Uma vez que as conhecemos não podemos fingir que não conhecemos. Eu, pelo menos, não posso.
[…]
Uma vez que aquilo veio a público, não há como esconder a cabeça na areia…
*
Este argumento beneficia o infractor. E se ninguém o admitiria se dele fosse a vítima, vendo a sua privacidade exposta e deturpada criminosamente, que falência da inteligência leva tantos a serem cúmplices da publicação de escutas que não devíamos conhecer, ou que não deviam publicar-se de forma incompleta e insidiosa?
Há que o dizer cada vez mais alto e mais vezes: quem viola os direitos dos governantes, ou dos políticos, mais facilmente violará os direitos dos cidadãos comuns. Aqueles que, à esquerda e à direita, não controlam a ambição e o ódio, aceitando que os fins justificam todos os meios, são declarados inimigos da democracia.
O Miguel não admitirá ser inimigo da democracia, antes um seu paladino. Contudo, não é capaz de reconhecer que uma notícia criminosa não pode ser usada contra a sua vítima. Mais valia que enfiasse a cabeça na areia do que dar este espectáculo onde é a areia que se enfia na sua cabeça.
Val
Traga-me uma pessoa que durante toda a sua vida cumpriu integralmente a Lei (seja ela cidadão comum ou o político mais mediático)!
Por uma vez sou obrigado a concordar com MST, veio a público, não posso fazer de conta que não aconteceu…
Eu não estive em Hiroshima em 1945, a bomba atómica caiu, o mundo nunca mais foi o mesmo e eu não posso fazer de conta que nunca aconteceu…
O segredo de justiça em plena Era da Informação, não faz qualquer sentido, como não produz qualquer resultado.
Quantas pessoas foram condenadas pela violação do segredo de justiça???
A transparência governativa não é de interesse público? Mais do que qualquer projecto PIN…
Mas eu percebo a sua intenção… E muitos “cavalgam a onda”, fingindo-se virgens ofendidas, quando no seu tempo fizeram bem pior… Mas a “caça ao voto” é feroz e selvática, mais do que qualquer safari no Botswana…
Imagine que toda esta situação do “polvo” é real, não serão os protagonistas inimigos da Democracia?
E o Val acha que a expressão máxima da Democracia que defende é o seu voto na urna de 4 em 4 anos???
Se ler na Constituição, verá que os sucessivos governos devem implementar medidas que visem o aumento da Democracia participativa…
MAJESTOSO! Os meus sinceros parabéns.
Para o Tiago Mouta, com genuína Estima: a verdadeira Democracia (assim como o verdadeiro Amor…) não consiste em atingir quaisquer “fins”, supostamente ideais e perfeitos (foi o erro crasso do Marxismo), mas antes em ser capaz de persistir, estóicamente se necessário, na observância estrita e escrupulosa dos MEIOS, já que são eles, afinal, os únicos fins que importam!
O Inferno está cheio de boas intenções, como a História recheada de grandes tragédias, como o Nazismo ou o Estado Novo, originadas numa sincera pulsão pelo Bem. Só que sem querer cumprir as regras que lhe dão total significado!…
“Vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar…” nas sábias palavras da saudosa mãe do MST, que se referiam precisamente a Hiroshima, a que o Tiago Mouta alude, são consonantes com a gravidade do hediondo massacre de seres humanos sem dó nem piedade e condená-las, naquela altura ou por todo o sempre, é dever de qualquer democrata, agora, arvorarmo-nos em paladinos da liberdade e “ingénuos” ao ponto de não pensarmos que uma certa “casta” pretende colonozar-nos e que de uma forma geral, como que se abelhas fôssemos atrás de uma qualquer feromona, todos nos colássemos ao que é publicado, fazendo disso “lei”, é que me parece errado – não julgo o Tiago Mouta nessa linha, porque não o conheço e não faço juízos de intenção – no entanto julgo que o MST “entrou” na deriva do “está na moda”tem de falar naquilo para que não o possam conotar com o outro lado. Sinceramente, em relação àquele, não era ao que estava habituado e presumo que “foi para apresentar serviço”. Afinal de contas: TODOS NÓS ERRAMOS.
