2 de Maio vezes 3 142

Durante este mês de crise política, balizado pelos discursos do 25 de Abril na Assembleia da República e o actual panorama de Portugal estar em cada vez melhores condições económicas, Pacheco Pereira escreveu dois textos que ofereceram consolo aos socialistas e provocaram azia e maus fígados nos direitolas, A crise do Governo, a crise do Presidente e a crise do jornalismo e Intoxicação da opinião pública. Escolho uma citação de cada, para ilustrar o acerto e relevância das suas palavras:

«No dia 2 de Maio, o dia da crise, em vários órgãos de comunicação o estilo e o tom político dominante foi todo o dia igual ao das manhãs do Observador, muitas vezes com o efeito repetidor das mesmas pessoas em vários órgãos de informação. Há um precedente a este efeito, o papel d'OIndependente que preparou a entrada de Paulo Portas na política, acabou com o CDS "centrista", e contribuiu para o fim do "cavaquismo". Na verdade, ninguém como a direita radical sabe fazer melhor este papel [...]»

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«Na ausência de qualquer trabalho jornalístico, que incluía, por exemplo, ter preparado citações, e imagens, com as versões anteriores dos acontecimentos e mostrando contradições e mentiras, ou ter construído uma cronologia com o que se sabia, o que daria uma base muito mais sólida do que usar interpretações capciosas dos comentadores e jornalistas na base de impressões, ou apresentar como "novidades" coisas que de há muito eram conhecidas, o papel de imediatamente "interpretar" o que estava a suceder foi entregue a comentadores e jornalistas-comentadores esmagadoramente de direita, com relevo para a brigada do Observador, agora também à noite na CNN. Repetiu-se o que aconteceu no dia da crise, a 2 de Maio, uma fúria incontrolada que, insisto, nada tem que ver com o jornalismo. Quando um diz mata, o outro diz esfola e, por fim, outro diz esquarteje-se.»

O Pacheco não é apenas um ex-político do PSD com altas responsabilidades durante o cavaquismo e depois no consulado de Ferreira Leite, nem apenas um dos comentadores mais famosos e caudalosos há décadas, nem apenas um historiador com relevante obra de investigação na área política, ele é também um autointitulado especialista em comunicação social e jornalismo. Da soma destes predicados, a que acresce o seu papel de perseguidor apaixonado de Sócrates, resulta uma coisa muito parecida com autoridade. Autoridade na matéria, nesta: o monopólio da direita no espaço mediático desde os anos 90.

A mesma, mesmíssima, direita que provocou uma crise política que teve o seu clímax (mas ainda não o seu epílogo) numa certa terça-feira. Um dia em que essa tal direita dominante — ubíqua na imprensa, das direcções às redações, dos comentadores fixos aos volantes — foi toureada por um primeiro-ministro que optou por não se deixar chantagear. O espectáculo foi tão imprevisto, tão impressionante, que no primeiro texto o Pacheco chega a exclamar “não sei se daqui a dez anos haverá uma escola ou um curso académico de Comunicação que estude o dia 2 de Maio de 2023, nas rádios e na televisão, e os dias subsequentes. De manhã à noite não encontrará jornalismo.

Só que há nas suas descritivas palavras grossa chatice. Resulta de ele ter dois pesos e duas medidas, o que deixa indelével nódoa de bosta no que pretende seja a sua imaculada honestidade intelectual. Ir até aos tempos do Independente para encontrar um precedente para o “2 de Maio” é falso seja qual for o ângulo da comparação. Então, essas capas geravam animação noticiosa nos telejornais mas não correspondiam a um domínio sistemático sobre todo — todo! — o editorialismo e comentariado em períodos contínuos de 24 sobre 24 horas, juntando-se o cabo e as redes sociais. Se a intenção fosse, realmente, a de encontrar um precedente outra data teria de ser convocada: 21 de Novembro de 2014, pelas 10 da noite.

