Quando olhamos para a direita partidária portuguesa, das personagens principais aos figurantes, dos passarões à arraia-miúda, dos que representam eleitores e dos que comentam eleitos, o panorama é tenebroso. Vai desde a figura mais sinistra e perniciosa do regime, Cavaco Silva, até essa sumidade do nacional-chungismo, Carlos Abreu Amorim, passando pelos paradigmáticos João Jardim, Dias Loureiro, Valentim Loureiro, Isaltino Morais, Duarte Lima, Santana Lopes, Filipe Menezes, Marques Mendes, Ângelo Correia, Marcelo Rebelo de Sousa, Ferreira Leite, Pacheco Pereira et alia, e ainda agrega um circo de horrores composto pela Moura Guedes, Crespo, arquitecto Saraiva, Medina Carreira, João Duque, Zé Manel Fernandes, Eduardo Cintra Torres, Helena Matos, João Miguel Tavares, Carlos Barbosa, este, aquele e a outra. Têm até um órgão oficial, o Correio da Manhã, esse esgoto a céu aberto, para além de variados satélites com que dominam a comunicação social. Apesar de não se poderem ver uns aos outros na maior parte dos casos, porque vivem na selva e é cada um por si, estão unidos no ódio a um tal de Sócrates que os humilha pelo simples facto de existir. É uma gente ressentida, ressabiada e velhaca, enquanto agentes políticos e/ou figuras mediáticas, que não se importou nada de atiçar o populismo dos ignaros e dos assustados para com ele derrubarem um Governo e o País.
Pairando acima deste charco putrefacto está o Pedro Marques Lopes, fonte de salubridade e inteligência para o molestado e depauperado eleitor de direita. O Pedro é admirável na sua intransigência perante as pulhices que os seus correlegionários despejam incessantemente no debate político e no espaço público. O Pedro, pois, é um defensor do próprio ideal de democracia enquanto sistema pensado para acolher a diversidade de opinião na procura de um bem comum, enquanto modo de realizar a liberdade em conjunto, não como palco de ataques ao carácter e arena de conspirações onde a política fica reduzida à violência. E que acontece? Acontece que as suas ideias – resumindo à bruta: que passam por defender uma sociedade onde o Estado tenha menos peso do que aquele que o PS concebe como apropriado, por exemplo – nada percam do seu valor, antes ganhem acrescido interesse por ser ele quem as assume. Ele, alguém que faz da decência a condição sine qua non para a intervenção pública. Se o PSD estivesse entregue a políticos desta fibra, fosse no poder ou na liderança da oposição, Portugal não estaria nesta desgraçada situação.
Recentemente, nos últimos meses, o Pedro deixou de ser na direita uma voz isolada. Luís Menezes Leitão juntou-se, muito antes desta vaga pós-TSU liderada pela Manela, àqueles raros que venceram o tribalismo e manifestam a sua indignação face à traição em curso pela mão de Passos Coelho, Portas, Relvas e Gaspar. Embora com muito menos protagonismo na comunicação social, as suas denúncias são igualmente peremptórias, frontais, ladinas. Veja-se: Uma crise do regime. E para que não se pense que estamos perante uma melancia, sofra-se a estupidez desta reacção a reboque dos borregos que ficaram felicíssimos com uma manhã de engarrafamentos no centro de Lisboa: O Costa do Marquês. Ou recorde-se o seu anti-socratismo tonto: A filosofia de Sócrates. E mesmo o seu contributo para as campanhas negras, in illo tempore:
Elucidativo sobre 2009 é o facto de todos os jornalistas de que Sócrates se queixou perderam o seu lugar.
Depois de Manuela Moura Guedes, tive a certeza de que Marcelo em breve ia ficar sem programa. Encurta-se, esconde-se e por fim extingue-se.
Semanas atrás, escreveu um texto que me dá a oportunidade de falar de um dos maiores problemas com que lidamos enquanto comunidade: a cultura da calúnia. Foi este: A mentira na política. E nele se pode ler o seguinte naco de prosa caluniosa:
Sócrates foi apanhado a mentir no Parlamento sobre o caso TVI e foi imediatamente desculpabilizado pelos seus deputados que diziam que se tivesse ocorrido não era grave. O inquérito parlamentar que então foi aberto, e que podia ditar a demissão de Sócrates, evitando o que ocorreu posteriormente, foi convenientemente encerrado com o acordo do PSD. E ficou provado que mentir compensa em Portugal.
