«Bendita a hora em que assinei o chamado "manifesto dos 50", agora muito mais necessário do que nunca, porque o justicialismo, a forma de abuso do poder no aparelho de justiça, comunica directamente com o populismo, a jusante e a montante.
[...]
O justicialismo não é de esquerda face à direita, ou vice-versa, é de "nós", os zeladores pela moral pública, os santos, os intocáveis, os senhores da lei, contra "eles", os corruptos, os da política. Quais são as armas? Tudo menos a lei e a condenação em julgamento, a validação do sucesso da investigação pelas condenações em tribunal... Isso é irrelevante, o que se pretende é fazer fugas para a informação, buscas de aparato, prisões punitivas, violação das leis sobre a prisão preventiva para obter confissões pela violência de se estar preso fora da lei. Esta forma de actuar está no centro da deriva populista. Ela é o alimento do Chega e, pior do que isso, o alimento do desgaste da democracia.»
Porquê dar atenção ao Pacheco? Porque ele nos ajuda a compreender a cultura portuguesa e a natureza humana. Tal deve-se ao seu longuíssimo protagonismo mediático como vedeta da indústria da calúnia. Uma vedeta senatorial, com estatuto de servidor público, e ostensiva vocação para vir perfectae virtutis.
É muito fácil concordar com o Pacheco, em muita e muita coisa. No artigo acima citado, até apetece aplaudir a sua indignação, o grito de alarme, quase o apelo ao levantamento popular contra quem perverte a Justiça e ataca a cidade. Só que de imediato somos puxados pela memória até aos idos de Setembro de 2009. Mais precisamente, para a última semana da campanha eleitoral. Eis o que andava a dizer nessa altura, altura em que estava na compita pelo poder político:
«Eu compreendo que o Presidente da República, até pelas coisas graves que tem certamente para dizer face aos ataques que lhe têm sido dirigidos, não queira falar em período eleitoral. O que diria perturbaria e muito o período eleitoral. Mas temo que só depois das eleições é que se vá saber demasiadas coisas sobre esta governação e sobre o Primeiro-ministro. E temo que isso seja um fardo muito difícil de gerir, ganhe quem ganhar as eleições. Seja no caso Freeport, seja na questão da eventual espionagem aos seus opositores, seja no ataque à TVI e ao Público, seja nos múltiplos negócios que estão por esclarecer, da OPA da Sonae à crise do BCP e à interferência da CGD, seja no caso BPN e nos nunca esclarecidos movimentos do dinheiro da Segurança Social, seja na tentativa de compra da PT da Media Capital e etc,. etc. Um etc. demasiado grande.»
A lista é o cardápio dos boatos lançados sob a forma de campanha negra nascida do conluio entre elementos do Ministério Público e jornalistas, especialmente da Cofina. O material tinha origem no mecanismo de uma obscena operação de espionagem política a propósito de um sucateiro trafulha, o álibi para poder escutar um primeiro-ministro em funções através de um seu amigo. Foi o Face Oculta, então ainda em investigação e segredo de justiça, o esgoto que permitiu ao Pacheco vir espalhar suspeições, difamações e calúnias em cima de um acto eleitoral. E atente-se no cúmulo do cinismo vil e desvairado, acusa quem estava a ser espiado de andar a espiar.
Isto foi em 2009. Nos 15 anos seguintes, o Pacheco continuou febril o seu linchamento público de Sócrates e de quem mais visse como seu aliado, marimbando-se para a presunção de inocência e para a integridade do processo justo e demais actos judiciais que fizeram da Operação Marquês um escândalo de incompetência e abusos. Nem sequer em relação a Vara foi capaz de ter um gesto de humanidade, ele que foi transformado em mártir do ódio político, pois tal implicaria ter de se confrontar com a sua fétida hipocrisia.
Este fulano não tem qualquer autoridade para aparecer como valentão contra os crimes dos agentes da Justiça em roda livre, até porque recebe dinheiro de quem lucra com esses crimes. Mas irá para a cova convencido de ser superior à escumalha que vituperou em jornais, rádios e televisões. O seu tipo de justicialismo é de um conforto, e de um proveito monetário, a que os pulhas do Ministério Público não têm acesso.
Começo a ficar “acagaçado”.
