Polichinelos sorridentes

Francisco Seixas da Costa é uma improbabilíssima figura para ser citada a propósito da publicação dos resultados da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa. Não fez e não faz parte da ICP. Não participou na dita Comissão. Não é uma das vítimas à espera de ajuda e da Justiça. Por que raio a sua opinião sobre a matéria, qualquer que fosse, teria relevância suficiente para ser destacada? E, para mais, neste modo a despachar, numa única frase, e tendo um arcaico blogue como veículo de divulgação?

Acontece que tudo nessa singular frase é singularmente significativo. Começa com a prioridade de olhar para si (“Como ateu”, como se isso importasse à audiência), passa para o eufemismo (“momento menos simpático”, em vez de “desgraça tremenda”, “revelações trágicas”, “escândalo profundo”), salta para a ICP como marca (“património cívico e moral”, ou seja, a dimensão do poder fáctico), volta ao eufemismo (“esta mancha”, algo que sai com sabão, bem diferente de uma ferida, uma doença, um golpe fatal) e termina com a assunção da sua cumplicidade (“segredo de Polichinelo”, isto é, ele já sabia da coisa desde sempre, apetece-lhe bocejar).

O diplomático, delicado e distinto Francisco não teve tempo para soltar um lamento dirigido às vítimas. A sua preocupação atendeu antes à salvaguarda da instituição e, nela, aos elementos com quem tem variadíssimas relações sociais e pessoais. A mensagem é a de que esta chatice vai passar, em breve estará esquecida, e continuará a haver muito “património” com a chanchela ICP para desfrutar pelos anos, décadas e séculos vindouros. E se ele assim pensa, e até o publicita, podemos estar certos de que representa o pensamento e atitude dos círculos por onde se move, as elites da política, da economia e da comunicação social.

Portanto, basta uma frase de um incauto autor, o qual nada de nada de nadinha de nada tem a ver directamente com a problemática, para podermos fazer um diagnóstico sobre as causas sociológicas e políticas que estão na génese dos crimes cometidos por sacerdotes católicos. Na sociedade, era do domínio público a existência dos abusos e das violações, sem que tal levasse a uma indignação popular, assim se estabelecendo como uma forma passiva de cumplicidade. Na política, era do conhecimento de todas as autoridades (legislativas, executivas e judiciárias, a que se juntam as policiais) o mesmo que corria à boca pequena ou cheia na sociedade, por maioria de razão e com muito mais informação ao dispor, assim se cristalizando e consagrando a activa cumplicidade do regime, da comunidade, com os crimes sistemáticos. O que de imediato desperta a pergunta: que outros crimes secretamente no domínio público se andam a cometer impunemente? Por exemplo, será a utilização da Justiça para o combate político um deles?

Não foi assim há tanto tempo, historicamente, que a prostituição masculina infantil e juvenil em Lisboa aparecia em guias internacionais. Os senhores estrangeiros eram convidados a passear nos Restauradores, ex-líbris da Capital, podendo servir-se do material exposto sem o menor risco de aparecerem agentes fardados ou à paisana a perturbar a captação de divisas. Consumo turístico brindado com o sorriso irónico dos Polichinelos que subiam ou desciam a Avenida.

16 thoughts on “Polichinelos sorridentes”

  1. Ha aquele famoso proverbio africano:
    “E preciso uma aldeia inteira para educar uma crianca”

    Que muitos alegremente subscrevem. Esquecem-se que ha um corolario implicito:

    “Se e preciso uma aldeia inteira para educar uma crianca, entao talmbem e preciso uma aldeia inteira para violar uma crianca.”

    Referencia e circunflexao obvia ao excelente filme “Spotlight”.

  2. bem , começo a pensar que o v foi abusado por algum padre.
    desde que a igreja dos homens começou que há pedofilia nela , basta analisar a história do papado ao longo dos dois milénios. por volta do século V um deles escreveu uma encíclica a tentar tratar do assunto. é um problema estrutural da igreja e muito bem conhecido : um segredo de polichinelo.
    por outro lado , sabendo-se que há professores que abusam de alunos , devias fazer a mesma condenação da Escola e cortar-lhe o pescoço .
    passei a vida no meio de monges e gosto imenso deles. nunca vi faltas de respeito , só muito cuidado connosco . são excelentes educadores .