Ora pois muito bem, vamos lá. O seu texto destina-se a atacar as mentiras de Passos e do Governo. Contudo, Menezes Leitão sentiu-se obrigado a primeiro marcar ponto na ininterrupta obra laranja que pinta Sócrates como o rei dos mentirosos. E dá-nos um exemplo. Um só. Aliás, excelente, pois essa mentira é factual, tendo chegado a ser admitida por Sócrates. Bastará esse exemplo para justificar anos de uma campanha furiosa para lhe assassinar o carácter? Teria o autor outros exemplos que pudesse apresentar mas optou apenas por um por falta de tempo ou de pachorra? Será que esta é a única mentira comprovada daí ser a única referida? Não sabemos, mas sabemos que apenas uma, esta, foi exposta.
Estamos a lidar com um advogado e um professor universitário de Direito. A última coisa de que ele carece é que lhe ensinem o que é uma difamação, uma calúnia, um atentado ao bom nome. E também saberá explicar com brilhantismo o que é e o que vale a etiqueta, o decoro e a decência nos assuntos públicos e de Estado, estou certo. Então, como é que este crânio se permite usar informações obtidas em escutas, para mais ilícitas, em ordem a estabelecer que um político merece ser castigado por supostamente ter mentido no desempenho de funções oficiais? Recordemos: Sócrates disse no Parlamento que não tinha tido conhecimento das intenções e preparativos para o eventual negócio PT/TVI, e as escutas mostraram que ele falou acerca desse negócio com Vara antes do episódio parlamentar. A sua justificação, ao admitir a veracidade da escuta, foi a de que enquanto membro do Governo não tinha tido esse conhecimento, embora privadamente já o conhecesse por ser assunto corrente nos círculos empresariais e jornalísticos. Esta dualidade, para os seus adversários e para o eleitor comum, era ouro sobre azul pois vinha alimentar todas as restantes suspeitas que sobre ele eram despejadas.
Confrange ver uma pessoa que constatamos ser capaz de coragem cívica para defender posições honrosas e idealistas não ser em todas as suas opiniões igualmente rigorosa. Porque esta questão, se conseguirmos escapar à pulsão animal que nos faz querer destruir o inimigo, o outro, é de uma simplicidade cristalina: o problema não está na mentira descoberta, a qual será inevitavelmente uma entre dezenas, centenas e milhares; o problema está no meio pelo qual se obteve essa informação. A tal historieta de que os fins não justificam os meios, em cima da qual se construiu uma civilização, pelo menos uma ética. Para todos os efeitos, o negócio PT/TVI não aconteceu. Mais: não há sequer registo de a Administração da PT ter discutido, muito menos iniciado, esse processo. Ou seja, oficialmente não se passava nada de nada. Privadamente, a história era outra. Os diferentes agentes relacionados com as diferentes partes moviam-se, estudavam, dialogavam e negociavam. Porque é sempre, sempre, sempre assim. Só que há uma condição para tal ser assim, essa mesma da privacidade, que é uma das principais condições da liberdade.
O que (quase) nunca é assim é isso de se fazerem escutas a empresários, políticos e governantes para efeitos de conspirações partidárias. Hoje sabemos que as escutas a Vara tinham como altamente provável intenção a espionagem a Sócrates, fosse para obtenção de informações com aproveitamento táctico ou estratégico, fosse para o tentar envolver judicialmente, tal como veio a ser tentado. A exploração mediática e política que se fez dos materiais registados, num conluio desavergonhado entre magistrados e jornalistas laranjas, prova a natureza política da operação montada em Aveiro.
Eis o que gostaria de saber do Luís Menezes Leitão:
– Devemos escutar todos os políticos e sempre?
– Os políticos não têm direito à privacidade?
– Se Sócrates fosse da sua família, ou seu amigo, continuaria a crucificá-lo como mentiroso por causa deste episódio?
– Deve a natureza humana e a sociedade serem transformadas de modo a que jamais apareçam governantes que ousem mentir a respeito de conversas tidas ao telefone com os seus amigos, mesmo que a sua conduta pública seja irrepreensível ou irrelevante para o caso?
– Enquanto jurista e advogado, será boa prática julgarmos alguém na praça pública através de excertos de escutas e sem darmos oportunidade ao visado para se explicar, justificar e defender das eventuais acusações?
