Vinte Linhas 562

A dama de ferro atirou o livro para a mesa e disse: É nisto que acredito!

Corria o ano de 1979 e, em vésperas de eleições gerais no Reino Unido, os responsáveis do Partido Conservador forneceram à senhora Thatcher um projecto de programa que procurava ser um documento pragmático, cuidadosamente colocado ao centro, evitando os radicalismos mas procurando derrubar os Trabalhistas ao tempo no governo.

A futura primeira-ministra do Reino Unido, com a frontalidade que se lhe reconhece, não deixou o colega terminar a apresentação, abriu a pasta bruscamente e atirou para a mesa o livro que lá trazia. O livro era A constituição da liberdade de Freidrich von Hayek e o seu grito foi muito claro: É nisto que acredito! Claro que calou os quadros do seu Partido e durante onze anos, de 1979 a 1990, aquele livro foi o programa do seu governo. O milagre económico que foi experimentado no Chile de Pinochet foi seguido quase ponto por ponto mas não podia ser igual. Numa carta ao seu Mestre de 1982, depois de louvar a redução substancial das despesas públicas no Chile, Thatcher adverte que «a nossa reforma deve estar em linha com a nossa Constituição». Não houve fuzilamentos em Londres, não colocaram Wembley como campo de concentração mas o desemprego disparou e a guerra contra os Sindicatos dos Mineiros em 1984 foi terrível. Valeu tudo. Polícia à porta das minas e forte propaganda atacando os sindicatos. O capitalismo popular estava a nascer através da famosa frase da dama de ferro: «A sociedade não existe. Apenas existem os indivíduos e as suas famílias». Quando saiu em 1990 não ficou pedra sobre pedra no conjunto das estruturas económicas do seu país.

(a partir de uma segunda leitura de «Pagadores de crises» de José Goulão)

4 thoughts on “Vinte Linhas 562”

  1. Val,
    Thatcher, quando saiu em 1990 não ficou pedra sobre pedra no conjunto das estruturas económicas do seu país.
    Bush, seu émulo actual, ao sair de cena depois de receita identica, não vai deixar ficar pedra sobre pedra no conjunto das estruturas económicas do mundo.

  2. É, o resultado é impressionante. Basta ver que, exceptuando meia dúzia de bombas, tudo o que é nuclear em Inglaterra é dos franceses, as centrais nucleares estão todas nas mãos dos franceses, o desenvolvimento das bombas é em conjunto com os franceses e as esquadras de submarinos nucleares vão fazer patrulhas coordenadas com os franceses. Há coisas que não dão lucro hoje, nem amanhã, nem esta semana, nem este mês, nem este ano – o mundo da Sra Thatcher ainda não reconhece isso. Aliás basta ir a uma estação de metro em Londres e ver o quadro de lousa com os atrasos indicados a giz.

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