Contra o terror, mais Europa

Um aspecto da contemporaneidade que o surgimento da Alcaida e do “Estado Islâmico” tem posto a nu é o da surpreendente impotência dos aparelhos policiais e militares não só das maiores potências como ainda das maiores potências a trabalhar em conjunto. Por exemplo, Bin Laden escapou ao poder dos EUA e aliados, na sua força máxima, durante mais de 12 anos. Só foi apanhado graças à obsessão de uma agente da CIA que não descansou até o encontrar. Sem ela, é muito provável que continuasse escondido à vista de toda a gente. E agora contra os suicidas no Iraque e na Síria a situação é ainda mais bizarra. Naquelas geografias não temos a selva do Vietname nem as montanhas do Afeganistão. É terreno plano, deserto, quase sempre sem nuvens e com ocasionais tempestades de areia. O inimigo está cercado, não têm aviação, não tem satélites, não tem recursos humanos e tecnológicos comparáveis com a bilionésima parte daqueles ao dispor dos americanos, europeus e russos, fora as restantes forças em presença. As suas condições de sobrevivência são rudimentares e seria incorrecto dizer que cada um deles não sabe se estará vivo no dia seguinte, pois nem sequer para a hora seguinte têm qualquer garantia. Dada a intensidade dos ataques de que são alvo, não sabem se estarão vivos no próximo minuto. No entanto, as tropas governamentais iraquianas e sírias, apoiadas, treinadas e dirigidas por potências mundiais, têm apenas conseguido ganhos marginais e à custa da completa destruição de cidades e património económico e cultural. A mesma perplexidade para os terroristas que actuam em solo europeu e norte-americano. Tendo de recorrer aos sistemas de comunicação presentes nesses territórios, e actuando perante o olhar dos eventuais vigilantes profissionais ou ocasionais, conseguem mesmo assim, e ao longo de anos, desenvolver redes e planear ataques devastadores contra inocentes e contra a segurança das populações.

Isto significa que o discurso contra os poderes do Estado, e a figura do Estado orwelliano que vigia tudo o que fazemos para nos condicionar e oprimir, é muito mais de origem retórica e ideológica do que de real fundamento prático. Não há nenhum político, militar, polícia e magistrado europeu e norte-americano que não desejasse acabar com a ameaça terrorista caso lhe fosse dada essa possibilidade. E não há nenhum político (excepto Trump), militar, polícia e magistrado europeu e norte-americano que não se reconheça incapaz de o prometer em público. Mutatis mutandis, seria o mesmo de termos um suposto responsável a prometer acabar com os crimes de violência doméstica. Seria uma declaração irracional para falar de um fenómeno cuja origem é irracional enquanto dinâmica individual.

Ontem, na CNN, especialistas em terrorismo referiam que as polícias belgas têm falta de recursos humanos, por um lado, e que têm um quadro legal que lhes impede de fazer escutas com a facilidade com que elas se fazem noutros países, pelo outro. E referiram que os ingleses andavam a vigiar alvos em Molenbeek em vez dos belgas por causa dessas limitações, mas tiverem de interromper a operação após a publicação de informações secretas por Snowden. Esta situação leva-nos para a possibilidade de que a resposta ao terrorismo em solo europeu, o qual na sua matriz apolítica dos suicidas de justificação islâmica tem uma lógica apocalíptica, passe também por uma muito maior integração das forças policiais europeias, criando-se um corpo comum. Os desafios políticos e legais que tal projecto implica serão sempre menores do que, por exemplo, poderá acontecer caso algum dia alguma central nuclear europeia seja alvo de um ataque ao seu reactor. Um exemplo em milhentos onde se irá tentar a destruição máxima, só isso é certo.

2 thoughts on “Contra o terror, mais Europa”

  1. se imaginarmos um ego colectivo conseguimos, mais ou menos, entender a irracionalidade. e o horror do terror. que doença tão maléfica! ai! :-(

  2. esta ideia que a guerra se ganha com as grandes armas,com o número de aviões,com a sofisticação da aparelhagem da detecção e comunicações, tem todo o sentido para as grandes empresas ,que os fabricam e vendem, com lucros fabulosos. Para quem já combateu no terreno,não passa de conversa para enganar tolos ou xéxés… As guerras só se ganham com tropas no terreno,tropas que estejam dispostasc a ver o branco dos olhos do inimigo, a agarrá-los à mão! Os exemplos estão aí e são incontáveis: Coreia, Vietname,Argélia,Guiné Angola Moçambique, Afganistão,Iraque, Balcãs,Síria,etc.,etc.,etc.. As grandes potências podem meter as grandes armas onde a luz não chega,se gozam com isso. O que vence as guerras é a determinação,a audácia,o sacrifício, não é a vontade de carregar no botão vermelho,que dispara os misseis. Os misseis vão e rebentam,mas a tropa dos túneis,dos pântanos,das penedias e serras não morre toda ! Escapa 1% e não demoram a saltar ao pescoço do agressor!!! Arre mundo,estuda-se História para quê???

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