A luta política, mesmo em democracias estabilizadas e robustas, é sempre uma réplica da luta selvagem pela sobrevivência – pois se trata do acesso aos recursos e ao estatuto. Consoante a cultura cívica de cada um dos contendores, essa dimensão selvagem poderá estar mais sublimada ou ser mais visceral. No caso da direita portuguesa actual, por estar numa fase decadente onde não tem líderes carismáticos nem projecto agregador desde a traição de Barroso, reina a selvajaria visceral, do topo às bases.
Assim, será estulto esperar que campanhas e debates sirvam para esclarecer questões materiais, concretas, tangíveis, relativas à governação. Se nem em contextos académicos e científicos os especialistas, peritos e eruditos garantem pela sua autoridade a chegada a consensos que correspondam a “esclarecimentos”, por que raio se alega que é esse o dever dos políticos, ainda por cima quando estão a tentar serem os favoritos dos eleitores? Essa não é só uma expectativa moralista, é também uma parvoíce.
A temática da “bancarrota” ficará como um exemplo paradigmático do que se entende por “fazer política” de forma eficaz quando é apenas o poder pelo poder que motiva a participação em actos eleitorais. Como quase todos sabem, à excepção do PS, o discurso da direita resume-se a repetir obsessivamente o juízo de culpa pelo pedido de resgate de 2011. Não têm mais nada para atirar contra os socialistas. E há muitas e boas razões para estarem agarrados à Troika, é que não conseguiriam demonstrar a factualidade de qualquer acto governativo, ou soma deles, entre 2005 e 2011 como origem da situação que provocou a assistência financeira internacional – exclusão para este raciocínio da verdadeira causa do resgate, o chumbo do PEC. Mas não são só os políticos da direita que não conseguem estabelecer essas conexões, os jornalistas que fazem a opinião em Portugal, e que na sua enorme maioria repetem a cassete da culpa socialista pela “bancarrota”, também nunca explicam quais foram os factores estritamente governativos que causaram a emergência financeira em Março e Abril de 2011. O que todos fazem é marcar a ferro e fogo o PS com essa culpa que, logo de seguida, é explorada de forma a assustar a audiência através da alegada falta de dinheiro para pagar salários, pensões e, na última versão, alimentar o Multibanco. Nada disso aconteceu mas é como se tivesse acontecido – o que é uma forma de levar a que se inscreva como falsa memória.
O gráfico que Pedro Magalhães usou no seu artigo mostra como em Portugal as medidas de austeridade já vinham de 2009. Se perguntarmos à esquerda aliada da direita, essa austeridade começou em 2005. E, de facto, logo que Sócrates tomou posse começou a fazer uma governação que levou à descida do défice através de uma gestão disciplinada das contas públicas, juntamente com diferentes estímulos ao investimento, desenvolvimento e exportações. A situação antes da crise de 2008, e ao longo da resposta europeia a essa crise, era tão consensual no centro-esquerda e centro-direita que Marcelo Rebelo de Sousa dizia à boca cheia ser Sócrates a maior ameaça que alguma vez tinha aparecido para os interesses da direita, sendo capaz de tornar o PSD num partido irrelevante no sistema. Veio a crise e o pânico de que se estivesse à beira de uma depressão mundial. As contas públicas, de inúmeros países, entraram em convulsão. Veio a crise grega que inaugura a crise das dívidas soberanas, e na Europa a austeridade tornou-se opressiva e totalitária. É olhar para o gráfico.
Daí a interrogação. Exactamente como e quando é que o PS nos levou à bancarrota? Terá sido quando Sócrates se reuniu secretamente com Passos Coelho e lhe ofereceu o que ele pedisse desde que aceitasse não afundar o País na pressa e cobiça de ir ao pote?
não foi a austeridade que nos levou à bancarrota,mas o” pote” que passos coelho tanto desejava. havia uma solução suave chamada pec 4, consertada com a europa,mas os portugueses subscreveram o golpe palaciano do pulha que mora em massamá,ao dar-lhe a vitoria nas eleiçoes.a extrema esquerda vai ficar eternamente na historia,como colaborante para o periodo mais negro da vida dos portugueses depois de abril de 74.
fala me desse encontro secreto, Val, vá lá, conta-me tudo. :-)
A gente já sabe disso, que a austeridade provocou a bancarrota. A gente, como quem diz; porque os lideres do PS ignoraram, ou fizeram por ignorar, esse facto, interiorizando que “a culpa foi do Sócrates”, subscrevendo, tacitamente, a narrativa da direita e da “esquerda verdadeira”. Passos disse ontem que falou para as “pessoas simples” e estes entenderam-no e vão reelegê-lo. Embuste nas sondagens? Nâo posso acreditar que tanta gente e durante tanto tempo (da pre e da companha eleitoral) engane de forma tão grosseira. Recuso-me a acreditar, e já aceitei a derrota estrondosa da estratégia de Seguro e Costa, alicerçada na negação da governação PS-Sócrates. No caso de Costa, com a agravante de nunca ter assumido a presunção de inocência do ex-PM. Como já escrevi, a mensagem passou claríssima para a “gente simples” de Passos Coelho: o PS é um partido de corruptos até ao PM!