  3. afinal , já no século II , Didascalia Apostolorum, o tema era tratado como um problema.

    cual es el más antiguo texto eclesiástico tratando del tema de lla pederastia en la Iglesia católica?

    El tema de la pederastia en la Iglesia católica es complejo y ha sido objeto de discusión y controversia a lo largo de la historia. Existen textos y documentos eclesiásticos que abordan la cuestión de la conducta sexual inapropiada por parte del clero, incluyendo la pederastia. Uno de los documentos más antiguos que se conoce es la Didascalia Apostolorum, un tratado del siglo III d.C. que establece ciertas normas para la conducta de los clérigos y sanciona a aquellos que se involucran en conductas sexuales inapropiadas. Otro documento importante es la Decretum Gratiani, una recopilación de leyes canónicas del siglo XII que también aborda la cuestión de la conducta sexual inapropiada por parte del clero.

    Es importante tener en cuenta que, a lo largo de la historia, la Iglesia ha abordado el tema de la pederastia y la conducta sexual inapropiada de diversas maneras, y ha habido momentos en los que ha habido una mayor o menor tolerancia hacia estos comportamientos. En los últimos años, la Iglesia ha trabajado para abordar y prevenir la

  4. Lowlander , raciocínio lógico e neutral não é para todos , como vê a IA concorda comigo. nada de emoções quando se trata de analisar um problema. aprenda , segundo o V , a IA pode aumentar a inteligência natural , que no seu caso é pouca.

  5. e diria que o novo papel que a mulher tem na sociedade é o responsável político e sociológico dos crimes de abuso infantil serem tão expostos e condenados. a entrada da mulher a bisbilhotar o que se passa nos clubes masculinos , seres incapazes de controlar os instintos ( e é este o grande e único problema que conduz a todos os demais) , tem consequências extremamente benéficas na proteção de crianças e jovens,

  6. O trabalho de casa da Igreja portuguesa está feito. A comissão independente não pode ficar por aqui. Se não alargar rapidamente o âmbito da sua investigação e esclarecer o número de abusos sexuais ocorridos nos últimos 70 anos na Escola Pública, nas prisões, nas associações desportivas, nas empresas, nas diferentes etnias e raças, e mesmo nas famílias, assistiremos a uma expiação medieval num grupo social específico, tocada a justiça selectiva e arbitrária. O estouro do Estado de Direito

  7. e em tua casa, galuxo.
    a investigação só avança quando esclarecermos os abusos sexuais ocorridos em tua casa e na da yo.
    senão é injusto!

  8. que vergonha, um atado ao civismo e à moralidade católica mascarado de ateu – como se ser ateu significasse ser justo e gente em condições. ser património da humanidade é não deixar que se manche ou não ser a mancha que mais mancha – e não dar a bênção à manchinha. mais badalhoco ainda é dizer que se devem proteger segredos que dizem respeito à dignidade humana, são os segredos ginastas que precisam de espaço para abrir os braços e as pernas para assim se manterem. badalhoco.

  9. se eu tivesse sido vitima de abuso em casa ou nalgum estabelecimento que frequentasse de pequena agradeceria bastante que não dessem preferência a nenhuma classe de homens nas investigações nem na condenação pública.
    e antes abusada por um padre do que pelo pai.

  10. à quantidade de esperma fermentado que jorra no que diz, yo, eu acho que o mais provável seria o padre afinal ser o seu pai. !ai! que riso.

  11. “e antes abusada por um padre do que pelo pai.”

    E isto a melhor defesa da ICAR que se arranja?
    Abjecto. Esgoto. Etico-moral.

  12. É tal e qual a caracterização feita ao sr. Seixas, aliás lí em tempos que há muita homossexualidade no meio diplomatatico português, ainda recentemente ocorreu um escândalo com um diplomata no Senegal, creio .

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