Marco
Comparar Democracia e amor utilizando o reforço do “verdadeiro” é um bocado (para não dizer muito…) rebuscado.
Nada é perfeito… nem amores, nem democracias (já que quer meter os dois no mesmo saco!)… O marxismo é teoricamente uma boa ideia, como é o capitalismo, como é a democracia… Mas quando em nome de uma boa ideia se começam guerras e a matar inocentes, talvez deixe de ser uma boa ideia para se tornar noutra coisa qualquer…
Para quem ontem queria criar o Cartão do Contribuinte Honesto (CCH) e hoje fala em boas intenções, parece-me que o Marco concorda comigo que nesta sociedade tudo é pervertido de uma forma obscura e sinistra…
Parece-lhe a si que no século XXI, em plena Era da Informação (quer queiramos quer não, já vivemos nela, com todo o seu esplendor, virtudes, defeitos e vícios…), o segredo de justiça seja viável, quando é sistematicamente violado por advogados e magistrados…
Margarido Teixeira
Não me julgue nessa linha que considera ser a da caça ao voto da oposição e da mudança de clientelas…
Acerca do segredo de Justiça, já afirmei que não faz sentido continuar uma lei que é sistematicamente violada e de onde não se produzem qualquer tipo de sanções…
Acerca de MST, acho que deveria cingir-se à actividade de comentador, pode falar sozinho à vontade sem ser contraposto pelos respectivos visados… E assim não “borra a pintura”!!!
Paladinos da liberdade, ingénuos e virgens ofendidas é o que há mais neste país, se viajarmos um pouco pela direita, são “às paletes”, eu que nunca simpatizei com a direita e com os seus ideários, as opiniões que emitem (seja através de que meios forem…), remeto-as para aquele ditado: “ouve o conselho dos outros e segue o teu!”, felizmente consigo pensar por mim e ter opinião própria, não concordo sempre com os mesmo, não sou sempre da mesma cor e na maior parte das vezes nem é branco, nem preto, é uma escala de cinzas…
Há aqui alguma confusão entre o Direito e a Política. No Direito uma escuta criminosa ou a obtenção de prova por meios criminosos é, pura e simplesmente, inutilizável, inexistente. Quem deve ser condenado é quem praticou o acto ilícito na obtenção da prova, seja magistrado, jornalista ou polícia e nunca a vítima desse ilícito.
Mas pode o Direito dar alguma relevância a prova obtida criminosamente? Em Direito Penal NUNCA, mas há dúvidas se para efeitos de ilícito disciplinar as provas obtidas criminosamente não poderão ter alguma utilização. Por exemplo, se se descobre, através de escuta ilícita, que um polícia é corrupto, ele não pode ser condenado (processo penal) por corrupção, mas, e aí a dúvida, poderá ser eventualmente expulso da polícia em processo disciplinar.
Outro nível é o da política e aqui não me parece que o Val tenha razão contra o MST. Escuta criminosa pode ter relevância política, para efeitos de responsabilização política, se houver interesse público. O MST tem razão quando diz que não se pode ignorar politicamente o que veio a público, mesmo que por via criminosa.
Mas, mesmo nesse caso, e aí o Val tem razão, a discussão política do caso não pode é ser feita na base da pulhice e da manipulação. Quando jornais onde pululam e germinam os pulhas e a pulhice publicam extractos de escutas que, pretensamente, “incriminam” o Sócrates e omitem e escondem deliberadamente outros extractos donde se prova que Sócrates estava a falar verdade, está tudo dito. E está tudo dito quanto aos jornalismo de pulhice e quanto aos políticos que fazem da exploração da pulhice o seu modo de vida.
Kjung
Se ler “os Maias” de Eça de Queirós, esse grande génio Português, encontrará todas as personagens que pululam actualmente na nossa praça…
Desde o político, ao jornalista pulha, ao bufo, ao banqueiro, estão lá todos…
Significa que do século XIX a esta parte não mudámos assim tanto…
Principalmente MST não pode ter um registo enquanto comentador/opinador e as escutas se referem ao sr. Pinto da Costa e outro quando tem um programa de TV e o entrevistado é o 1º ministro.Não é serio.E nesta embrulhada toda não pode meter o Jorge de Sena ao barulho, com essa é que eu não me conformo.
