Quando se é muito sincero

«"Eu quero ser muito sincero: acho que havia muitos comentadores que queriam que eu dissolvesse e eu tinha a noção de que o povo não queria que eu dissolvesse, queria que eu, realmente, chamasse a atenção do Governo para dizer aquilo que disse no dia 4 [de maio]: 'olhe que, às vezes, é preciso mudar o que não está bem antes que seja, depois, muito tarde'. Foi isso que eu quis dizer, foi uma prevenção", justificou Marcelo. Marcelo disse que, nessa ocasião, o povo considerou que não ser altura para "deitar o jogo abaixo", porque "poderia ter mais custos do que vantagens".

"Eu tinha a noção do que muitos comentadores achavam: 'É agora, é aproveitar agora, se não é agora, é daqui a 15 dias, ou daqui a três semanas e tal... Deite o jogo abaixo e começa-se de novo'. E, do outro lado, diziam o seguinte: 'Não, não é só deitar o jogo abaixo, também não pode estar a chamar a atenção para aquilo que é a governação e tal'", salientou.

O Presidente da República recuou ao discurso que fez na tomada de posse do atual Governo, em março de 2022, para salientar que, na ocasião, tinha alertado que "uma maioria absoluta tem uma responsabilidade absoluta". "Por isso é mais difícil ter maioria absoluta do que não ter porque, quando não se tem maioria absoluta, há sempre várias justificações: porque o partido A não apoiou, porque o B não apoiou, porque o C não apoiou e tal... Se se tem maioria absoluta, não há essas justificações", sublinhou.

Para o chefe de Estado, quando se tem maioria absoluta, "só há uma justificação para as coisas não acontecerem: é haver problemas naqueles que exercem o poder". "Parece um presente [ter maioria absoluta], mas é um presente com muita responsabilidade. O povo, quando dá esse presente, diz 'Bom, eu agora dou-te o poder todo para fazeres o que deves fazer. Mas faz! Porque, se não fizeres, eu vou ser mais exigente do que no tempo em que tu podias dizer, 'olha, eu não pude fazer porque não me deixaram fazer'", destacou.»

Presidente da República, 9 de Junho de 2023

Estas notáveis — e inacreditáveis — declarações não geraram qualquer escândalo, sequer faladura no comentariado, muito menos no Parlamento. Ajudou terem sido feitas na véspera do 10 de Junho, mas a principal razão para o silenciamento é a conivência de toda a imprensa e sistema político para abafar a perda de capacidades políticas (ou morais, ou cognitivas, é escolher) de Marcelo. No registo oral, parte presente na notícia, a percepção de destrambelhamento é ainda mais impressiva. E o mais grave nelas não é serem excepcionais, no sentido de raras ou únicas. É o de serem ordinárias, no sentido de frequentes, vulgares, grosseiras e demagógicas.

Nunca antes, a qualquer anterior Presidente da República, tinha ocorrido a decadente ideia de equiparar um grupo de umas duas dezenas de indivíduos (se tanto) que enchem os bolsos na calhandrice e no sectarismo, a que Marcelo chamou “comentadores”, com a entidade comunitária e constitucional a que chamou “povo”. Pois aconteceu. Como se pode ler e ouvir (e ver, é procurar), o actual Presidente da República admite que os “comentadores” influenciam as suas decisões presidenciais mais importantes, sendo que quase nenhuma das que tem ao dispor é tão poderosa como a de dissolver a Assembleia. A forma como se refere aos tais “comentadores” expõe de forma obscena o seu entusiasmo com a própria gíria da irresponsabilidade suprema de que desfrutam, para quem abrir uma crise política e afundar o País nas consequências de um caos abstruso não passa de “deitar o jogo abaixo”, arbítrio enfadado ou raivoso de quem não está a gostar dos resultados do corrente “jogo”.

Foi o “povo” que conseguiu deter a força dos “comentadores”, explica com detalhe Marcelo. Como? Bom, através da divina capacidade do ex-comentador (ou nem tanto) para saber o que o “povo” quer e não quer, pensa e sente. Tendo acesso à psique colectiva da Grei, o actual inquilino de Belém fica à-vontadex para fazer e dizer o que lhe der na real gana, transformando a sua função de representante do voto popular sujeito à Constituição numa versão manhosa de um rei iluminado que pode obrigar os Governos a fazerem o que ele achar que deve ser feito. Ele “Marcelo”? Não, pá, ele o “povo”, pois apregoa estarmos perante uma hipóstase ambulante (com sérias dificuldades em ficar calada).

