Nada

«A mim, enquanto português, não me é indiferente saber se José Sócrates é culpado ou inocente. E quando digo saber, é mesmo isso: não me basta ter uma ideia, uma percepção, uma presunção, uma preferência. Eu quero saber qual das duas coisas é verdade: se tivemos um primeiro-ministro que, como sustenta a acusação pública, foi corrupto até à medula ou se, pelo contrário, foi e continua a ser alvo de um procedimento judicial fundado justamente em presunções e não em factos. A menos que estivesse disposto a aceitar, desde já, a conclusão tirada pelo director do “Público”, David Pontes, quando escreveu que “a presunção de inocência continua a valer, mesmo que as fracas justificações de José Sócrates há muito tenham levado a maioria dos portugueses a tirar as devidas conclusões sobre a sua conduta”. Há muito e as devidas conclusões? Desde quando e com base em quê? Acaso a “maioria dos portugueses” e o próprio David Pontes se deram ao trabalho de ler com atenção e espírito isento as 4083 páginas da acusação do Ministério Público (MP), as 6728 páginas da decisão instrutória do juiz Ivo Rosa e agora as 683 páginas do acórdão da Relação sobre o recurso do MP dessa decisão? É um trabalho muito chato, eu sei, mas acham que é possível tirar “as devidas conclusões” sem o fazer? Se sim, então para que será necessário também um julgamento? Bom, eu dei-me a esse trabalho (saltando os longos e repetidos copy paste), porque, como disse, a conclusão não me é indiferente enquanto cidadão e só será séria se informada. De tudo o que li e ouvi ao longo destes 10 anos tirei algumas conclusões que me parecem pacíficas:

— Durante três anos, de 2011 a 2014, José Sócrates (J.S.) viveu, e largamente, à conta de um amigo, Carlos Santos Silva (C.S.S.), que lhe pagou todas as despesas pessoais, incluindo aquelas de outras quatro ou cinco pessoas a quem ele, por sua vez, ajudava a sustentar;

— Mas se viver por conta, especialmente um ex-PM, não será propriamente glorioso, também não é crime. E tanto J.S. como C.S.S. admitiram que o primeiro vivia dos empréstimos do segundo, que, pelas contas deles, terão somado entre meio milhão e 1,1 milhões de euros — ou 4.733.691,30 euros, segundo a acusação;

— Porém, diz o MP, isto só foi possível porque o dinheiro, que provinha de contas de C.S.S. na Suíça, não era dele, mas sim de J.S., e adquirido devido a corrupção;

— Disto — de uma e outra coisa — não existe qualquer prova directa no processo, sustentando o MP, e agora também o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), que tal não é necessário, bastando a prova por deduções, suposições ou presunções, pois que, como foi escrito a certa altura, “quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem”. Salvo melhor opinião, tal não me parece nem suficiente nem recomendável como prática de incriminação criminal: se eu for apanhado a comer caviar no Gambrinus, isso não significa que tenha acabado de assaltar um banco. Sócrates começou a ser investigado muito antes de ser preso; esteve detido preventivamente 10 meses; o inquérito demorou cinco anos e foram interrogadas dezenas de pessoas, feitas inúmeras buscas, centenas de apreensões, horas incontáveis de escutas telefónicas e inumeráveis outras diligências envolvendo uma quantidade imensa de procuradores e inspectores: é difícil convencer um tribunal sem pré-juízos de que, face à magnitude de meios da investigação envolvidos e à gravidade da acusação — Sócrates corrompido pelo Grupo Lena, por Vale do Lobo e pelo GES —, não haja para apresentar como prova do que se imputa um só testemunho, uma escuta, um e-mail, um documento, um papel, uma fotografia, uma transferência bancária, o relato de um encontro, uma conversa. Nada.»


Miguel Sousa Tavares

17 thoughts on “Nada”

  1. Ou seja no fim de tudo acusasa-se com base em suposições , é possível acusar e prender sem provas factuais , sem estar a defender Sócrates
    isto não é justiça .

  2. hum , o compadre do salgado ai em defesa do colega de corrupção do sogro ,. mas que bem , gosto desse valor da famiglia ser sagrada.

  3. e ao sousa tavares não lhe faz comichão cerebral o primo do zezito ser herdeiro da massa que o “amigo ” carlitos tinha numa off shore na suiça ?
    acho muito bem que as pessoas que têm interesses afectivos , familiares , financeiros ou quaisquer outros defendam as suas damas , mas , desculpem lá , nem toda a gente come gelados com a testa.