Há quem tenha saudades do Escudo, mas eu tenho saudades do tempo em que as notícias eram apenas verdadeiras ou falsas.
Agora são, antes de tudo, criminosas.
Mas eu tenho a certeza de que lá voltaremos. Basta que a “situação” mude…
Kjung, mas a questão não é relativa ao conhecimento de um crime, sim à devassa da privacidade. Ora, os fragmentos das escutas que foram publicados não garantem sequer que saibamos qual o significado do que está a ser dito. Teríamos de ouvir – ouvir! – as escutas todas para fazer justiça ao material apanhado e aos protagonistas. Assim, lançando partes escolhidas para caluniar, é apenas uma campanha de destruição política e pessoal que se baseia em crimes.
Obviamente, ninguém nega o interesse em conhecer um crime. Mas lembro-te que, nas situações de fuga ao segredo de Justiça, estamos a falar de documentos que estão à guarda de magistrados, que pertencem a um processo que tem a sua regulamentação e a sua lógica, e que aguardam um desfecho. Ou o sistema de Justiça está entregue a criminosos e dependemos dos jornalistas e seus interesses para salvar a Pátria?
Val,
mas é óbvio que os magistrados e/ou polícias envolvidos cometeram, seja por acção seja por omissão, crime de violação de segredo de justiça e, tão ou mais importante, também violação inadmissível do direito fundamental à privacidade dos afectados. E, como dizes, a discussão política em torno do caso feita com base em escutas intencionalmente truncadas, manipuladas e seleccionadas é uma javardice inadmissível. Quanto a isso estamos de acordo e penso que também não é outra a posição do MST.
Tiago Mouta, não distorça o que eu afirmei! No essencial, digo que a Democracia não é um fim acabado em si, mas antes o próprio percurso, o método, ou seja, os meios que, passo a passo, nos garantem maior e melhor qualidade na vida colectiva. Ou seja, não se pode ferir a Democracia, nem que seja em nome da Democracia!
Não sei se gosta de Futebol, mas imagina alguém a propor decepar o Th. Henri (ou o Maradona!) como melhor forma (e era-o, seguramente…) de ele nunca mais poder “ferir” a verdade do jogo? Para ser ainda mais claro, curto e grosso: imagina a possibilidade de TODOS os detentores de cargos políticos terem o dever de aceitar ser vigiados e escutados 24h por dia e 365 dias por ano, como forma mais segura (infalível!) de não lhes permitir sequer sonhar com alguma espécie de “atentado ao Estado de Direito”? Mas em que realidade vive o Tiago? Acorde depressa, que tudo não passa de um pesadelo. Deixe de ver tanta televisão e aproxime-se mais do concreto das coisas. Não se perca com tantos pormenores e minúcias das folhas e dos ramos, disfrute a sombra da árvore e respire o ar puro da floresta, homem!
E sabe para que serve o segredo de Justiça? Para o defender a si, se alguma vez tiver o azar de caír nas suas malhas, e por outro lado para permitir levar a cabo todas as investigações importantes que, em Portugal, nunca podem sequer iniciar-se, quanto mais dar frutos, como os que deu a investigação ao Caso Madoff, que andou MAIS DE DEZ ANOS a ser investigado pelas autoridades federais dos Estados Unidos sem que disso alguém suspeitasse (muito menos o próprio, evidentemente…)! E sem ser assim, acha que alguma vez ele teria sido anilhado? Quem é ingénuo, aqui?
Alegremente, o povo comenta a idoneidade do PM, e há até conselheiros de Estado que lhe chamam mentiroso. É claro que os políticos vivem em escrutínio permanente, mas esta história tem de ser algo mais do que politica. Se fosse só politica, os partidos da oposição já teriam feito cair o governo. E não o fazem.
Não sei, a Inês Serra Lopes, jornalista da escola do Independente, já disse na TV que não percebe tanto chinfrim à volta desta questão, até porque é muito mais vantajoso para os suspeitos (mesmo que não sejam, passam a sê-lo) terem estes elementos divulgados na comunicação social, para assim o processo ser mais rápido e eficaz no esclarecimento dos casos, dado que os tribunais são muito morosos e pouco eficazes…
Acho que os magistrados, em vez de pactuarem com isto, deviam revoltar-se, porque me parece que estão a querer privá-los do seu ganha-pão.
