Um poema de Maria Valupi em 1979
Há quem diga que o acaso não existe. Trata-se de uma questão sobre a qual nunca se chega a uma conclusão definitiva; nesse tema tudo é precário. Mas a verdade é só uma: outro dia andava na Faculdade de Letras a fazer tempo para uma sessão do Congresso de Manuel da Fonseca quando descobri uma Feira do Livro ali no corredor. Palavra puxa palavra percebo que o jovem encarregado do «estaminé» é filho de um casal – são dois escritores portugueses muito importantes e revelados nos anos 60. Vejo uma revista (Sema) com data de 1979 – Outono e que custava ao tempo 120 escudos. Não hesitei e comprei de imediato. Ao lado de poemas de António Osório surgem três poemas de Maria Valupi. Vamos ao poema escolhido:
«Eu vim depois dos mortos
que não estão imóveis,
dos náufragos itinerantes
de rosto e gesto tonto
que a água dos meus olhos
também guarda.
Eu vim depois dos puros,
dos fortes e dos exangues
– falsamente pálidos –
que no meu sangue aquecem.
Esses têm o meu amor
que não quer ser amado.»
(Recolhido e divulgado por José do Carmo Francisco)
Morte, sangue, fatalidades. É o que a vida tem demais.
Por falar em morte. Morreu um conhecido meu ainda por cima judeu. Os judeus diz-se não dão nada a ninguém. Este que eu conheci nem sequer um peido dava. Mas ao morrer foi obrigado a dar algo:
O avarento Tadeu
não dá seja o que for,
somente quando morreu
deu a alma ao criador!
TODA A GENTE DEPOIS DE MORRER É VIRTUOSA. NINGUÉM TEM DEFEITOS.
Por exemplo D. Amália era a maior, ninguém lhe aponta o mínimo defeito. Virá a ser canonizada?
Quando cantava seus fados
os puns da Dona Amália
saíam tão perfumados
como as rosas d’Itália!
E uma das piores mortes é, por exemplo, um sujeito morrer enforcado. Não sei se já experimentaram.
O pobre do enforcado
teve uma morte santa,
faltou o ar ao coitado
tinha um nó na garganta!
Poetastros do diabo
Riem do avaro Tadeu
Mas ele não dava o rabo
Como já o Adolfo deu
Eu vou rimar com Francisco
Francisco rima mais eu
Eu como o cu do Francisco
Francisco não come o meu
Vai morrer longe, charolês!!! És um animal…
Oh Vate Embora e Jonas Nogueira vocês comam onde quiserem e como quiserem que eu não sou para aí metido.
Vocês são DESCARADOS ou DES… CU… RADOS?
Com um ar de descarado
disse o homossexual,
queria ser enterrado,
nas traseiras, no quintal!
Mas para vos informar eu nem sequer sei a minha idade nem a terra onde nasci:
Quem não sabe a idade
nem a terra onde nasceu,
são ossos da mocidade,
mas quem tem terra sou eu!
E para além disso prefiro o sexo feminino. E se não encontrar quem me queira…
Será que não há mulher
para este homem puro?
então, se ninguém me quer,
isto continua duro!
Até à próxima.
Não conhecia, mas pela amostra valerá bem a pena olhar a obra.
Há revelações do caraças, então não é que o “jovem (…) é filho de um casal” ?
interessante a tua escolha, Zézinho. porque escolheste este?
Ó maluco são dois escritores portugueses – a mãe e o pai. Julgas que eu ia dizer os nomes dos dois? Podes esperar sentado…
Olinda como sabes a escolha de um poema entre três depende das circunstâncias e elas mudam de dia para dia. Quando andei pelos corredores da Faculdade de Letras e descobri essa revista de 1979 escolhi logo o poema talvez pela dimensão – não pela qualidade que é uniforme…
este poeta da treta é o maior, perguntado sobre alhos, responde caralhos. ninguém quer saber nomes, só fiquei surpreendido por o jovem ser filho do casal e não da famel.
então posso dizer que a escolha foi escolhida por um estado de espírito de um acaso interessante. :-)
Ó maluco vai para o hospital, o teu ainda não fechou!!!
Há tempos fui visitar um amigo ao Júlio de Matos. A certa altura apontou para o edifício em frente e disse: estás a ver, ali é o pavilhão dos malucos.
Tu não podes ser o Dédé do Pinheiro da Cruz, pois não??? Ainda se fala dos colchões queimados – mas deve ser outro…