O Fernando Venâncio honrou-nos com a sua presença durante dois anos, de 2006 a 2008. E em boa parte a sobrevivência deste blogue a ele se deve, pois ficou por cá aquando da grande debandada da maior parte dos fundadores e autores ocorrida em meados de 2006, ainda não se tinha sequer completado um ano de existência. Também por ele vieram aqui escrever Daniel de Sá, Jorge Carvalheira, José do Carmo Francisco e Soledade Martinho Costa, cada um marcando fases e aspectos desta coisa bizarra e periclitante chamada blogue colectivo.
As diferentes metamorfoses ocorridas sob a égide Aspirina B ao longo de 10 anos dão a ver, para quem delas tiver memória, conteúdos e estilos estupendamente diversos. Seres de raças diferentes calhando serem postos lado a lado. O resultado de este ser um barco à deriva, feliz da vida por não ter um mapa a impedir as surpresas da cósmica sorte. O destino distante ou próximo, todavia, será ir ao fundo, como convém num conto de aventuras.
Pois o nosso Fernando reapareceu na ribalta mediática graças a uma investigação que ficará para a História: O português como língua de Camões é um mito
Abençoada iconoclastia do desassombro.
Mi corazon.
Sempre me pareceu que quando se diz «a língua de Camões» o que se pretende é simplesmente homenagear a língua através do génio do poeta e vice-versa, como se poderia dizer igualmente «a língua de Pessoa» (e ele próprio a tomava como referência essencial: «a minha pátria etc.» ). Não é o mesmo que se pretende dizer quando se fala do italiano como «a língua de Dante», isto é, neste caso o que aconteceu foi é uma fixação do italiano florentino como matriz do italiano oficial e posteriormente, com o decorrer do tempo, da norma do italiano moderno. Dante fixou alguma coisa em matéria linguística, mas não inventou nada. E Camões tampouco. Parece-me que desmentir que tenha inovado muito em matéria de vocabulário é um bocado como dar cacetadas em espantalhos, passe a fórmula inglesa adaptada (pois, língua de Shakespeare etc.)…
Quanto à migração de vocábulos castelhanos para o português, em épocas em que numerosos portugueses cultos eram bilingues e escreviam castelhano, se dever a um único autor ou uma única obra, fico com algumas dúvidas.
Valupi, já tinha apanhado o link no P. online e, sim senhor, a investigação do Fernando Venâncio parece ser mesmo robusta, estará debaixo de olho e presumo ainda que ela decorre da seminal interpretação que o Alfredo Margarido apresentou aos indígenas deste rectângulo sobre a Lusofonia. A saber, que a persistência do discurso oficial português tornava a língua de Camões «quase glotofágica» perante as/os outras/os.
Nota, desculpa mas tem de ser. E lá se vai o que resta da desacreditada sebenta do Gilberto Freyre e do sempiterno… Adriano Moreira.
Gungunhana, o Camões era de uma classe ociosa?
Joe Strummer: «Gungunhana, o Camões era de uma classe ociosa»
Depende de como classificares a pequena nobreza sem cheta que preferia guerras, aventuras, saques, piratarias, massacres e promoções cortesãs ao trabalho braçal desarmado como meio de subsistência diária.
Aliás, era para o trabalho duro que havia escravos e campônios cultivadores de terras, e a sua grande poesia não deixou grande rasto histórico, talvez por falta de educação ou de tempos livres…
«Campónios». O «ô» é no Brasil.
:-) é tão interessante ver como uma investigação histórica ao léxico mexe tanto no ego dos tugas. pois no meu mexe nadinha: estou muito feliz por saber mais e melhor continuando a ver, em Camões, um sábio mensageiro da língua portuguesa. mais: estou absolutamente satisfeita por o FV ter-me trazido a boa nova de que de espanha chegam bons ventos, bons casamentos, bons acentos e bons inspirados – da e na língua – momentos. viva! :-)
E Cervantes? e Watt? O inventor da máquina a vapor? Eram de classes ociosas?
http://www.explicatorium.com/biografias/james-watt.html
So para dizer que o binomio ocio/trabalho serve so para mascarar outro mais real educação /ignorância , E simplificando, foi o acesso de cada vez mais pessoas a informação outrora retida que permitiu o avanço. Gutenberg. A classe ociosa de ontem tem o mesmo perfil da classe ociosa de hoje, money vampires.
A teoría de F.V. , com todo o meu respeito e aminha pouca sabedoria do tema, é racional, lógica e bem fundamentada. Isso não faz mais pequeno nem o mito de Camões nem da lingua portuguesa. Porque Camões escreveu em português, no português culto da época, na lingua desenvolvida e estável do reino. No entanto as línguas são fruto da história, da política e tantos factores sociais que sería longo dizer. Só pensemos na influëncia do inglês nas nossas linguas nos nossos días.
No português de hoje há muitos castelhanismos,que por vezes assombram a um galego, e que como bem di F.V. são chegados o português na época da dinastía filipina. Época na qual os escritores portugueses puxavam por escrever em castelhano ou misturar muitos termos en castelhano que lhes proporcionava certa imagen de modernidade com o poder e assim ficaram. Camões é homem do seu tempo como é Pessoa que moderniza e vigoriça a lingua e não tem olhada para a literatura espanhola. Eram outros tempos.