A detenção de Sócrates foi planeada para ser um dos mais poderosos espectáculos mediáticos alguma vez registados em Portugal. Foi distribuído horas ou dias antes a certos jornalistas o argumentário que o Ministério Público iria apresentar ao juiz Carlos Alexandre, o que eles publicaram, comentaram e divulgaram em cima do acontecimento. Equipas de televisão foram avisadas para se apanhar o bandido a ser transportado para o calabouço. O comentariado entrou em êxtase, bacanal de vingança e ódio. Um político do PSD, amigo do juiz, usou o Facebook para agradecer a Deus. O resultado foi um misto de blitzkrieg com shock and awe, onde se pretendeu impor o julgamento instantâneo de um certo cidadão. Julgamento político para efeitos de linchamento social e condenação criminal. Julgamento criminal para efeitos de linchamento social e condenação política. Nessa noite, nos dias seguintes, nas semanas seguintes, nos meses seguintes, nos anos seguintes, que fez o jornalismo?

Que fez e faz o jornalismo a respeito das evidências de não fazer sentido deter, muito menos para efeitos da instigação de culpabilidade e destruição de direitos de personalidade, quem está a entrar no País? Ou de as suspeitas nessa data apresentadas como justificação para a sua detenção não passarem de hipóteses agora dadas como infundadas? Ou de a data para a sua detenção e prisão parecer ter sido escolhida não por algum motivo atinente à investigação mas antes ao calendário político das eleições de 2015, ocorrendo um dia antes de António Costa iniciar o mandato de secretário-geral do PS? Ou de não existir objectividade racional e legitimidade moral para a prisão preventiva em estabelecimento prisional, tendo sido um arbítrio do juiz a pedido do MP? Ou de toda a comunicação social ter sido conivente com os crimes cometidos por magistrados na violação do segredo de justiça, e os ter explorado política e comercialmente? Ou de se ter iniciado uma caçada judicial e mediática a terceiros com relações pessoais ou profissionais a Sócrates? Ou de nunca se ter provado qualquer acto corrupto, apesar da completa devassa feita aos registos públicos e privados onde apareceu o nome José Sócrates? Ou de o juiz Ivo Rosa ter desmontado, e publicamente explicitado, o que não passou do maior e mais obsceno embuste na história da Justiça portuguesa em democracia? Que opinião tem o Pacheco a respeito do trabalho jornalístico neste caso e suas avassaladoras questões para qualquer defensor do Estado de direito e da civilização onde queremos viver?

Nunca o saberemos. Ou melhor, sabemos. Acha bem. Se tem a ver com Sócrates, os métodos da direita radical são um refresco que o Pacheco saboreia deliciado. Já se contam 3 142 dias em que o jornalismo se transformou em auxiliar do Ministério Público por actos e omissões. Ao lado deste fenómeno, o 2 de Maio é pateticamente risível.

26 thoughts on “2 de Maio vezes 3 142”

  1. eu acho que o Valupi, o Aspirina, é a musa destes pategos estroinas todos: vêm ler e, não imediatamente para não darem a mão à palmatória, isso significaria renderem-se aos seus verdadeiros encantos dos recantos da verdade, vão aqui e acolá, hoje e depois de amanhã, dando toques de lucidez, toques que lhes entra nos bolsos, claro, porque para esta variante de gente puta a verdade nunca é gratuita. mas, nos entretantos, propositada e intencionalmente, esquecem o nome daquele cuja carne serviu para alimentar o canhão da devassidão e da calunia e da destruição da sua vida política e pessoal.

    olha, Pacheco, ainda tens muita calçada a calcar. mas estás no bom caminho de galgar – tens de continuar a alfabetizar o teu carácter com uma Aspirina por dia. a água é oferta minha.

  2. ó arrozeira eu não desejo mal a ninguém, mas dava-me um certo gozo passares um bocadinho que fosse pelo pantanal que está transformada a justiça, mas como és uma pessoa normal (ás vezes), não vales o esforço de ter que abrir um processo.

