Política da espionagem

É o sonho de qualquer político: conseguir que uma investigação legítima a um caso de corrupção permita escutar os adversários num ano triplamente eleitoral e tendo a sorte de se ter encontrado matéria para abrir uma outra investigação a tempo de influenciar os resultados eleitorais ou para explorar a decisão de não abrir essa mesma investigação no período posterior às eleições. O mais difícil, ou nem por isso, é inventar o caso adequado, de modo a que todos os magistrados envolvidos saiam impolutos de qualquer suspeita – em Aveiro, eles apenas começaram por ir à procura da sucata, o ouro foi encontrado absolutamente por acaso.

É uma situação original, tanto para a Justiça como para a sociedade. Obriga a encontrar soluções novas, como o Presidente do Supremo e o Procurador-Geral já começaram a fazer no seu âmbito. Os partidos ainda revelam não saber como aproveitar as benesses oriundas das revelações geradas pela comunicação social, sendo que o PSD é o exemplo mais interessante por ser o mais contraditório: diz que há crimes mas nada faz para os apurar ou sancionar. Esta postura permite concluir que o PSD prefere manter o assunto como permanente foco de desgaste de Sócrates e do Governo, não sendo do seu interesse que ele desapareça da agenda mediática. Os restantes partidos da oposição vão a reboque desta estratégia, todos procurando abater Sócrates.

A oposição não esclarece os portugueses quanto às formas como vamos resolver os problemas nacionais, por um lado, e faz da sua actividade um constante boicote da actividade governativa, pelo outro. Os partidos da oposição tratam o Governo como um corpo ilegítimo, preenchido por pessoas criminosas e incompetentes. Não há nada que o Governo faça bem ou que seja suficiente. Se não fala acerca das notícias, dizem que o Governo não esclarece. Se fala, dizem que o Governo não governa. Para cúmulo, não querem que o Governo se demita nem querem que o Governo cumpra o seu programa. As lideranças partidárias na oposição são o espelho de um país disfuncional.

A redução da política à devassa da privacidade é um legado desta oposição. As consequências são imprevisíveis. Mas algumas poderão ser excelentes, assim saibamos reconhecer que não é este o Portugal que merecemos e queremos.

2 thoughts on “Política da espionagem”

  1. Valupi,

    Não sei se ouviste ontem o frente a frente, ou lá o que é aquilo, entre Bagão Felix e Garcia Pereira. Ouvi por acaso. Pela primeira vez vi, sem papas na língua, alguém como Garcia Pereira pôr o dedo na ferida: há corrupção em Portugal, sim, a mesma corrupção que existe no Ministério Público. E falava do Face Oculta e do material em segredo de Justiça devassado nos jornais.
    È tempo de dizer aos portuguesdes que a corrupção chegou onde era suposto nunca chegar, ou não chegar da forma brutal que chegou. Porque o poder dos Magistrados é praticamente absoluto, como se tem visto, perante a completa impotemcia de quem é julgado, pela devassa do segredo de justiça, na praça pública. Hoje é o PM, amanhã pode ser um PR que os aborreça. E como se não bastasse esta deshonra de si próprios, os Magistrados solidarizaram-se com outro poder absoluto, o do poder económico, que transformou o que deveria ser a comunicação social, no megafone dos justiceiros inquisitoriais. Absolvem nos tribunais tudo aquilo de que são acusados os jornalistas em relação à devassa do segredo de justiça, em nome da lei absoluta da liberdade de expressão, que prevalece sobre todos os outros direitos do cidadão consagrados na Constituição. Deste modo, têm ordem, implicita, dos tribunais, para caluniar e destruir vidas. É o que está acontecer e só ouvi o Garcia Pereira dizer que a corrupção chegou ao Ministério Público.
    Se não se admitir e denunciar vigorosamente esta triste realidade, nada se fará para atacar o mal da corrupção. Que existe em todos os sectores e também na omnipotente e sacrossanta Magistratura.
    Como dizia Marinho Pinto, os magistrados e juizes também fedem. Atacar os que são fedorentos é salvar o edifício na nossa Justiça.

  2. O actual Ministério Público já não tem arranjo.É necessário criar outro com outras pessoas e sobretudo com outra cultura.

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