Na Comissão de Inquérito sobre a tentativa de José Sócrates de controlar a TVI, tive ocasião de ver como uma parte significativa da nossa elite política, social e económica mentiu com todos os dentes que tinha para proteger um Primeiro-ministro então “amigo” e também para proteger os seus negócios, presentes e futuros. No final do inquérito, Passos Coelho interveio pessoalmente para proteger Sócrates de conclusões que denunciavam as suas mentiras e o seu papel, e mesmo o BE e o PCP actuaram para evitar as consequências plenas de se verificar que o Primeiro-ministro mentira ao Parlamento. Nenhum quis colocar Sócrates perante as suas responsabilidades e isso por uma razão fundamental: todos pensavam que os portugueses não “compreenderiam” que o Primeiro-ministro pudesse cair porque conduzira através dos seus homens de mão uma operação para controlar uma estação televisiva que tinha noticiários hostis e fazia mossa ao governo. E, deste ponto de vista, tinham razão.
Os jornalistas, por sua vez, salvo raras excepções, é muita indignação e lábia, mas rapidamente se deixam envolver nos “lados” da politização do caso e nas tricas entre jornais e entre eles próprios. Ainda há um pequeno número de órfãos de Sócrates nos jornais, que hoje protestam contra Relvas, indiferentes às sucessivas tentativas de Sócrates de manipular a comunicação social, muitas com êxito.
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Que diria o Pacheco Pereira se o Pacheco Pereira tivesse tempo e disposição para dizer coisas a respeito do Pacheco Pereira? Talvez daqui por 10 ou 15 anos o saibamos, numa autobiografia mais do que merecida. Entretanto, temos à disposição a facúndia pela qual ganha a vida e rivaliza com Marcelo no topo da cadeia alimentar das estrelas da política-espectáculo. Tal como Marcelo, Pacheco é bífido, ora julgando os políticos como observador, ora indo para a política julgar os observadores. Este exemplo acima, o seu papel no caso Sócrates-TVI, é paradigmático da duplicidade que lhe permite jogar com as brancas e com as pretas ao mesmo tempo e ainda ter lata para se queixar da inclinação do tabuleiro.
Comecemos por lhe dar razão. É altamente provável que Sócrates quisesse “controlar a TVI” e acabar com o “Jornal de Sexta”, entre outras malfeitorias. E isso pela mais lógica das razões: por ser lógico querer defender-se e/ou atacar os adversários. A TVI do casal Moniz era uma entidade com uma agenda política de destruição do Governo e do PS com recurso a difamações e calúnias sistemáticas. Igualmente provável é ele ter verbalizado isso mesmo, ou parecido, com os seus amigos e/ou colaboradores mais próximos. Acresce que a área do PS não tem nenhum patrão de imprensa, estando o panorama mediático português quase todo nas mãos da direita ou coisa pior. E, para cúmulo, a exploração do caso Freeport era especialmente penosa para a vida pessoal e política de Sócrates, sendo um dos principais factores de desgaste num ciclo já profundamente condicionado pela crise de 2008/9 e o conflito com os professores. Logo, passar-lhe pela mona a fantasia, ou a cobiça, de se ver livre dos mastins de Queluz é algo que o bom senso popular carimba como normal.
Bom, mas nem tudo o que se pensa – se é que se pensou – se faz, creio não me enganar neste pressuposto. Que é que foi feito para dar o controlo da TVI a Sócrates? Que se saiba, nada de nada de nadinha de nada. E quanto ao que não se sabe, o que teria de ser feito já não se papa com o senso comum, temos de recorrer a uma imaginação muito fértil. Segundo os acusadores que promoveram as feéricas e inesquecíveis comissões parlamentares de inquérito ao caso, o plano de Sócrates implicava a cumplicidade de Henrique Granadeiro e Zeinal Bava, os quais iriam convencer, ou condicionar sabe-se lá como, os accionistas da PT para se meterem num negócio de objectivos políticos secretos com vista a exercerem censura à maluca sobre um dos programas mais populares do canal e sobre uma das personalidades mais poderosas da sociedade por via da sua celebridade, feitio e ligações. Resultado deste plano caso tivesse sido executado? Assim que a PT adquirisse a TVI até a mais leve corrente de ar no estúdio passaria a ser considerada uma potencial interferência de Sócrates. E se, então, a PT acabasse com o charco de Moura Guedes, haveria uma marcha de 1 milhão de portugueses na Avenida da Liberdade em sua defesa e a pedir a decapitação de Sócrates, do Granadeiro, do Bava e de todos os militantes socialistas juntamente com os seus filhos. Foi este o genial plano do diabólico Sócrates que o PSD, CDS, BE e PCP andaram a investigar durante meses na Assembleia da República.