  3. se calhar havia aqui alguns que deviam estar a alugar casa ou com um credito ao banco para verem como portugal está em tão mas tão melhores condições económicas…

  4. a compreensão e capacidade de perdoar da olinda é qualquer coisa de espectacular. primeiro perdoou o cavaco, depois o mário machado, agora o pacheco pereira!
    há aqui um padrão e não estou a falar de um padre grande!

  5. tal e qual como no tempo da outra senhora , jp -:) -:) mudar tudo para ficar tudo na mesma. são mesmo tontos.

  6. Todas as semanas, Pacheco Pereira dá pontapés no Observador. A Sábado, por exemplo, não se distingue no género mas como é cliente nunca é referida na malhação. Imagino o que diria se Sócrates tivesse vendido textos de publicidade a João Rendeiro, no Expresso

  7. pimentos padrão, compreendo, e perdoo-lhe o facto de ser um idiota: sou de um padrão espectacular. !ai! que riso

  8. Sr./sr.ª Valupi, deixe de ser tão patético. Já se torna ridículo. Fale mas é do zezito, que interpôs mais um recurso, um processo para afastar um juiz que ele não quer. Como dizia o outro “ não havia necessidade “. O processo vai prescrever, no todo ou em parte. Porque os juizes fogem dele como do diabo da cruz. Presentemente está nas mãos de duas senhoras juizas, que se forem como as minhas duas vizinhas, que também são juizas, estando sempre, mas sempre, em casa, ou metem baixa médica, ou engravidam para depois meterem baixa médica . Ou qualquer coisa . E o mal vem todo das cagadas do Sócrates. Como sempre, não lí o que escreveu, mas calculo …
    Vá ao médico, tome a sua medicação.
    E já agora, ponha um freio no malcariado, que passa aqui o dia e a noite, publicando sobre vários nicks .

  9. pois, olinda.
    como bem sabe, a nascente é o carácter. e o carácter – óptimo em estupidez – dos carácteres congéneres, todos juntos, formam a idiotice dos idiotas do carácter idiota. é a optimização do idiota.

  10. O que se passa nos canais de TV por cabo é escandaloso, digo até totalitário, uma esterqueira.
    Ironicamente uma das consequências da sinfonia de uma nota só em que se transformaram a SICN e a CNN, consiste no facto de a grande beneficiária do atual estado de coisas ser precisamente uma das rainhas da esterqueira a CMTV, que dedica significativamente menos horas ao deboche da CPI e do SIS e cujas audiências nas últimas semanas são consistentemente maiores que o somatório das da SICN e CNN.
    Isto significa uma deserção, uma saturação dos espectadores. Seguir-se-ão a intolerância e o vómito.

  11. Valupi, posso estar a ver mal a coisa, mas insisto: no início do penúltimo parágrafo, onde escreves “instigação de culpabilidade”, será que querias escrever “investigação de culpabilidade”?

  12. Não vejo o programa de um ex humorista que passou a ser um dos comentadores que mais malha em tudo o que cheire a PS desde simpatizantes, militantes, deputados e sempre a subir chegamos ao Governo e a Antônio Costa. São tudo portugueses sem vergonha, mentirosos, ladrões do bem estar de 10 000 milhões de portugueses enfim provocam asco aquele finório de fatos de bom corte camisa com punho de botão e casa e que defende desta corja os “portugueses de bem” com um refinado cinismo. E ninguém diz nada está tudo de boca aberta para este intelectual intocável porque e ele a sibila que leva os nossos bloquistas e os nossos chegados ao êxtase. No sábado o pavilhão que há foi Atlântico encheu-,se com 10 000 perseguidos que lhe beberam as diatribes as gracolas que nem são escritas por ele. Quem escreve os textos e uma enorme equipa que trabalha sob a sua batuta pois ele não sabe quase temperar umas crônicas que fez durante algum tempo para a Folha de Sao Paulo e que mais tarde publicou. Vão lê-las e sejam sinceros. Aquilo não e humor e comentário político mais verrinoso que o dos outros comentadores todos. Podem vir montes de comentários a arrasar o que escrevi, mas isso não tem importância. O mundo continua a girar.