    “Na abertura dessa conta, de forma a salvaguardar o arguido José Sócrates sobre os fundos que ali viessem a ser recebidos, foi feito constar que, por morte do arguido Carlos Santos Silva, 80% do saldo da conta seria de José Paulo Pinto de Sousa, atuando este na qualidade de fiduciário de José Sócrates”, pode ler-se no documento a que jornal teve acesso.

    Esta prova será analisada no julgamento do processo ‘Operação Marquês’, no qual Sócrates está envolvido, e que terá lugar no Campus da Justiça, esta sexta-feira, dia 9 de abril. A esta juntam-se outras que sugerem também o envolvimento José Paulo Pinto de Sousa, nos fundos de Sócrates.

    Segundo a acusação do Ministério Público, Carlos Santos Silva, Sócrates e José Paulo “acordaram que seriam concentrados nas contas de Santos Silva outros fundos que seriam recebidos como contrapartidas por atos do arguido José Sócrates”, dinheiro esse que vinha essencialmente do Universo BES, na altura liderado por Ricardo Salgado.

    A decisão de levar ou não Sócrates a julgamento será tomada esta sexta-feira, altura em que o juiz Ivo Rosa irá conjugar os documentos apreendidos com as restantes provas já existentes, decidindo depois se valida o entendimento do procurador que imputou a Sócrates seis crimes, ou se defende o arquivamento de uma parte ou do todo do despacho de acusação.

    Recorde-se que Sócrates está acusado de corrupção passiva para a prática de atos contrários aos deveres do cargo, fraude fiscal qualificada, branqueamento de capitais, falsificação, recebimento indevido de vantagem e tráfico de influências.”

  4. Três acéfalos, que opinam na base do táxi. M&M You

    Então a You, parece os gatos atrás da cauda, rodopiam, rodopiam…

  5. está bem jp , como queiras. ms se não te importas , avança aí com uma justificação para o primo do teu herói ser herdeiro do amigo do teu herói. talvez o zezito seja assim uma espécie de santa casa da misericórdia e exija doações em troca de apertos de mão?

  6. Ó burrinha não tenho que justificar nada, num estado de direita quem acusa é que tem de provar essa mesma acusação, tudo o resto é só degradante.
    Se não perceberes pede ajuda a quem sofreu na pele, a falta deste mesmo estado de direito.

  7. Ó Sábio JP, estado de direito? O que é isso? É o estado que em 50 anos conseguiu legislar avulso, por forma a que os que, de perto dele, o conseguem vilipendiar, não sejam incomodados. Se o “estado de direito” tem tratado assim tão mal o socrates, e ele está tão seguro da sua inocência, porque é que não força a ida a julgamento com a máxima urgência? O homem seria o maior interessado em acabar de vez com a perseguição.
    Mas aqui o acéfalo dá-lhe uma pista, é que mesmo com todos os indícios (é pá, pelo menos tenham a honestidade de não os por em causa), socrates o que procura é não ir a julgamento, ou a ir que seja por um delito de trânsito cometido pelo João Perna. Por muito que ele e vocês rasguem as vestes pelo estado de direito, são os primeiros e grandes interessados em que o único julgamento seja o da praça publica, vitimizam-no e, caso consigam que não seja julgado, acabarão a gritar ao sete ventos que não foi objeto de qualquer condenação.
    Estado de Direito! É preciso ter uma lata!

  8. sim ? e o que que achas que se pode provar aqui sem ser com provas indiretas ? achas que há um documento escrito e assinado pelas partes a explicar semelhante manigância do carlitos ? não há qualquer indicio de coisa extremamente esquisita ? tanto “cândido e ingénuo” para fazer companhia ao ivo , nossa.

  9. Como dizia Mário Soares quando da prisão de Sócrates, que estas coisas, nunca se conseguem provar.

    E veja-se agora o caso da Madeira.

    Nada se prova.

    Foi sempre assim em Portugal, e será, seria o fim do mundo se o corruptor e o corrompido não se entendessem

  10. “Prontos”…

    Aa Yo também já leu as 4.083 páginas da acusação do MP, mais as 6.728 da decisão instrutória do Ivo Rosa, mais as 683 do acórdão da Relação.

    Leu, borrifou-se nos Autos, nas provas e no contraditório, e, qual presidente do Tribunal da Inquisição, julgou, e exarou sentença: – Sócrates é culpado e condenado porque sim. Uma decisão democrática, convincente e célere não vá dar-se o caso de o homem, daqui a mais 10 anos, ainda acabar por ser absolvido por um qualquer Tribunal que não se deixe impressionar por indícios.