“Se perguntarmos à esquerda aliada da direita, essa austeridade começou em 2005. E, de facto, …”
O quê?!?!
Ah, afinal não foi austeridade, foi “uma gestão disciplinada das contas públicas”. Lindo! Ainda por cima, “juntamente com diferentes estímulos ao investimento, desenvolvimento e exportações.” Perfeito!
Ilustre Anónimo: puxe lá pela sua inteligência e diga para onde é que foram os €76,097 mil milhões (empréstimo efectivamente recebido) da troica (em concreto, €26,350 mil milhões do FMI a 3,5%, mais €26 mil milhões do FEEF a 2,0%, mais €23,748 mil milhões do EFSM a 2,9%).
E não nos venha dizer que foi para pagar salários e pensões, essa não vale.
Maria Abril,
tenho para mim a ideia de que no PS, o aparelho (maioritariamente ligado ao Seguro) tentou sobreviver à avalanche.
Atacado por todos os lados, esquerda/direita/PR/banca/patronato, tentou manter-se à tona optando pelo silêncio comprometido.
Deixaram arder o anterior líder até repararem que o fogo já lhes chegava aos fundilhos. O Seguro era levado ao colo pela direita satisfeita com o seu desempenho e com a alegria da esquerda que previa crescer por via de um PS em erosão.
O Costa pareceu a tábua salvadora, mas não ousou!
O que faltou? Não sei! Mas desconfio que as diversas facções se degladiam ferozmente. Se o PS ganhar ainda restará alguma esperança, mas não ganhando teremos grossa convulsão à porta, pois o PS estará morto e alguém terá de lhe ocupar o lugar…
Caro cavaleiro da parva figura,
O empréstimo recebido foi para pagar despesa pública, incluindo juros e obrigações de empréstimos anteriores, para pagar salários e pensões, despesa corrente, contratos de PPPs, subsídios, investimento público (pouco), para acumular a almofada financeira que hoje temos, …: de certeza que há algum documento (Orçamento de Estado? sinceramente não sei) que detalha isso. Uma parte foi também para a recapitalização do sistema bancário, evitando falências dos bancos, despedimentos e a perda dos depósitos (infelizmente, por outro lado, garantiu as acções aos accionistas ao não permitir a sua falência). Ainda assim faltou dinheiro, veja lá (défice orçamental).
A não ser que ache que sem o empréstimo era possível fazer face à despesa do Estado dos últimos anos (incluindo juros da dívida anterior), e que portanto os €76,097 mil milhões estão numa conta na Suiça. Provavelmente à espera que Passos Coelho deixe de ser PM e o levante em cash. Espere, esse filme é outro.
” – Seria capaz de votar no Portugal à Frente (PaF)?
– Se fosse para nosso bem, claro que sim. Se fosse para melhorar Portugal…
– E na coligação entre o PSD e o CDS?
– Nem me fale dessa gente, que essa gente pôs-nos pior do que no tempo do Salazar.”
https://www.facebook.com/RabiscosdeumMaldisposto/videos/vb.386503168166603/537858056364446/?type=2&theater
Muito interessante esta coisa da democracia do papelinho na urna de 4 em 4 anos…
Ou seja, o meu voto valerá tanto como o destes anormais…
“Ou seja, o meu voto valerá tanto como o destes anormais…”
avaliando os comentários que aqui bolças, diria que vale o mesmo com tendência para menos.
As “grandes sondagens” reveladas há pouco confirmam quase tudo o que a sondagens díárias pre-anunciavam. Agora só resta a António Costa completar o ramalhete e fazer o que Seguro sempre quis fazer: uma aliança governativa com Passos e Portas. Se quiser reduzir o PS a um pequeno partido, pois avance e que o crucifixo de Passos o abençoe.
Quanto à premissa, não, não foi, foi a banca. e quem foi de boleia, quem?
passos. portas, cavaco, e turba de afins, (mais que muitos ), que se lhe falta s. bento, e o poder se esfumam.
Não foi em 2005, foi com a entrada no Euro. A esquerda bem avisou o que era, mas há muita gente que ainda não chegou lá. Talvez lá para o meio da crise…
Qual entrada no Euro, qual carapuça!
O que nos levou e há-de continuar a levar à bancarrota é o Estado Social completamente utópico que foi construido depois da abrilada!
Ouvi ainda hoje o Sr. “Pintelho” numa entrevista já não sei em que canal, dizer sem tossir que o PEC 4 era ainda mais gravoso em termos de austeridade que o programa negociado com a Troika.
Bom, é um artista português. E há-os tantos.
O problema é que são cada vez mais audíveis, senão os únicos.
O babaco do entrevistador no fim ainda lhe deseja que não se reforme; Esteja descansado Sr. jornalista, enquanto a mama continuar a dar leite estes mamões não se reformam!