Não estamos na Assembleia da República para, de quinze em quinze dias, batermos palmas ao senhor primeiro-ministro quando ele lá vai fazer os debates, como acontecia na anterior legislatura.
*
Algures no começo do Verão, Elisa Ferreira e Aguiar-Branco debateram na RTP-N os temas correntes. Assim que a Elisa falou, saltou-lhe um Aguiar-Branco todo espigadote, interrompendo com bocas e um ímpeto que começou por a surpreender, e depois acabou por baralhar. E tal foi o espanto da senhora que o senhor se deixou tomar pela compaixão e acabou a dizer-lhe, entre risos, que ela tinha de se habituar àquele modo e ritmo de fazer política, se ia entrar na campanha das Autárquicas. O que o actual líder da bancada do PSD enunciava no subtexto, imaginando-se no café, era que eles estavam ali para dar espectáculo, não para pensar ou fazer pensar – ou seja, que não valia a pena discutir através do logos, que os votos apanhavam-se com pathos.
Esta é a escola do PSD dos últimos anos, e é uma perversão. O resultado está à vista em toda a sua infausta glória neste consulado de Ferreira Leite e dos seus ideólogos, Pacheco Pereira, Paulo Rangel e uma série de figuras menores. Acontece que o eleitorado não foi nessa conversa, não se deixou enganar pela campanha negra e derivados emocionais tóxicos. Que grande choque os ranhosos devem ter tido às 20 horas de 27 de Setembro, depois do insano esforço a promover a irracionalidade das massas, que até chegou a conspurcar a Presidência.
Esta imagem caricatural, dos deputados que batiam palmas ao Primeiro-Ministro na anterior legislatura e agora já se podem comportar como arruaceiros, merece atenção. Na aparência, é apenas uma boca chocarreira, banal. Contudo, vinda de quem vem, a merda transmuta-se em ouro. Aguiar-Branco está a querer justificar uma posição extremada, o boicote do Parlamento ao Governo minoritário, por isso foi buscar o seu simétrico. É um típico raciocínio bipolar, redução da complexidade ao seu grotesco, muito frequente quando se mente. Mas o prejuízo maior nem sequer tem qualquer relação com o actual braço-de-ferro. É na deturpação do papel e estatuto dos deputados que o chiste espalha a sua maldade.
Repare-se: a Comissão de Inquérito Parlamentar ao BPN foi festejada pela oposição como um triunfo espantoso que resgatava a honra perdida da Assembleia da República, subitamente capaz de verdadeiramente inquirir e adquirir conhecimento relevante para a sociedade. Aguiar-Branco já se esqueceu, tal como não se quer lembrar de todas as outras comissões e demais actividades onde os deputados gastam o tempo. Mesmo com maioria de um só partido, o trabalho parlamentar é constante e intenso, há sempre procura de consensos e negociações variadas em curso. De resto, ninguém lhe ouviu um vagido contra as maiorias quando eram do PSD, rica honestidade intelectual a destes fiéis da Política de Verdade.
Cada deputado, independentemente da filiação partidária, é um representante do País. Os poderes de que goza estão ao serviço da sua missão de fiscalização soberana. Dizer deles que se limitam a bater palmas, ainda por cima justificando essa aberração pela existência de uma maioria legítima, é bem o retrato da qualidade dos recursos humanos actualmente à frente do PSD.
Creio ser extremamente injusto o nome de Paulo Rangel neste post. Apesar de tudo ganhou umas eleições com uma postura e discurso muito diferentes do restante partido. Como presidente do grupo parlamentar foi o único deputado, desde 2005, a dar verdadeira luta a JS. Um nome a reter para o futuro.
Quando digo o único deputado refiro-me aos do PSD, obviamente ;)
O carapau Paulo Rangel, varapau? Convém esquecer para o futuro, porque é mais, e pior, do mesmo. Retórica e conversa fiada, nada de ideias. Não se espere que dali saia nada de novo ou de interessante.
Respeitosamente,
NiN
curioso, pois às tantas …, mas não se iludam que não alcançam maioria absoluta, mas é verdade que podem reforçar a votação,
varapau, Rangel não ganhou eleição alguma, o PS é que a perdeu. E ele é um dos mais venenosos demagogos que temos no activo.
&
e no caso , muito provável ( poucos cairão na estupidez do voto útil novamente ), de a nova votação ter resultados similares ? repetem-se as eleições até haver um resultado à maneira dos que gostam de malhar mas não de negociar ?
O que nos faz falta, para avaliar a situação política e o futuro do governo e oposição, são sondagens mais frequentes, para avaliar o impacto que estas estratégias estão a ter na opinião pública. Nos EUA, as sondagens saem a um ritmo quase diário. Se por um lado há um efeito preverso de “horse-race”, por outro lado os partidos, comentadores e público em geral conseguem avaliar quase imediatamente os efeitos reais que as decisões e guerras políticas estão a ter junto dos eleitores, e ajustar as estratégias de acordo.
Por cá, sinto que estamos reféns de líderes e actores políticos que podem dizer o que mais lhes convém (o povo acha que… O pais está farto de… Os Portugueses já se aperceberam que…) sem que haja dados que permitam avaliar a sua veracidade e fazer as perguntas difíceis.
A vida política seria bem diferente um jornalista pudesse (apenas um exemplo) fazer a seguinte pergunta:
“Dra. Manuela, 58% dos eleitores acham que os cortes na receita que o seu partido aprovou na semana passada vão trazer mais dificuldades ao país. O que é que lhes responde?”
A matemática é inimiga mortal dos demagogos.