  13. Valupi, gosto quando não perdes tempo a tentar convencer nos que a Ucrânia é um baluarte da democracia e que a guerra civil que ali se desenrolou(a) contra os russofonos nunca existiu. A descrição que fazes da operação que levou à detenção do Sócrates, de um ato ilegal e criminoso encoberto por uma história pré-preparada e colocada, é a de uma operação clandestina. Daquelas do tipo que os serviços secretos costumam levar a cabo. Andam todos enganados se pensam que o problema do SIS é recuperar computadores. E digo-o sem ironia.

  14. Joaquim Camacho, instigação = “Acto ou efeito de instigar” + culpabilidade = “Qualidade ou estado de culpável”

    Qual é a parte que não estás a perceber?

  15. Valupi, admiti como possível e legítima essa hipótese, aliás conjugada com a “destruição de direitos de personalidade” que vem a seguir, mas pareceu-me um bocado rebuscada para o estilo geralmente claro e directo a que nos habituaste (concorde-se ou não com o conteúdo) e fiquei na dúvida. A construção que imediatamente a antecede (“Que fez e faz o jornalismo a respeito das evidências de não fazer sentido deter, muito menos para efeitos de…”) conduz instintivamente o leitor — ou pelo menos conduziu este leitor — à expectativa de alusão a um dos vícios mais frequente e justamente apontados à trampa de justiça que temos, que é a “detenção para investigação”, em que se despeja o indígena no chilindró com poucos ou nenhuns indícios e/ou provas, transformando a própria detenção em meio de “prova”. Foi o que, no meu entender, aconteceu a José Sócrates, e nisso, parece-me, estamos de acordo. “Que fez e faz o jornalismo a respeito das evidências de não fazer sentido” isto ou aquilo parece-me pouco rigoroso porque, para o “jornalismo” de recados e encomendas que maioritariamente é o nosso (conspurcando vergonhosamente o jornalismo sem aspas) todo o comportamento rafeiro que lhe apontas faz sentido, porque em toda a trampa colabora activa e caninamente e não concebe sequer que possa ser de outro modo. Os poucos que o concebem são pela generalidade da classe encarados como malucos dos cornos ou, quando muito, excêntricos ou castiços, se lhes der para a “benevolência”.

    Instalada a dúvida na minha magna corneta, não pretendi fazer uma correcção, mas sim um alerta. Por isso a formulação como pergunta e a ressalva “posso estar a ver mal a coisa”. Esclarecida a dúvida, nada tenho a objectar.

  16. Mjp, milhões je pense ?, somos 10 milhões, 10.000 milhões, só nas estatísticas rigorosas do partido da sua graça …

  17. The fall of an empire.
    E terei sido eu o único a ver o dedinho do Putin a deslizar sub-repticiamente para o controlo remoto meio segundo antes do infausto acontecimento, sem ninguém no Pentágono dar por isso? Porra, alguém lhes diga que a integridade física do líder da civilização ocidental só estará garantida quando me contratarem para chefe da segurança da Casa Preta.

    https://youtu.be/ZK6W7u3qE18

  18. estou fartíssimo de um tipo de canalhas raivosos que nunca digeriu a derrota do fascismo pela democracia…
    estou fartíssimo de um tipo de canalhas mentecaptos que tortura a verdade, subverte os factos, esgana as ocorrências… e que se apresentam (os canalhas mentecaptos) como os arautos da urbanidade e da decência (tal e qual os pides de má memória).

    https://www.youtube.com/watch?v=V5zrM9DFmJc&t=1s

  19. Não foi dormir. Mas pra disfarçar, atacou ao amanhecer. Mete muitos vlogs ao barulho. Propaganda médica. presidente ze linques.

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