Marco
Não distorci, a Democracia evolui é sujeita a empurrões, pressões e perversões e subsiste, não nos moldes em que foi criada, mas subsiste…
A verdade desportiva é das coisas mais questionáveis que pode existir… E portanto trazer futebol para esta discussão é totalmente infrutífero.
Os detentores de cargos públicos serem permanentemente vigiados… Não é isso que acontece com alguns????
E o Marco como utilizador de internet não é rastreável?
E o seu telemóvel, também não o é?
E não querem em nome da sua segurança por lhe um chip na matricula do automóvel? Isso é a liberdade do estado de direito?
Sabe se está a ser vigiado neste preciso momento?
Não,não sabe! é apenas a perversão da evolução tecnológica a funcionar…
Podemos acusar uns e outros de não querer ver a realidade, mas isso não muda factos…
O segredo de justiça não serve para coisa nenhuma enquanto for sistematicamente violado dentro dos próprios tribunais, que já de si estão extremamente politizados…
Madoff foi a cabeça que rolou no boom da crise, um bode expiatório para milhares de culpados… Em Portugal seria impossível produzir tal condenação dado o estado da própria justiça!
A sociedade foi criada e é composta por seres Humanos imperfeitos e como tal sujeita a perversões naturais.
Penso que a ingenuidade é que nos conduziu aquilo que temos hoje, um Big Brother global.
Carmen
Essa é a parte política da coisa, o tal da oposição “fazer cair”…
Sabendo que será tão eficaz politicamente como uma rajada de Kalashnikov no próprio pé, ou seja, a oposição será fortemente penalizada se fizer cair um governo em tempo de “crise aguda” pelo argumento de irresponsabilidade política para com os Portugueses, mandando abaixo um governo que foi eleito democraticamente.
Então a oposição faz a vida negra ao governo esperando sempre que ele se demita… Mas até às presidenciais estamos num impasse!
Porque é que esse teu raciocinio esta errado (falo da questão abstrata, independentemente do caso particular hoje na ribalta) ?
Porque fazer de contas que a violação não existiu NAO é, de maneira nenhuma, uma forma eficaz de remediar o dano causado, ou alias de sancionar o comportamento indevido. De certa forma, esta atitude, que tu acharias normal, é exactamente aquilo que pretende obter quem espalha o boato, pois esta pessoa sabe perfeitamente que o veneno opera apesar de tudo e que, onde existe uma mão cheia de individuos que vão fazer de contas que não aconteceu nada, existem muitos mais que vão ficar impressionados negativamente com a informação, a qual não pode ser considerada desmentida enquanto fôr apenas ignorada.
O que tu queres (e bem) é que o comportamento indigno (de quem espalhou o boato) seja inocuo. Ora a unica forma de atingir esse objectivo é dizer : houve investigação, não se provou nada, e ninguém esta capaz de sustentar o contrario, porque não existem provas suficientes para abrir um inquérito e , num Estado de Direito, todos têm direito à presunção de inocência. Ora esta postura passa necessariamente por comentar os elementos obtidos de maneira desleal : para lembrar que não constituem provas, ou para sustentar que são infirmados por provas com valor superior. Isto, obviamente, não significa que se deva descer ao pormenor, nem que se deva reconhecer-lhes um valor que a lei nega. Uma contestação pode ser feita de forma global. Mas a contestação não pode contentar-se com ignorar a informação. Deve trata-la como tal, mostrando que não vale nada e porquê. No exemplo de Socrates, foi o que ele fez, ou procurou fazer, quando declarou : nunca soube de nada, nem dei instruções, nem existem provas que eu tenha sabido de algo ou dado instruções.
Portanto não concordo contigo e acho que o Miguel Sousa Tavares (que para além disso tem carradas de defeitos, isto não esta em causa) esteve muito bem quando disse o que tu salientas no teu post. Como jornalista, ele não pode fingir que não conhece a informação.
