discurso nos termos e contextos adequados a uma análise objetiva(!)? “
Borda d’água, a manifesta dissemelhança aqui está na tua tentativa de desviar a discussão para outra questão, a da crítica política a Teodora Cardoso. Ora, a respeito dessa dimensão, abro o texto a remeter para Louçã, ficando esse assunto arrumado. O resto do que escrevo é sobre a deturpação das declarações de uma pessoa que, concorde-se ou discorde-se do que diz publicamente, merece ser intelectualmente respeitada. A gozação que se fez a partir da imagem de que ela tinha mesmo querido usar a palavra milagre para atacar os resultados do Governo foi grave só porque envolveu o primeiro-ministro e o Presidente da República. É neste plano que constato uma pulhice, pois se está a usar algo falso para denegrir o nome, o prestígio e, portanto, a autoridade do alvo.
mas, quer dizer, qual é o problema de se usar a imagem, a metáfora expressiva, seja ela qual for, na política? a política não é uma actividade orientada para o bem comum? – e não é este um bem de e para gentes? e não são as gentes que sonham e choram e riem? e não são, então, as metáforas que tocam os corações e os cérebros das gentes? então que se fodam! aqueles que não querem nem festas nem milagres na política.
A política não é uma actividade orientada para o bem comum?
Não.
é sim, soistrampa. e se estais desacreditado, meu bem, já que estará em ti o defeito, necessitais de terapia – montes de massagens de invertida cidadania. :-)
Não; aliás, “eu e os políticos” bem o demonstram….
Se foi uma cavalgadura destas a “negociar” a nossa adesão à então CEE (e até à EFTA!), começo finalmente a perceber melhor todo o realíssimo engano em que tem vivido a minha geração nos últimos trinta anos, pelo menos!
Mas nunca é tarde para abrirmos os olhos.