Leio isto hoje no Le Monde, online,
“En direct, élections législatives : Eric Ciotti annonce qu’il souhaite faire alliance avec le Rassemblement national, Marine Le Pen salue un « choix courageux »
e começo a agarrar-me a este parágrafo de um artigo, na plataforma online Substract, “Who’s the real elite in America”, publicado hoje por uma pessoa que admiro muito, Robert Reich,
«To be a “progressive” at a prestigious university these days — indeed, to be a progressive anywhere in America — is no longer to be on the political left as the left used to be defined. It’s to be on the side of the Constitution, the rule of law, and a modicum of decency.»
Óbvio, em qualquer parte do mundo.
Já tinha reparado que o falhado político maior do Portugal democrático tinha assinado o documento 50+50 acerca da conduta do MP, numa tentativa de branquear o seu passado de acusador pidesco.
Tratou Sócrates como “figo toca”, aquele que onde existe “toca”, contamina, (polariza) todos à volta. Na realidade fê-lo no mau sentido pois que o figo-toca, ao contrário da insinuação do PP, faz que o figo à volta seja muito mais sadio e melhor. Segundo PP todos que contactavam ou contactaram com Sócrates ficavam contaminados e traziam consigo uma “mancha” má, de culpa, inapagável para o resto da vida. Agora, segundo se vê, tudo indica que é PP quem quer apagar-sacudir alguma mancha má, pesada, que sente trazer consigo, que lhe constrange a memória, lhe pesa e dá volta ao pensamento consciente.
PP é mais um “menino de sua mãe” como Miguel Sousa Tavares, Marcelo Nuno e tantos outros que ainda tentam marcar a opinião pública com uma autoridade vinda desde o berço de nascimento familiar: muitos deles saem da Faculdade e aninham-se como carreiristas nos serviços publicos como o MP, tribunais e serviços militares sem nunca conhecerem o valor de ganhar a vida por si mesmos, sem qualquer experiência individual do que é a árdua luta pela existência no interior da vida da sociedade real dos humanos. Mas PP que falhou rotundamente na política mesmo andando a bajular indecentemente gente como Cavaco, Manuela e Durão e defendendo toda a corrupção institucional da escola cavaquista e acabando, como historiador, sendo um sucateiro de papeis de campanhas políticas.
Ironia do destino, o sucateiro que se fez industrial a comprar sucata com um triciclo de porta em porta e apanhou 18 anos 18 por ter consigo uma lista de contactos que foi considerada como uma lista “mafiosa” pelos Snrs. Drs. magistrados a qual foi, também, apoiada por PP como tal e todos os pequenos pp do país, deve sentir-se, hoje em dia, felizmente justiçado com a inversão de papéis que, entretanto, a Lei não escrita, transcendental, imprimiu ao curso dos acontecimentos que transformou, metaforseou o PP em sucateiro de papéis, armazenador de cartazes, papelão e papelada restos de campanhas eleitorais e outros acontecimentos políticos.
Agora, PP, por efeito de má-consciência quer regressar ao seio dos que desde logo, viram e sentiram quais as motivações do MP com a promoção de eventos políticos com “efeitos espectaculares” de ruído e propaganda para ocultar na sombra o verdadeiro objectivo em causa. Só, agora, que já nem sequer o MP tem o pudor de lançar o “espectáculo” miserável em plenas campanhas eleitorais nem sequer qualquer receio de mascarar o sentido e significado político das pidescas escutas sem fim assim como das invasões cinematográficas de instituições públicas e casas particulares assaltadas de madrugada à boa maneira dos bandoleiros.
Uma vez que a justiça dos homens, sob a patine do tempo, se torna falsa, salva-nos os muitos exemplos da justiça da vida, existencial, que quase sempre em tempo histórico e, às vezes, em tempo coetâneo, como o caso, repõe a verdade refazendo a verdade dos factos e colocando os farsantes em notas de roda pé.
conheço o PP faz 59 anos…
nunca me surpreendeu.
Senhor José Neves, fez-me bem ler o seu excelente comentário.
O Presidente Rui Rio tem toda a razão quando se refere à Justiça e ao Ministério Público – assim como noutras questões – e os crítica na forma como actuam.
Independentemente das pessoas que assinaram ou se colaram ao manifesto pela Reforma da Justiça encabeçado pelo Presidente Rui Rio, o que lá está escrito é correcto, e recomendo que todos os Portugueses o leiam:
– Por uma Reforma da Justiça
https://manifestodos50.pt/wp-content/uploads/2024/05/Manifesto50_Reforma_da_Justica_Signatarios_Maio2024.pdf