O amigo Leitão não me irá responder. Não faz mal. O que faria mal era perder a sua militante cidadania que tanta falta faz à cultura portuguesa. Com sorte, o futuro fará com que nele a decência, que é uma geometria e uma aritmética, se aproxime ainda mais da perfeição – nem que seja à tangente. E que, portanto, diga qualquer coisa acerca dos seus colegas de blogue para quem levar socialistas a tribunal é o único projecto político que ainda alimentam antes do desespero final.
se é leitão, é porco e cobarde ou fraquinho do coco para avalizar os arrufos com o socras. se não fosse o socras esses gajos escreviam em portas de casa de banho.
Diz o Val, a propósito de uma (alegada) mentirola estilística: «A sua [de Sócrates] justificação, ao admitir a veracidade da escuta, foi a de que enquanto membro do Governo não tinha tido esse conhecimento, embora privadamente já o conhecesse por ser assunto corrente nos círculos empresariais e jornalísticos.»
Mas onde está então a «mentira» do mentiroso (embora não exactamente rei dos ditos) Sócrates? A ideia que obviamente o antigo primeiro-ministro quis transmitir na AR é que não tinha sido parte activa em conspiração alguma contra a liberdade de expressão, e não que tivesse estado exilado noutro planeta, sem falar com os seus amigos, nem saber pelos media patavina do que neste se passava, desde a reforma definitiva da latrina pseudo-noticiosa da desbocada Moura Guedes até às manobras em torno da potencial compra da TVI, que não lhe diziam, nem, tanto quanto até agora me tenha sido demonstrado, lhe disseram, respeito na sua qualidade de governante.
Pessoalmente, não partilho nem a ideologia anti-liberal (a tal que atribui a «culpa da crise» a quem mais insistentemente a previu e denunciou, pelo menos desde a rejeição do padrão-ouro…) do Val, nem o seu entusiasmo pelo simpático, mas amadoristicamente descabelado, Pedro Marques Lopes. Fico agora a saber que também não partilho a sua inclusão do correligionário Sócrates no rol dos políticos mentirosos, nem o duvidoso príncipio, a cheirar a desculpa, de que uma vez não são vezes…
As minhas desculpas pela duplicação parcial e involuntária. Ignorem o primeiro comentário, s.f.f.. E vejam lá se introduzem a possibilidade de se ler e corrigir comentários antes de os enviar…
Gungunhana Meirelles, não sei onde foste buscar que eu perfilho uma qualquer ideologia anti-liberal, muito menos onde está esse duvidoso princípio de que uma vez não são vezes. O que reflicto é a inevitabilidade de se mentir no confronto entre a vida pública e a vida privada, especialmente no exercício do poder.
Quando Sócrates foi interrogado no Parlamento a respeito do seu conhecimento do negócio, já se sabia à socapa nas máquinas partidárias do PSD e CDS o conteúdo das escutas. A pergunta estava armadilhada, pois, dado confundir os dois papéis do cidadão Sócrates. Obviamente, um primeiro-ministro, ou ministro, ou banqueiro, ou grande empresário, terá em seu poder muitas e muitas informações que não pode assumir, pois resultam das inúmeras interacções ocorridas consigo e com os seus quadros nesse grau supremo de influência. Logo, se todos os políticos estivessem sempre a ser escutados, veríamos que todos mentiam por actos ou omissões. O que lhe estavam a fazer no Parlamento a partir de uma escuta era uma pulhice. Caso ele tivesse assumido que conhecia o negócio, teria imediatamente de explicar como e quando, o que implicaria que ele tivesse de violar a sua privacidade e a de terceiros. Isto é simples.
Quanto à possibilidade de se ler e corrigir comentários antes de os enviar, ela já existe. Basta usar o cérebro.
Val, não existe dentro da página. Estar a fazer ensaios fora dela é chato e consome o nosso tempo precioso, logo a possibilidade de ver, antes de confirmar, um envio seria útil. Enfim, é só uma sugestão.
— O «anti-liberal» era no sentido económico em que a palavra, nos nossos dias e latitudes, mais frequentemente é usada. Em americanês poderia talvez dizer-se «anti-libertarian». Enfim, aquele tipo de pensador que acha que o «moderno estado social» (um neologismo para evitar o velho «socialismo», hoje injustamente tratado) baseado no fim do milenar mercado da moeda como aferidor do melhor padrão de valor monetário, a favor da pura convenção baseada no esfreganço da lâmpada mágica que praticamente todos os governos actuais praticam.