Se engadimos que Camões era de origem galega, que seu pai lutou como muitos galegos cos reis de Portugal nas guerras comtra reis castelhanos, e que fuxiu para Portugal e que se supõe que ser o pae, duma aldeia perto de Vigo chamada Camoes e que o apelido Camoeiras é comum na Galiza,pode ser que alguém sofra no seu mundo mitológico, mas sería para estudar. Embora tudo isso faria mais grande a Camões como grande português de sempre.
E bom revisar os mitos e os feitos históricos narrados de formas muito diferentemente interesadas o longo dos séculos. Se fosse certo que Felipe II da Espanha, na dinastía filipina, no seu afã de procurar uma capital para o reino gostava e defendía que devía ser Lisboa a capital pela sua situação marítima atlántica estratégica para o comercio, a guerra e o controlo da América coloniçada, a sua centralidade e o sentido de união dos dois reinos . Assim podíamos pensar doutra maneira do mito negativo de Felipe II respeito a Portugal. Além de ser Felipe II filho duma grande portuguesa, falava português e sempre esteve muito unido a mãe e sem dúvida a sua costela portuguesa tinha influéncia nessa decisão. Finalmente decidiu-se por Madrid, como bem sabemos.
A teoría de F.V. ajuda a conhecer e se calhar a viver sem mitos na historia para compreender na melhor realidade os proprios mitos.
Abençoada iconoclastia do desassombro.
http://arompidadodia.blogspot.com.es/2016/04/castelhano-lingua-de-camoes.html
Joe Strummer: «O inventor da máquina a vapor?»
http://www.explicatorium.com/biografias/james-watt.html
Mais biografia:
https://en.wikipedia.org/wiki/James_Watt#Biography
“James Watt was born on 19 January 1736 in Greenock, Renfrewshire, a seaport on the Firth of Clyde. His father was a shipwright, ship owner and contractor, and served as the town’s chief baillie, while his mother, Agnes Muirhead, came from a distinguished family and was well educated. Both were Presbyterians and strong Covenanters. Watt’s grandfather, Thomas Watt, was a mathematics teacher and baillie to the Baron of Cartsburn. Despite being raised by religious parents, he later on became a deist. Watt did not attend school regularly; initially he was mostly schooled at home by his mother but later he attended Greenock Grammar School. He exhibited great manual dexterity, engineering skills and an aptitude for mathematics, while Latin and Greek failed to interest him.”
Strummer, deixa lá as «classes ociosas» em paz e tenta perceber a relevância da expressão para a discussão que decorria a propósito de outro post e da tua aparente ideia (errada) de que eu estava a defender o trabalho penal como um meio de regeneração.
Se é a expressão «ócio» que usei em contraponto ao trabalho forçado imposto ao escravo ou ao servo da gleba inseparável da terra que trabalhava, no contexto da abolição dessas situações tidas como males necessários (por vezes nem sequer males), e finalmente passadas à história pelo progresso tecnológico, que te faz confusão, substitui-a por outra qualquer que exprimia a ideia oposta ao imperativo de trabalho braçal não voluntário.
Ponto final no ócio. Vai trabalhar, pá…
;^)
Gungunhana,
Gungunhana,
O teu link está de acordo com o que eu disse atrás, não muda nada. A educação como motor do desenvolvimento, alem do mérito individual, claro.
Watt did not attend school regularly; initially he was mostly schooled at home by his mother but later he attended Greenock Grammar School.[9] He exhibited great manual dexterity, engineering skills and an aptitude for mathematics, while Latin and Greek failed to interest him.
When he was eighteen, his mother died and his father’s health began to fail. Watt travelled to London to study instrument-making for a year, then returned to Scotland, settling in the major commercial city of Glasgow intent on setting up his own instrument-making business. He made and repaired brass reflecting quadrants, parallel rulers, scales, parts for telescopes, and barometers, among other things. Because he had not served at least seven years as an apprentice, the Glasgow Guild of Hammermen (which had jurisdiction over any artisans using hammers) blocked his application,[10] despite there being no other mathematical instrument makers in Scotland.[11]
Não tivemos nenhuma discussão acerca da regeneração pelo trabalho penal, sim acerca da pena de morte e a tua bizarra opção da escolha da pena pelo condenado.
Fui o que fiz no comentário anterior.
Não hoje. Vou chatear uns direitolas :)
Não sei o que defende o F. Venâncio exactamente (não li o artigo ou o livro dele), mas o que diz o artigo tem pouco a ver com o titulo deste post. A articulista parece acreditar que o valor de uma obra literaria reside nas “invenções” ou “inovações” linguisticas que ela contém, o que é uma refinada cretinice. Partindo desse pressuposto absurdo, vai à caça das “inovações” linguisticas nos Lusiadas e descobre que elas são, na sua grande maioria, latinismos decalcados do castelhano.
Em suma, o nosso Camões comportou-se como os nossos clérigos mediocres, incorporando na lingua vernacula palavras cultas tiradas da lingua cientifica internacional da época, que era o latim, sendo que o fez inspirando-se do castelhano, como é perfeitamente natural. Dito ainda doutra forma, Camões não fez nada de diferente daquilo que fazem quotidianamente os nossos intelectuais ha séculos, ou seja falar no “latim,”, no “francês” ou no “inglês” que soa a cultura e a intelectualidade. No proprio artigo, a jornalista usa o verbo “escrutinar” exactamente da mesma forma, cedendo à moda ambiente de utilizar uma palavra inglesa, em vez de recorrer a verbos que se usam normalmente em português.
Em resumo,o titulo do post esta nas antipodas do que descreve o artigo e não ha nada mais português do que a lingua de Camões.
Infelizmente…
Boas
castelhano, a língua de camões e da portugalidade! :-)