Um passo ainda no sentido de melhorar a situação seria reflectirmos sobre o sistema das queixas em matéria penal. Ha dias deixei aqui uma pergunta, que é técnica, mas que esta no cerne da questão : até que ponto queremos regulamentar o poder de abrir inquéritos. Em França, onde exerço, impera o principio de oportunidade, que da ao Ministério publico o poder de decidir não requerer a abertura de um inquérito por razões de conveniência. Em contrapartida, as partes civis (qualquer pessoa lesada por uma infracção penal) têm o direito de provocar a abertura de uma instrução criminal, sendo sancionadas se o fazem com ligeireza. Se o problema do Socrates sucedesse em França, ele poderia dizer : o Minstério publico entendeu que não existem provas suficientes, mas se uma parte lesada quiser que haja instrução, por exemplo um jornal prejudicado, pode sempre obrigar a que ela seja iniciada, desde que o faça por sua conta e risco…
Em Portugal, tanto quanto me lembro, impera um sistema um pouco diferente, mais proximo do da legalidade do que do da oportunidade. Perguntei se aqui no Aspirina alguém me sabia explicar, mas pelos vistos acharam a questão técnica demais.
Pena, porque a questão não é técnica, e é mesmo por não termos as ideias claras a esse respeito que cometemos erros como o do teu post.
Bom, agora deixo-te espaço para concordares comigo…
Caro Val, também reparei (e comentei no Pátio) este entendimento jurídico de MST. Note que a receptação é crime. Quem, por exemplo, receber ou adquirir (sob qualquer forma) um bem ou produto furtado, pratica um crime de receptação, desde que, obviamente, tenha conhecimento da sua proveniencia ilicita. O crime visa precisamente impedir o uso indevido de um bem furtado. O mesmo se deve aplicar às escutas. Tendo sido obtidas ilegalmente (atraves da violaçao do segredo de justiça, que é crime), não deveriam ser aproveitadas (analisadas e comentadas) por jornalistas e bloggers. O que MST veio defender na prática é que roubar uma maçã do supermercado é crime, mas, já que foi roubada, paciencia, podemos comê-la. Fantástico!
Abraço.
Sei que há alguns comentadores juristas aqui no aspirina. Alguém me sabe dizer o que acontece a uma entidade que não acata uma providência cautelar?
edie
Nada, rigorosamente nada…
Aah…
A mesma sentença é aplicada a quem viola o segredo de justiça… Nada, rigorosamente nada!
joão viegas, estás a confundir vários aspectos. Vamos lá:
– Em lado algum li alguém a defender que se deve fazer de conta que a violação não existiu; nem essa é a minha opinião.
– O que defendo é a penalização da infracção e o normal desfecho dos processos a que as violações dizem respeito.
– O Miguel não pretendia que Sócrates repetisse que era inocente fosse do que fosse, ele tentou obter um comentário relativo a conteúdos divulgados na imprensa de forma criminosa e sem garantias de serem fiéis.
– A utilização daquelas informações, posto que fragmentadas e descontextualizadas do seu âmbito de investigação, é ilegal, imoral e imbecil. Não temos qualquer critério fiável para ajuizar das escutas assim despejadas na praça pública.
Em conclusão, estar a querer explorar o conteúdo de escutas que não se deveriam conhecer, ou que não estão em condições de ser avaliadas, é um acto de cumplicidade com os agentes e interesses que as divulgaram. Pedir uma declaração livre aos visados, isso já é absolutamente lícito, e eles que digam o que bem entenderem.
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Exactamente, Ricardo. E também concordo muito com o que escreveste acerca da Ferreira Leite. Entretanto, ela já começou a falar no assunto, pelo que vai ser interessante observar a reacção do PSD, ou da direita em geral.
Tiago Mouta,
estás portanto a dizer que não vivemos num estado de direito mas numa república das bananas jornalísticas e judiciais. Eu tinha essa ideia, mas podia sempre estar enganada…
Caro Valupi,
Que eu saiba, declarar que as escutas não são fieis, ou que não traduzem a realidade, é ja fazer um comentario relativo ao seu conteudo…
Vamos supor que um jornal (deixa ver… por exemplo o Sol) publica um documento que, alegadamente, contém escutas sobre conversas privadas de um responsavel politico (por exemplo, sei la… olha o primeiro ministro), cuja gravação foi obtida ilegalmente, mas em que o politico, alegadamente, teria proferido afirmações mostrando que ele estava a colaborar com forças armadas estrangeiras com vista a preparar uma agressão armada ao pais.