O apotegma “só há uma justificação para as coisas não acontecerem: é haver problemas naqueles que exercem o poder” justifica um tratado. E também tratamento contra crises agudas de populismo.

23 thoughts on “Quando se é muito sincero”

  1. “perda de capacidades políticas (ou morais, ou cognitivas”

    Só pode ser perda de capacidades cognitivas. Quanto às morais, nunca as perderá porque nunca as teve.

  2. Continuas preocupeidado comigo, queridinho? Vê lá isso, bacorinho, olha que te faz mal às hemorróidas!

  3. Agora, a puta velha, até escreve a puta gemas . Ócioso de merda, o que fazes na vida real ? O que fizeste por Portugal ? Aposto que nada …
    Como diz Sérgio Sousa Pinto, um socialista respeitável, e portanto, respeitado, o Presidente da República vai continuar a ter este rosário, de carregar com Costas âs costas …

  4. M
    Não percebeu que o que quis dizer foi que SP de “socialista” não tem nada!
    Isto de pertencer ao Partido Socialista, não se traduz automaticamente na condição de socialista!
    E como tal não pode ser um socialista respeitável!
    Não andei na escola com ele e muito menos consigo!!!

  5. Bingo!
    Evidentemente o Marcelo julga-se Primus Inter Pares no ecossistema da indústria do comentariado, dado que ele quase sempre foi e ainda é essencialmente um comentador. Ao ascender a PR guindou-se, no seu entender, ao estatuto de Oráculo. Juntando aquelas duas qualidades dá a bosta que temos no presente.
    Atendendo às sucessivas intervenções do PR cada vez mais Cavaco Type de tão ressabiadas e intelectualmente pindéricas, penso que ele não seja de facto um oráculo, mas sim um Roberto. Os portugueses são ventríloquos e ele é o nosso Roberto. Assim parece-me melhor.
    No 1º mandato, fruto da conjuntura política (geringonça), Marcelo privilegiou a vertente de Roberto distanciando-se dos seus colegas de profissão comentadeiros.
    No 2º mandato, igualmente decorrente do contexto político (maioria absoluta PS), voltou em força a vestir a pele de comentadeiro sem contudo deixar de se arvorar em Roberto.
    Embora não acredite que o Roberto se deixe contagiar totalmente pela sua faceta de comentador ao ponto de dissolver a AR, creio porém que as suas futuras intervenções serão cada vez mais influenciadas pelos seus colegas comentadeiros e procurarão permanentemente criar um ambiente de tensão e crise com o Governo e na sociedade. O Roberto deixará assim de ser apenas o nosso Roberto e será cada vez mais o Roberto deles, comentadeiros.
    Problema é que há uma divergência fundamental entre os comentadeiros e a sociedade.
    De uma lista de mais de oito dezenas nomes de jornalistas, jornaleiros, comentadores e comentadeiros com intervenção diária, semanal ou suficientemente assídua ou regular nos canais de TV para que possamos considerar que se tratam de opinion makers. Não pretende ser uma lista exaustiva e tenho como certo que não seria difícil acrescentar mais uma ou duas dezenas.
    Consideremos então os grupos RTP/RTP3, TVI/CNN e a SIC/SICN.
    Das mais de oitenta personalidades elencadas 68% são claramente de direita, sendo que os 32% restantes se distribuem entre a esquerda e independentes. E estes números são matizados pela realidade dos canais públicos RTP/RTP3 onde os independentes têm algum peso. Se considerarmos apenas os canais privados a situação de “asfixia democrática”, alô Manuela Ferreira Leite, torna-se ainda mais calamitosa. Nesse caso temos que 75% dos intervenientes são claramente direitolas deixando apenas 25% para esquerda e independentes.
    Mas há um aspeto que me parece ainda mais grave que é a quase total ausência de jornalistas de esquerda com acesso à indústria do comentariado. Considerando apenas os jornalistas temos que 32 direitolas arengam regularmente aos microfones das TV, enquanto apenas 2 jornalistas de esquerda Anabela Neves (CNN) e Daniel Oliveira (SICN) têm esse privilégio. Isto significa que aos jornalistas cujos pontos de vista e análises se identifiquem com a esquerda está de facto vedado o acesso à profissão no que se refere aos microfones e câmaras de TV. É a liberdade de imprensa à portuguesa.
    Creio que este tema é merecedor da atenção de pós graduados ou até doutorandos na área da Comunicação Social, contudo a ninguém se lhe faz presente, como dizem lá na terra, essa oportunidade.
    Também os/as compreendo… depois de apresentar um trabalho com este tema onde iriam trabalhar? Seriam certamente mais uns/umas emigrantes.