Dois deputados consultaram as escutas onde se fundamentam as suspeitas: o Pacheco e o João Oliveira, do PCP. O primeiro disse que encontrou informações “avassaladoras”, o segundo que nada de novo lá está. Um dos dois está a mentir, dá ideia. E um dos dois continua a repetir que Sócrates queria isto e aquilo, era aquilo e isto. Ora, se nós até podemos achar graça ao desespero raivoso de uma patética figura que chega a dizer que Sócrates foi defendido por Passos Coelho, por Louçã e por Jerónimo, já não devíamos achar graça nenhuma ao modo como o faz. É que o Pacheco, mesmo na posse de informações “avassaladoras”, mesmo tendo a comunicação social aos seus pés mais os recursos materiais e humanos que quiser para a missão, não faz prova de nada. Nem sequer permite o contraditório. Repare-se nesta frase:
Ainda há um pequeno número de órfãos de Sócrates nos jornais, que hoje protestam contra Relvas, indiferentes às sucessivas tentativas de Sócrates de manipular a comunicação social, muitas com êxito.
De quem fala? Do que fala? Quem são esses “órfãos de Sócrates nos jornais”? Alguém sabe? Quais foram as tentativas de Sócrates de manipular a comunicação social que tiveram êxito? Alguém sabe? O Pacheco não diz para poder continuar a difamar e caluniar, numa farronca imparável onde se sonha o solitário e predestinado cavaleiro que matou o fantástico dragão cor-de-rosa. À sua volta, os direitolas repetem a cobardia de nada provarem nas furiosas atoardas quotidianas, apertando as peidolas uns contra os outros enquanto guincham que Sócrates é muito mau, muito mau, muito mau, um monstro.
Não tenho bem a certeza, mas apostava que a verdadeira direita tem asco destes trastes.
Indigência intelectual é Pacheco Pereira. Para pobres de espírito desta laia, não dou moeda. Prefiro um qualquer arrumador de automóveis.
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Falando de coisas importantes: quando e por quem é que terá sido produzido o dossier das secretas sobre Ricardo Costa, que hoje foi revelado? Não terá sido aí por alturas da publicação pelo Expresso das cartas de Cavaco e filha a Oliveira e Costa dando “ordem de venda” das acções da SLN?
E o famoso dossier sobre Rui Paulo Figueiredo? Não terá vindo na mesma época da mesma fonte, Silva Carvalho, o amiguinho que trata por tu o Relvas e lhe dá palpites para as chefias do SIS?
Já não sabem quem é o Rui Paulo Figueiredo? Cito o famoso email de Alvarez para Tolentino, que pôs a nu a inventon cavaquina-limiana das escutas de Belém:
“Depois [Fernando Lima] entregou-me um dossier sobre um Rui Paulo da Silva Figueiredo que é adjunto jurídico do PM [José Sócrates], trabalha para o MAI, já passou pelos gabinetes de diversos ministros e, segundo o Fernando Lima, terá tentado entrar para o SIS mas chumbou.”
Já agora, quem terá chumbado o Figueiredo e porquê? Silva Carvalho deve saber.
Muito mais importante: qual terá sido o papel de Silva Carvalho nas campanhas de assassinato de Sócrates?
