The Ides of March_George Clooney
Este é um filme falhado, superficial, tanso que merece ser visto e estimado. E precisamente pelas mesmas razões. Começa por ser uma obra do Clooney, um dos maiores porreiraços de Hollywood. Queremos que ele continue a realizar, focando-se nas temáticas políticas, sociais e dos direitos humanos como tem feito também como cidadão do Mundo, por isso o mínimo que podemos fazer é continuar a pagar pelos seus serviços artísticos. Depois reúne os actores mais porreiraços do momento, como o próprio George, Ray Gosling (que teve em 2011 um ano glorioso), Philip Seymour Hoffman, Paul Giamatti e Marisa Tomei, seres humanos com quem gostaríamos muito de passar a noite de réveillon ou, em alternativa, uma qualquer outra noite do ano findo ou vindouro desde que o fluxo de bebidas e petiscos não fosse inferior. Por fim, porque nos conta uma historieta porreiraça, com os mínimos de interesse e banalidade para satisfazer tanto os ingénuos como os cínicos.
Só para idealistas e românticos – portanto, só para os cinéfilos, irremediáveis platónicos – é que este filme se revela uma chachada. Prometendo tratar do esvaziamento ético que será inerente à carreira política, o espectador é levado para uma sequência de peripécias que vão ficando cada vez mais gratuitas e inverosímeis apesar, ou por causa, da sua convencionalidade. Claro, estamos no cinema, um reino de fantasia, celebrando-se o decisivo contributo dos elementos gratuitos e inverosímeis desde 1902, ano em que Méliès disparou um foguetão para a Lua. Mas quando deixamos de acreditar nas personagens, constatando que também elas não sabem em que filme estão metidas, e descobrindo penosamente a sua infantilidade, esse é um salto para o fantástico que não tem nada de maravilhoso.
O tema da corrupção na política – ou seja, a problemática da presença do mal na sociedade – é coevo da invenção da fala e uma das chaves hermenêuticas para o estudo das mitologias e tradições poéticas orais. Quem estudar História, seja qual for a época escolhida para o efeito, vai descobrir um lençol de perfídias e de queixas que emanam da luta pela sobrevivência e da procura de recursos e segurança. Algumas são em tudo equivalentes às nossas na actualidade – apesar das variações geográficas e culturais, quando não civilizacionais – da passagem dos séculos – quando não dos milénios – e do primitivismo do modo de vida – quando não da brutalidade e violência como norma. Botar discurso a respeito deste plano da experiência humana, assim, pede um inevitável trabalho de recapitulação da memória histórica, de montanhismo intelectual, para se poder dar a ver uma qualquer nova paisagem, ou que não seja nova mas que esteja límpida e larga. Não sendo o caso, mais valia que Clooney tivesse escolhido fazer o remake de Mr. Smith Goes to Washington. Tinha os actores ideais para a empreitada e uma história onde a corrupção da política é contada com muito maior ferocidade. Para além disso, o filme de 1939 dá-nos algo que podemos fazer nosso, que não mais nos abandonará. É só para isso que serve o cinema, George.
o ideal é ser-se platonicamente mundano e, cinéfilo ou não, nada porreiraço como sinónimo de fraco. e, olha, confesso: não queria passar uma noite qualquer com um desses qualquer.:-)
Cuidado! Nem todos os políticos são corruptos, a maioria nem o será, e, depois, não é só no seio da classe política que existe corrupção. Tal exagero pode tornar-se bem perigoso. Está-se a bater demasiado no céguinho, e isso serve a quem?