  6. Aqui fica a lista:
    Paulo Baldaia
    Helena Garrido
    João Taborda da Gama
    Paulo Pedroso
    António Costa Pinto
    Ricardo Jorge Pinto
    Ana Isabel Xavier
    Poiares Maduro
    João Soares
    Pedro Sousa Carvalho
    Manuel Carvalho
    José Manuel Fernandes
    Ana Drago
    Rodrigo Moita de Deus
    Raquel Varela
    Inês Pedrosa
    Joaquim Vieira
    Ricardo Paes Mamede
    Ricardo Arroja
    Santana Lopes
    Camilo Lourenço
    Marcos Perestrelo
    Francisco José Viegas
    Luís Campos Ferreira
    João Pereira Coutinho
    Eduardo Cintra Torres
    Sebastião Bugalho
    Mafalda Anjos
    Rui Calafate
    Miguel Relvas
    Álvaro Beleza
    Helena Matos
    Sérgio Sousa Pinto
    Anabela Neves
    Anselmo Crespo
    Rogério Alves
    Paulo Ferreira
    Carlos Magno
    Paulo Magalhães
    Joana Amaral Dias
    Pedro Cruz
    António Costa
    Alexandra Leitão
    Pacheco Pereira
    Lobo Xavier
    Pedro Tadeu
    Pedro Santos Guerreiro
    Teixeira dos Santos
    Manuela Ferreira Leite
    Hugo Matias
    Miguel Pinheiro
    Adalberto Campos Fernandes
    Henrique Machado
    Luís Rosa
    Bernardino Soares
    Rui Moreira
    Raquel Abecassis
    Cristina Azevedo
    Ângelo Correia
    Vasco Rosendo
    Ana Sá Lopes
    Paulo Portas
    José Gomes Ferreira
    Ricardo Costa
    Daniel Oliveira
    Ângela Silva
    Bernardo Ferrão
    Cristina Figueiredo
    José Júdice
    Francisco Mendes Silva
    José Eduardo Martins
    Miguel Morgado
    Paulo Delgado Alves
    Pedro Marques Lopes
    Luís Pedro Nunes
    Clara Ferreira Alves
    Catarina Martins
    Cecília Meireles
    David Dinis
    Marques Mendes
    Ana Gomes
    João Maria Jonet

  7. O PS, tal como outros partidos numa democracia representativa – seja lá isto o que for -, precisam, como de pão para a boca, de palhacitos como o Sérgio e a Ana destravada para dar uma de ecletismo (passe o plebeísmo). O mesmo para os ocs controlados pelo capital. Concorda ou não com este pensamento profundo, senhor Mê?
    (Pensamento que está distante de um apotegma. Senhor Valupi, não me obrigue a ir tantas vezes ao dicionário)

  8. PEDRO M por favor a k tu a lisa a lista todos os dias, ó despois na altura acerta eu arrespondote .inté lá vai para ondes devas ire…extensivel aos v lupus e xuxas merdais em general. Auarevoir!
    Basilio el xuxalhote

  9. Pois não, você tem comportamento de menino do coro, presumo que andou no colégio das freiras, irmãs aputagetas xuxas. Aparelhista, Arrivista, oportunista, carreirista, e se calhar, também carteirista ! Toma lá snob !

  10. traduzes a realidade cada vez melhor, Valupi, sinto muito orgulho nas tuas análises – muitas vezes elas salvam os dias. e fico mesmo mesmo triste que a sinceridade do Marcelo fique escarrapachada no populismo que exalta, sem qualquer vergonha, sem qualquer filtro. é degeneração cognitiva e moral, sim, a família se não dá conta é porque não o ama para recolhê-lo da vida pública. não percebo.

  11. Hummm. esta é a mesma Olinda que um dia, chamou grande paneleiro a Valupi ?
    Custa a crer. ..Pode ser que seja elogio falso. .. Sempre achei que a imagem de frivolidade e aparente burrice, fosse deliberadamente, cultivada e assumida, como disfarce …

  12. o M de cócó está com uma narrativa tal & qual a do selfies, reparem quantas vezes já posou (o magano não posta, posa) neste artigo, até parece o selfies à procura de carpideiras de pedrógão para consular (leia-se posar prá foto) e o que gatafunha é não só incoerente como cognitivamente muitoooooooooooo abastardado

  13. Mais um rafeiro, – se calhar é o mesmo do costume, o gajo não dorme, só pode ser má consciência. Resumindo, p … que o pariu .

  14. M, esta é a Olinda de sempre, cada vez melhor, que lhe chama a si grande, enorme, gigantesco, azeiteiro. !ai! que riso

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