Depois de ler o teu texto,lembrei-me da frase ” nas vascas da agonia “.Nunca entendi bem o que isso queria dizer, e não há dicionário com uma definição coerente.O que sei é que como tudo isto está a ir, dentro de pouco tempo não há PSD que se aproveite ,e mais uma vez me veio à memória outra frase, esta do saudoso Solnado: ” e não há como exterminá-los?
paulo rangel é um senhor de uma estatura moral exemplar.
basta lembrar que o grupo parlamentar do psd exigiu que o pm não fosse à assembleia para o debate quinzenal durante o periodo eleitoral para não interferir nas campanhas e paulo rangel faz campanha acusando o pm de não querer ir à assembleia por ter medo dele.
são deste exemplos que o país precisa, mostrem estes homens aos vossos filhos para eles saberem distinguir o bom do mau.
António Manso,
E NÃO SE PODE EXTERMINÁ-LO? Raul Solnado?
Uma peça de Teatro baseada em textos de Karl Valentin e representada pela Cornucópia
em 1973 com encenação de Jorge Silva Melo. Eu estive lá.
As vossas opiniões sobre Paulo Rangel merecem todo o meu respeito mesmo que não concorde com elas.
Valupi, se foi uma derrota do PS e não uma vitória do PSD isso deve-se a quê concretamente? Ao candidato Vital M. escolhido pela liderança do PS e aqui (e não só) muito apoiado? Aquela vitória, por mais pequena que seja comparada com as Legistativas ou Autáquicas, foi da exclusiva responsabilidade de Paulo Rangel. Se ele é demagogo? Concerteza que será tal como TODOS os políticos o são de vez em quando.
A questão é que me revejo na sua forma de estar e discursar. Uma togazita e via-o no senado romano a ser elogiado pelas suas qualidades de tribuno ;) ;)
E tem uma qualidade que não vislumbro neste actual PS: sensibilidade política (ou se quisermos, diplomacia política). Tal como a vejo a política é a gestão de silêncios, alguma hipocrisia e acima de tudo um “parecer ser que não o é”.
Repare-se no momento actual da política portuguesa. Sócrates (Governo) não quer governar sem maioria absoluta. Que faz então? Usa, e bem na minha opinião, a tão propalada “estratégia de vitimização”. Erro? Fácil, a forma como o faz, demonstrando a sensibilidade de uma pedra. Ao cair no exagero, porque nos últimos tempos não faz uma declaração pública sem que faça o papel de calimero, e usando uma excessiva agressividade Sócrates descredibiliza a estratégia tornando-a demasiado óbvia. Lembram-se do português suave vs animal feroz? Porque é que não funcionou? Precisamente porque Portugal inteiro a topou imediatamente. Simple as that!
So, what’s my point you may ask?
Rangel pode ser o maior “cabrão” do mundo mas não parece.
Sócrates pode não ser o maior “cabrão” do mundo mas, ao olhos dos portugueses, parece.
Os assessores do Primeiro Ministro de Portugal deviam ser mais “mulas”, mais sensíveis ao feedback dado pelos outros partidos e grande parte da população. Se o fizessem levavam toda a gente onde queriam. Falta de habilidade diplomática creio.
O que me preocupa verdadeiramente é o clima demasiado hostil que existe na política e sociedade portuguesa. Isso sim mina o avanço do país. Aí são todos culpados, os partidos, os líderes, nós.
“Sócrates pode não ser o maior “cabrão” do mundo mas, ao olhos dos portugueses, parece.”
A que portugueses se refere? Aos que escrevem na comunicação social e blogs, aos que opinam da TV? aos justiceiros? aos professores? Uma minoria, caro Varapau. Os portugueses são como os chapéus: há muitos. 10 milhões.
“O que me preocupa verdadeiramente é o clima demasiado hostil que existe na política e sociedade portuguesa”.
Na política sim. Na sociedade portuguesa, duvido. Ando por aí todos os dias, olho à minha volta e não vejo a hostilidade que refere. Há muita, muita gente boa, que só quer viver em paz e sossego e faz por isso.
Parte da particular para o geral precipitadamente … é a minha opinião.
“Sócrates pode não ser o maior “cabrão” do mundo mas, ao olhos dos portugueses, parece.”
Nanda, por favor não separe esta frase do resto. E é claro que existe um exagero da minha parte.
«Na política sim. Na sociedade portuguesa, duvido. Ando por aí todos os dias, olho à minha volta e não vejo a hostilidade que refere. Há muita, muita gente boa, que só quer viver em paz e sossego e faz por isso.»
Pela parte que me toca, e tenho amigos de todos os quadrantes políticos, sempre que se fala de Sócrates e de alguns ministros do anterior e actual governo a crispação é evidente. Ou são fieis seguidores ou nem sequer o(s) podem ver à frente. A blogosfera (onde podemos encontar algumas elites) é também um excelente exemplo da agressividade de que falo. Temos blogs pró-Sócrates (adoração) e outros anti-Sócrates (ódio visceral). Não há meio-termo.
varapau, pois é, uns são pró-Sócrates e outros anti-Sócrates. Se calhar devia haver alguns pró-outra coisa qualquer, pró-Ferreira Leite, por exemplo. Mas não, limitam-se a ser anti-Sócrates. Até porque ser pró implica defender ideias e para isso era preciso que elas existissem neste PSD da Ferreira Leite, Aguiar-Branco, Rangel. Essa deve ter sido uma das razões pela qual Sócrates, apesar da crise e das vergonhosas campanhas que sobre ele foram lançadas, teve, e continua a ter, o apoio da maioria dos portugueses.