  11. Miguel Sousa Tavares, filho de algo, Dr. , jornalista, escritor e comentador político foi o mesmo que imediatamente ao célebre debate eleitoral entre Passos Coelho e Sócrates, à primeira pergunta, sem pensar um cagasésimo de tempo arrancou com a frase rotunda e decisiva; “Passos arrasou Sócrates”.
    Já antes, ele próprio tentara arrasar Sócrates com os contentores de Alcântara porque lhe tapavam a vista sobre o Rio e com a proibição de fumar nos espaços púbicos porque o impediam de fumar o seu charuto após o cafezinho e depois de um gostoso almoço. E mais algumas diatribes anti-Sócrates em forma de artigos de opinião tal como este e outros que, passados dez anos, arrependido de sua leviandade, tudo indica, quer reparar depois de ler o processo e constar que não passa de uma montanha de papel cujo conteúdo denuncia mais os acusadores senhores Alex & Teixeira do que o acusado.
    Nesse célebre debate do “arrasou” MST não percebeu o total rol de mentiras que foram a base de respostas de Passos às perguntas de Sócrates. Agora, cuidadoso, para não ser de novo levado ao engano, foi ler o processo para formular um juízo consistente.
    E concluiu que são resmas de papel inseridos de “deduções, suposições ou presunções” escritos num rodopio aos círculos cujas provas são as próprias deduções, suposições ou presunções. Um caso tal qual aquele do Senhor Presidente duma instituição contra a corrupção que escrevia no “cm” que os políticos eram todos corruptos e quando lhe pediram provas de tal enviou para o MP, como provas, as suas próprias crónicas escritas naquele honorabilíssimo jornal.
    E andam nisto há dez anos a gastar uma fortuna de despesas e ainda nem um único bom português de gema perguntou porque andam a gastar “o meu dinheirinho, pois, eles são meus empregados, sou eu que lhes pago”.
    O caso está, agora, numa nova fase; a do absurdo. O homem tem de ser julgado e condenado para que a “justiça” não perca a face mas, sobretudo, para que a “opinião pública” se sinta de “consciência tranquila”; depois de ter sido intoxicada pelos media, estes, tal como faz o atual senhor diretor do “Público” do ex-director J.M.Fernandes chefe uma tentativa de golpe de estado através da invenção de “escutas” de S.Bento de Sócrates a Belém do Cavacoiso, dizia eu, estes diretores de media precisam limpar-se dessa má consciência pela intoxicação premeditada que impingiram ao povo. Precisam de um julgamento sob indícios como “pôs-se a jeito” ou “viver à conta” e outras provas metafísicas de calculistas que pensam e julgam os outros por si.
    Ele e o amigo de infância, filhos de famílias com posses não podem valer-se entre si ou ter um cofre em casa, coisa banal nessas famílias nos princípios do Séc. XX. Isso é motivo de chacota do pagode mas, o Menezes e o Marco António que deram um rombo de 200 milhões em Gaia e vivem que nem nabados nas suas quintas e o Relvas é banqueiro sem ninguém perguntar como passou de pobre-diabo a banqueiro apenas por meio de o trabalho de fazer uma passagem pelo governo.
    Dos pequenos e medíocres homens que só enaltecem o passado e odeiam o futuro não reza a história.

  12. ” Menezes e o Marco António que deram um rombo de 200 milhões em Gaia”

    Da boca pra fora é como Sócrates e Madeira, muito fácil, mas provar é como tudo.

    Podiamos ser professores da Camorra e Mafia dos italianos.

    Estes tinham muito a aprender connosco, portugas.

  13. Foi o próprio atual presidente da Câmara de Gaia que o disse aquando da altura da posse que havia uma dívida de 200 milhões.
    Creio que foi a revista “Sábado” que contou a história do enriquecimento repentino destes dois senhores e, mais uma vez, a Dra. Vidal fez ouvidos moucos e nem sequer abriu processo; isto é, fez menos do que no caso dos submarinos, caso de saque flagrante, onde abriu processo face ao que se sabia do lado alemão mas imediatamente fechou-o por falta de provas.
    Exactamente; por falta de provas.
    É extraordinário, nuns casos a falta de provas excita a imaginação a fabricar provas fantasmas ou metafísicas e noutros as provas de corrupção declaradas e provadas existentes por cá, não provocaram a mínima excitação do MP da douta Vidal.
    A Vidal e o Menezes ainda têm a lata de aparecer, às vezes, para lançar algum vómito sobre os adversários políticos mas o Marco A., esse, está calado que nem um rato, provavelmente, com medo que vão remexer no modo como enriqueceu repentinamente.

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