— O comentário era dirigido a esta perspectiva: «E dá-nos um exemplo. Um só. Aliás, excelente, pois essa mentira é factual, tendo chegado a ser admitida por Sócrates». Por um momento até cheguei a pensar «Ai Jesus, que já recrutaram o pateta do Seguro para o pas de deux (ou trois?)…
:^D
Oops, so sorry. Cá estamos outra vez. Acrescente-se o que está delimitado pelos asteriscos:
“Enfim, aquele tipo de pensador que acha que o «moderno estado social» (um neologismo para evitar o velho «socialismo», hoje injustamente tratado) baseado no fim do milenar mercado da moeda como aferidor do melhor padrão de valor monetário, a favor da pura convenção baseada no esfreganço da lâmpada mágica que praticamente todos os governos actuais praticam, *é que não tem culpa nenhuma daquilo a que chama a «crise do capitalismo»*.”
Jose´Seguro, é mesmo pobre no contra-ataque.Quando PC refere hoje no debate quinzenal que Socrates (pinto de sousa para os amigos…) em campanha eleitoral não falou sobre a tsu? tinha aproveitado a deixa, e tinha arrasado o Pm ministro ao recordar-nos as muitas mentiras que o levaram ao poder. Perdeu uma grande oportunidade de brilhar. enfim é o que temos.
Gungunhana Meirelles, continuo a não perceber como foi que me colocaste nesse grupo dos anti-liberais, seja lá qual for o sentido que dês à expressão. Nunca emiti opinião sobre essa temática de modo a que pudesse ser assim rotulado. Também não percebo a tua dificuldade em reconheceres que Sócrates mentiu, factualmente mentiu, como, de resto, o próprio admitiu.
Quanto ao corrector, entendi-te à primeira. Vou tentar descobrir uma solução, mas não prometo nada pois não faço ideia se existe para este blogue.
__
nuno da camara municipal, o Seguro é um desastre, a caminho de ser uma tragédia.
Val,
afinal o que é a mentira?
Será que a podemos/devemos tratar em termos absolutos?
Será que não devemos separar o cidadão Coelho, do cidadão primeiro-ministro ou do cidadão presidente do PSD?
Quando o cidadão Pinto de Sousa falava, não o fazia, como primeiro-ministro umas vezes, outras como secretário-geral do PS e outras mais como amigo, amante, cidadão anónimo ou não, etc. e tal?
Quando o cidadão Palma fala, fá-lo como magistrado, como cidadão, como adepto do PSD ou como magistrado?
Não será tudo isto relativo?
Não é por acaso verdade que aquilo que uma qualquer figura do estado diz saber sobre determinado assunto, é apenas o conhecimento oficial que tem desse assunto ou deveremos inferior que é tudo quanto sabe sobre o mesmo?
Seremos todos mentirosos?
1) Val, a questão é para mim secundária, uma vez que o meu principal interesse no caso Sócrates diz respeito sobretudo ao uso da falsificação noticiosa como meio de intoxição e arregimentação de massas, mas talvez o quid pro quo do «anti-liberal» fique mais claro se eu usar o detestável neologismo «neo-liberal» [*] em vez de «liberal» tout court.
Caso contrário, fui eu que me enganei e sinceros cumprimentos pela sua compreensão de que a crise do actual socialismo humanista europeu e seus inegáveis benefícios é do actual socialismo humanista europeu e seus inegáveis benefícios, e não do liberalismo do século XIX, ou do darwinismo social, ou do capitalismo selvagem, ou do ouro, ou do monetarismo, ou dos especuladores (leia-se «investidores inteligentes») e quejandos, habituais bodes expiatórios, nesse blogue e em muitos outros locais similares, para os malefícios do actual socialismo humanista europeu…
Isto no sentido em que a culpa do peso de um determinado obeso pode ser do próprio obeso ou de alguma patologia sua a investigar, se ainda não foi descoberta, mas não é, nem do mau olhado dos vizinhos magros, nem da força da gravidade. A vida é o que é, não é o que desejaríamos que ela fosse, e se não se aceita isso não se pode aspirar a uma melhor qualidade de vida.
