Todos os sacerdotes passam agora a poder absolver as pessoas que praticaram o aborto e que se arrependeram, sem necessidade de passar pelo bispo ou pelo Papa. Em Portugal, há sacerdotes com licenças especiais que lhes permitem perdoar o pecado do aborto. “As reservas que existiam eram fruto de tradições. Nós, franciscanos, já tínhamos uma licença especial para absolver. E havia outras pessoas para quem estava desbloqueado”, adianta o padre e teólogo Carreira das Neves.
Franciscanos, seus privilegiados, hem? Há alguma razão para a especificidade do vosso perdão?
E as mulheres? A quantidade delas que foram parar ao inferno? Já viram? A decisão do Papa Francisco terá agora efeitos retroativos ou há almas que serão eternas vítimas das más interpretações do espírito cristão? Ah, mas o inferno é uma realidade virtual? Então, estamos a brincar?
Mas, como era aqui na Terra? O que acontecia até agora às mulheres arrependidas de tamanho crime e que arriscavam confessá-lo? Eram escorraçadas da Santa Madre Igreja, ficando os restantes fiéis intrigados sobre a razão do afastamento? E quando esclarecidos, olhá-las-iam de lado, atirar-lhes-iam pedras? E as mulheres que não chegavam a confessar, morriam “em pecado”? Horror dos horrores. Saberiam da licença especial para perdoar dos franciscanos? Se não, porque não? Este perdão universal agora determinado pelo Papa equivale a uma carta verde para abortar ou haverá um registo (eletrónico, pois há liberdade de escolha do confessor) para prevenir abusos? Perguntas e mais perguntas. Ser teólogo não é fácil. Muito menos neste momento em que todos vemos onde leva a extrema fé. Por outro lado, também não vos são feitas muitas perguntas, não é? Há vidas piores.
Estes problemas (do perdão às abortivas) considerados verdadeiramente importantes – e que por isso me fazem duvidar da sanidade mental de pessoas que aparentam ter neurónios, mas não se riem do que dizem – são a prova de que dentro deste mundo, mesmo deste “ocidental”, há mundos de outro tempo, de outra dimensão, em que basicamente se continua a infantilizar as pessoas e concomitantemente a assustá-las com o sobrenatural e a levar à letra, e a sério, ideias caducas e ridículas, do tempo em que os animais falavam e ainda nem Shakespeare era nascido. É inacreditável. Neste caso do perdão ao aborto, como se as mulheres não tivessem mais com que se torturar depois de decidirem interromper uma gravidez do que com a salvação da sua “alma”. Não vou enumerar aqui os dilemas e as angústias concretas. Para cada um, basta pensar um pouco.
O castigo (ou o perdão) divino está tão deslocado no mundo real que parece um fenómeno do mundo do ISIS. E o triste é que é, embora com consequências menos violentas. Nem para os verdadeiros crimes o castigo ou o perdão divino interessam. Não resolvem nada.
Em ciência, fala-se na possibilidade de universos paralelos, eventualmente com idades diferentes, dada a imensidão do espaço. O estudo dessa teoria está a avançar e eu espero viver para saber as conclusões. Infelizmente, este mundo paralelo criado e mantido pela religião é outra coisa e em nada contribui para o conhecimento do universo ou dos universos nem sobre o espaço-tempo e o nosso caráter mortal. É de lamentar que demasiada gente desperdice o seu tempo com morais sobrenaturais e salvações e acate sem qualquer distanciamento histórias bizarras. Eu estou no outro, ao lado, a olhar com estranheza.
Fenómeno que tem a ver com o mundo do ISIS é esta obsessão de vigiar e escarnecer de pessoas que têm visão do mundo e linguagens para falar do sofrimento e do mal diferentes das suas.
Uma pergunta, um pouco indiscreta: também os padres pedófilos estão mandatados para perdoar o pecado das mulheres que, coitadas, são a maior parte das vezes obrigadas, pelas circunstâncias, a recorrer à interrupção da gravidez? Afinal quem é que pode perdoar a quem?
Tangas, Penélope. Quem te lê lembra-se logo das vacas e das mulheres e do muito que te ris nervosamente com o porco do Ignatz.
O Papa Chico está a fazer um grande trabalho, é um reformador. A crença e seus valores estão certos, o sistema de recompensas estava errado. Chama-se a isto gamificaçao. Viva o San Lorenzo de Almagro.
um excelente bálsamo para as crentes com peso de consciência. parece-me bem, Penélope. :-)
Deixem-se de polémicas:
http://www.elmundo.es/andalucia/2013/11/11/528115f361fd3d8a608b4572.html
Todos os que se mantêm casados, mulheres e homens, aprendem a ser submissos…
Disso depende muitas vezes a própria continuidade do seu Casamento e não é vergonha nenhuma ser-se mutuamente submisso com alguém, quando existe Amor entre ambos.
Gostei muito do post. Realmente é fácil para uma boa escritora fazer uma reflexão sobre o absurdo.
Gostaria de saber como amanharam lá acima o tema das que tiveram que sair do inferno se lá estavam por no poder ser perdoadas. Pasaríam pelo purgatorio como um enfreamento para depois irem para á gloria?. E também que sorte, realmente, tiveram aquelas que conheceram o tiveram perto um padre franciscano, pois é.
Noutros lares também se fala disto.
http://arompidadodia.blogspot.com.es/2016/11/faladoiro-lugar-no-que-se-murmura_21.html