O primeiro ministro iria obviamente comentar o conteudo das escutas dizendo “isto é falso, isto não aconteceu, eu nunca tive esta conversa”. Ele iria achar indispensavel contestar a alegação, e mesmo pedir que haja um inquérito para apurar o que esta na origem da noticia e sancionar devidamente os responsaveis (posto que tudo fosse mentira, claro).
Pelo menos esta seria a atitude que eu esperaria num contexto como esse. Quase que aposto que tu também…
Ora bem, num caso como esse, é obvio que o primeiro ministro não iria dizer : “não posso comentar ja que o documento publicado foi obtido por meios ilicitos”.
E é ainda mais obvio que não iria culpar o jornalista que o questiona sobre o documento publicado.
Passa a mesma coisa no caso das escutas. Pode ser, é provavel até, que haja que sancionar quem permitiu a publicação das ditas. Mas as escutas foram publicadas, estão ai. Esta informação deve ser tratada. Deve ser tratada com seriedade, sem cendências. Mas não me parece que isso passe por fazer de contas que a publicação não ocorreu…
Foi apenas isso que disse, e bem (em meu entender), o MST…
E, acrescento eu, existe maneira de comentar as escutas sem colaborar com quem esta interessado, por mas razões, em explorar indevidamente o seu conteudo (ou a ausência dele). De certa forma, o que eu digo é que recusar de forma absoluta qualquer comentario, como preconizas, é uma forma de ceder terreno…
O meu comentario não é à atitude do Socrates, mas apenas ao que tu dizes sobre o Miguel Sousa Tavares, que esta mal.
Alias basta imaginar o que seria uma entrevista como tu defendes para ver que esta mal :
“MST : Senhor Primeiro Ministro, eu sei que foram publicados uns documentos sobre alegadas escutas relativas a um caso em que vossa excelência esta envolvido, mas sei que foram obtidas ilegalmente por isso, não lhe vou perguntar nada a este respeito e so as menciono para que os telespectadores saibam que repudio completamente esse tipo de publicações.
Socrates : Obrigado caro Senhor jornalista. Qual era mesmo a pergunta ?
MST : Bom o que o pais esta mesmo interessado em saber, é o tempo que esta em São Bento.
Socrates : Hoje de manhã, estava de chuva..”
joão viegas, estás a repetir as estafadas argumentações daqueles que defendem a publicação e exploração das escutas pela imprensa e ao arrepio dos tribunais, da Lei, dos direitos dos implicados. Esse exemplo da colaboração com forças armadas estrangeiras não tem qualquer relação com estas escutas, tem lá juízo. Nesse caso, apenas estaria em causa a suposta ilegalidade da captação (que até poderia ter sido um acto de defesa nacional dos nossos serviços secretos), enquanto na Face Oculta estamos a lidar com informações já na posse das autoridades policiais e judiciais.
Sócrates estará a cavar o seu próprio túmulo político se começar a comentar as escutas, isso sim. Porque isso é ceder à violência contra ele dirigida. A sua resposta tem sido a de afirmar a sua inocência, e a de realçar a autoridade da Justiça, a qual já o ilibou dentro do que é neste momento público.
Quando o Miguel perguntou a Sócrates o que achava do que supostamente fulano ou beltrano teriam dito a respeito disto ou daquilo, estamos no terreno da pura devassa da privacidade. Como é que nós podemos saber se essas escutas, mesmo que fielmente reproduzidas, foram obtidas com licitude e justiça? Que é feito dos direitos dos envolvidos? Onde está a autorização do tribunal para que os envolvidos se defendem? Como é que se pode tirar conclusões de frases escritas relativas a conversas telefónicas que aparecem aos bocadinhos escolhidos para certos efeitos?