2) Quanto ao «Sócrates mentiu, factualmente mentiu, como, de resto, o próprio admitiu», bom, se assim foi (não dei por isso), então deve ter mentido ao admitir que tinha mentido [**], o que o tranforma num caso ainda mais bicudo do que o cretense do paradoxo. Pode ser um caso para o detective Pacheco, especialista em investigações bizantinas, hoje reduzido aos mais lineares casos de divórcio político.
___________________
[*] Outro, e de calibre idêntico ao do envergonhado «estado social» com que se foge ao «socialismo», como se o único «socialismo» à face da terra tivesse sido o dos campos e fábricas do Estaline ou do Hitler.
[**] Uma vez que, tanto quanto me tenha sido demonstrado até agora, a sua afirmação de não ter tomado conhecimento de acontecimentos públicos (que até eu conhecia!) como primeiro-ministro de Portugal, e não no sentido de não ler a imprensa, nem conversar com os amigos, me parece inteiramentre credível (e, sim, ouvi com cuidado o que disseram os visados pela teoria conspirativa à comissão de investigação da AR).
Teofilo M, mas precisamente, é sobre isso que elaboro. Por isso me pareceu tão sugestivo o texto do Luís Menezes Leitão, dado que ele apenas dá um exemplo das mentiras que se atribuíram a Sócrates. Ora, esse exemplo é relativo a uma disparidade só passível de aferição através de escutas.
Completamente diferente é o caso de Passos Coelho e o de Portas, ainda o de Relvas, onde as mentiras são relativas a afirmações públicas. Relvas chegou a mentir sob juramento no Parlamento e nas declarações à ERC.
Como é óbvio, não há comparação possível entre os graus de responsabilização e as consequências políticas em cada uma das situações.
Gungunhana Meirelles, constato que não deténs nenhuma lembrança de me ter lido a defender ataques ao liberalismo, pelo que vou considerar o assunto encerrado. Quanto a Sócrates, a pergunta que lhe foi feita no Parlamento não distinguia entre a personalidade “primeiro-ministro” e a pessoa “Sócrates”, daí ter sido uma pergunta armadilhada para a qual não havia boa resposta. Ele sabia como cidadão na esfera da sua privacidade, não o sabia como governante na esfera da sua responsabilidade. Obviamente, a duplicidade foi explorada em mais um ataque de carácter.
Val: «daí ter sido uma pergunta armadilhada para a qual não havia boa resposta».
A boa resposta a uma armadilha é desarmá-la. Se alguém me perguntar «conseguiste pôr o Val a chamar mentiroso ao Sócrates?» a resposta correcta é: «não, nem tentei, nem tal disparate me passaria pela cabeça». Não é «sim, ele disse isso durante uma troca de impressões no AspirinaB».
Isto porque se percebe o sentido da pergunta e a resposta deve respeitá-lo.
Gungunhana Meirelles, nesse caso deves entrar em contacto com Sócrates e ensiná-lo a desarmar esse tipo de perguntas, porque ele não o conseguiu fazer naquela altura.
Concordo com a parte da «armadilha», mas acho que conseguiu. Não se pode confundir a resposta mais correcta e — tanto quanto eu saiba — verdadeira que era possivel dar, com a exploração mentirosa do que quer que ele tivesse respondido.
A resposta do primeiro-ministro à pergunta dirigida ao primeiro-ministro, no contexto do debate em curso, foi a correcta e verdadeira, partindo do princípio — eventualmente discutível, mas isso daria toda uma diferente discussão sobre o que é ou deixa de ser lícito fora das regras simbólicas do escutismo — de que nada tinha empreendido no sentido de criar ou impedir os movimentos em torno da TVI de que toda a gente tinha conhecimento.
O simples facto de ninguém lhe ter respondido com a nova pergunta «mas então o senhor primeiro-ministro não sabia o que era do conhecimento público?» prova a correcta interpretação do sentido da pergunta armadilhada, i.e. o sentido «diga lá que conhecimento ilícito e manobrista tinha o senhor, como primeiro-ministro e homem poderoso, da conspiração em curso que passou por si»…
A resposta correcta, curta e em minha opinião verdadeira, era «nenhum».
Gungunhana Meirelles, o facto de essa resposta poder estar formalmente correcta não impede que esteja, em simultâneo, materialmente incorrecta. Daí a duplicidade a que não se pode escapar quando há uma violação da privacidade de um governante ou figura pública.