Hoje sabemos, por causa duma vulgar viagem de George W Bush ao México em 2007, que Silva Carvalho já “trabalhava” para Relvas (e para Belém?) bem antes da inventona das escutas.
Isto está a ficar um nadinha mais claro, está. Esperemos os desenvolvimentos.
caro valupi;
O pacheco vaca louca, deve andar com o cuzinho a tremer de medo. Ele não é capaz de produzir uma crítica desagradável ao governo do seu ppd/psd sem que não tenha, invariavelmente, de iniciar conversa de boca ou caneta com uma comparação com Sócrates através de insinuações que nunca ninguém provou, nem os tribunais.
Sócrates é o seu sonho político noite e dia, ao contrario de Narciso ele vê sempre e só Sócrates no seu espelho e, como não pode amar outro que não ele próprio, ao Sócrates impassível e omnipresente que não sai um momento da sua corrente de pensamento, ele toma-o como o homem que lhe invade a intimidade física e intelectual e eventualmente sentirá um peso na cabeça que toma como um par de cornos metafísicos.
Este pacheco mais o seu amigo vgm são os maiores parasitas a sugar e secar toda e qualquer inteligência e capacidades que surjam e lhes ofusque o seu “comércio-politico-intelectual” que sendo pobre, mediocre e rasteiro não pode consentir que outros tenham asas.
Tenho a quase certeza de que este Porco cebado Barbudo também dorme com uma T-shirt com a imagem do Sócrates, e sonha com ele a cortar-lhe o pescoço e a viola-lo, será?? Que personagem ridícula que já conheço desde que militava na Esquerda
Muito bom, Valupi. Não há comentador de direita que não vá buscar o Sócrates para comparação com o Relvas (ainda ontem o Lomba, num texto ridículo, dizia, resumindo, que o que está a acontecer entre Relvas e as secretas foi culpa do Sócrates e de quem não denunciou jogadas semelhantes (!) na altura). Não há comparação possível. Um estava a ser queimado na praça pública sem o mínimo fundamento, só porque sim, talvez por ser bom de mais. O outro, com a comunicação social toda altamente favorável, tem tiques de Pide, ele sim, não admitindo a mais pequenina brecha num controlo que já é imenso, chegando ao ponto de cometer ilegalidades. Estou com o Júlio: penso que tudo já vem de lá mais para trás.
Este (e alguns outros, mas poucos) blog continua a ser o refúgio matinal que me permite convencer de que afinal não estou louco, que outros pensam como eu, embora raramente os veja “à solta” por aí, e ainda menos a falar em público.
É pouco, é verdade, mas vai dando para manter a sanidade.
Obrigado.
Já dizia o Dr. Karlos Marke-se: uma vez leninista aos vinte e um anos, paranóico para toda a vida…
Jacinto Leite Capelo Rego, PhD.
Seja quem for este Val, isto e um grande escrito. Claro, tal como o Pacheco tem o senao do Socrates.
Óptimo escrito, mas não consigo deixar de ficar perplexo.
Se o Pacheco, essa espécie de anti-polígrafo humano do mundo político-mediático, nos garante que o Relvas é um mentiroso (e um descarado mentiroso a multiplicar por três tipos de mentira, quase tão mentiroso como o Coelho, mas com a agravante da maturidade etária e psicológica) com a mesma certeza absoluta e inabalável com que nos garantiu que os planadores de balsa do tirano Saddam eram armas intercontinentais de destruição maciça e a proveta energicamente agitada pelo Secretário de Estado americano no Conselho de Segurança continha germes capazes de exterminar metade da população do globo, torna-se quase impossível não acreditar que alguma coisa nas palavras ou silêncios do Relvas, por mais estranho que pareça, não seja completamente mentira.
Alguma coisa nos está a escapar e eu por mim começo a acusar o cansaço de ouvir todos estes estafermos dos media. Por este caminho acabo por acreditar que sim senhores, o que está em marcha é mesmo uma nova e subtilissima conspiração do Napoleão do Crime, dirigida contra a nação a partir da sua base de Paris.