Lembra-te que Vara, na Comissão de Ética, pegou num exemplar do jornal Sol e disse que estávamos perante uma factual mentira. O próprio Vara, tal como Penedos, pediram autorização para deixarem de estar sujeitos ao segredo de Justiça, e não a obtiveram. Ora, se este é o contexto, que sentido faz estar a pedir a Sócrates para vir chafurdar nesta lama? Se Sócrates falasse nas escutas, imediatamente elas passariam a ser legítimas, e tudo o que Sócrates dissesse seria usado contra ele fora e dentro da Justiça. É absurdo não ver estes nexos.
Dizer que as escutas publicadas não são fiéis é uma mero acto de bom senso. Por um lado, temos os visados a dizer isso mesmo, por outro não temos acesso aos materiais originais. Achas que os magistrados e advogados, em sede de Justiça, investigam, reflectem e deliberam com base no que o Sol e o Correio da Manhã publicam e consideram?… Ter esta noção da completa descredibilização destas fugas ao segredo de Justiça é o mínimo que a honestidade intelectual exige.
Valupi,
Acho que não estas a querer perceber o que eu digo. Diz me então o que achas que deveria ter sido a atitude de MST : não falar no assunto ? Então, qual era o proposito da entrevista ?
Mas Sócrates falou no assunto! Afirmou a sua inocência face à acusação construída com base nas escutas. Qual é a parte que não estás a perceber?
Declarar-se inocente é uma tomada de posição resultante da divulgação de notícias, tanto as legítimas como as ilegítimas, que remetem para uma suposta conspiração a seu mando ou com a sua aprovação. E é a essa acusação que ele dá publicamente resposta.
Entrar no comentário ao que certa pessoa disse numa conversa privada, sem que ela se tenha defendido, justificado ou autorizado a publicação dessas informações, é completamente errado, sob todos os pontos de vista e relativamente a todos os valores que prezamos nas democracias e nos Estados de direito, já para não falar na mera decência.
hemorróidal,
Esta conversa entre o Valupi e o Dr. João Viegas é muito importante. Compreendendo os pontos de vista deste, puramente teóricos e demasiado formais, não posso contudo deixar de concordar absolutamente com o Valupi, pelos motivos sábiamente explanados pelo Ricardo Sardo, que literalmente me tirou as maçãs, aliás, as palavras da boca: o que é criticável, diria mesmo abominável, num Jornalista (ainda merecerá a maiúscula?) como o experimentadíssimo Miguel de Sousa Tavares (sim, ele já não é nenhum pichote!) é o seu papel de RECEPTADOR, que lhe retira à partida toda a credibilidade para actuar dentro do Mercado legal. Aceitar as transcrições das supostas escutas como um facto consumado e com relevância política é comprar mercadoria de contrabando e merece pesada sanção, ponto final.
Se não tiverem chegado ainda todos os argumentos já aduzidos e todas as imagens mencionadas, siga-se em roda livre e com rédea solta à desfilada pelo argumentário ingénuo do Dr. João Viegas e reconheça-se humildemente que:
– Se as conversas privadas de Sócrates têm relevância política (??!), pelo menos pelo que revelam do seu carácter (??!), então, por um justo imperativo de igualdade, todas as conversas privadas de todos os detentores de cargos de soberania (Juízes e Procuradores, de Aveiro a Viana do Castelo, incluídos, como é óbvio), têm relevância política! E, mesmo sem qualquer implicação de natureza criminal, devem ser imediatamente conhecidas. Isto é, se há as conversas privadas, telefónicas ou pessoais, não interessa, de Oliveira e Costa com Dias Loureiro existem (divulguem-nas!), sobretudo aquelas onde se oiça a palavra “presidente”, ou “président” (para disfarçar…), não podemos fingir que não existem! Se há conversas privadas de Manuela Ferreira Leite com Cavaco (divulguem-nas!), não podemos fingir que não existem! Se há conversas privadas de agentes da justissa com jurnalistas (divulguem-nas!), não podemos fingir que não existem! Se há conversas privadas de Fernando Lima com José Manuel Fernandes (divulguem-nas!), pois é óbvio que ninguém mais pode fingir que elas não existiram! O interesse público e a Liberdade de Imprensa acima de tudo, não é
Especialmente porque, no que toca a estas coisas do carácter, não existem referências fixas nem zeros no termómetro, tudo tem de ser aferido em termos comparativos. E assim com que outros carácteres podemos comparar o de José Sócrates para atingirmos um veredicto final?
edie, não desanimes: não é por aqui ninguém te consolar com uma resposta que os processos abertos pelo Rui Pedro Soares e pelo Luís Figo vão deixar de seguir o seu caminho. Lento, sem dúvida (infelizmente é o que temos), mas acredito que, um dia, haverá notícias jubilosas (não esperes é vê-las nas capas do Sol ou do Correio da Manhã…).
&, plenamente de acordo: o que para Carlos Abreu Amorim são meninges, para outros podem não passar de hemorróidas, está mais que provado…
Ola a todos,
Caro Valupi : precisamente, Socrates falou no assunto, não se limitou a insurgir-se com a pergunta. A minha critica cinge-se ao que tu apontas ao MST, mas pelos vistos não me faço compreender…
Caro Marco Alberto Alves,
1. Dispenso o dr.
2. Acho que quem esta a pegar na questão ao contrario e de forma ingénua é quem dispara a ver nas questões de MST questões “sobre as escutas” inaceitaveis por principio. Não são : são questões sobre os factos, e mais concretamente sobre as alegações relativas a determinados factos, alegações que se apoiam nas escutas publicadas. Ou seja, sobre o que tem interesse jornalistico : a realidade (e que continuaria a ter interesse jornalistico ainda que deixasse de ter interesse juridico). Uma resposta a estas alegações, perfeitamente admissivel e eventualmente convincente, é : as alegações são falsas, e nada nos documentos publicados, que são parciais, ou que não são fiaveis, ou que não são significativos, as sustenta. De resto, foi investigado, ou pode sê-lo, e não se consegue provar nada, porque é falso. Responder isto, como Socrates procurou fazer, não é protestar contra a pergunta.
Noutras palavras, as questões sobre os factos so passam a ser questões sobre as escutas de forma incidente, porque é apenas sobre isso que se fundam as alegações sobre os factos.
Agora não deixa de ser verdade, precisamente porque as escutas não têm interesse em absoluto, e porque contêm informações sobre a vida privada das pessoas que nunca deveriam ter sido desvendadas uma vez que foram obtidas mediante o uso de poderes excepcionais por quem esta obrigado a sigilo, também é verdade, dizia eu, que so devem ser comentadas na medida exacta em que podem esclarecer sobre os factos relevantes. Vi a entrevista de Socrates e acho convincente quando ele diz : eu não disse nada a esse respeito (do pretenso negocio), não fui informado, não dei instruções agora quanto às conversas privadas dos outros, não posso comentar… Isto é exacto : quem pode saber qual era o contexto em que as conversas ocorreram, ou se fulano beltrano ou sicrano estava a falar a sério, ou a querer impressionar o interlocutor, ou a projectar-se num filme ? Pelos vistos ninguém, pelo menos com base na informação parcial que veio a lume. Assim sendo, estamos apenas a espreitar pelo buraco da fechadura, o que é inadmissivel.
Eu percebo esse discurso. Digo mais, acho salutar porque todos temos interesse em proteger dois valores fundamentais : o direito à privacidade, e o direito à presunção de inocência.
So que dizer isto não é dizer que a pergunta de MST é escandalosa. Antes pelo contrario, é responder a esta pergunta.
O que esta mal, não é a pergunta de MST (apos publicação das escutas). O que esta mal é a divulgação das escutas, e a sua publicação, o que o proprio MST concedeu… Esta mal, mas não deixa de ser a realidade. E informar é informar acerca da realidade.
Caro joão viegas (seja), continuo a achar cada vez mais importante e esclarecedora esta troca de impressões, o que aliás muito deve à clareza e qualidade dos seus pontos de vista. Agradeço a sua réplica, percebo melhor o seu argumento e distingo agora mais fácilmente o que o separa do vulgar tratamento jornalístico dado a esta questão na imprensa portuguesa. O seu último parágrafo sintetiza inequívocamente o essencial, no que estou afinal de acordo consigo. E as convulsões entretanto ocorridas na PT (factos reais…) acabam por lhe dar razão. Pena é que tantos maldosamente aproveitem, dos seus límpidos argumentos, apenas a espuma e nada do hidrante subjacente: para todos esses desvio, de imediato, o meu inflamado comentário anterior…