«penúltimos cartuchos» de Miguel Martins
O discurso da brevidade sempre fascinou os poetas e os leitores de poesia. Há quem saiba de cór os poemas breves de Carlos de Oliveira («A noite é a nossa dádiva de sol aos que vivem do outro lado da terra») ou a Aldeia de Manuel da Fonseca: «Sete casas / duas ruas / no meio das ruas um largo / no meio do largo um poço de água fria».
Miguel Martins abre este livro numa meditação sobre o Tempo: «Uma das perversidades da velhice consiste em fazer parecer que os minutos são horas e as horas minutos».
Se o ponto de partida é o Tempo, o ponto de chegada é o Paraíso: «Um silêncio antigo, grave; uma imobilidade, como se tudo se achasse agrilhoado a tudo – o Paraíso».
Mas Sonho pode ser o outro nome do Futuro: «O preço do futuro é o presente. Ou, dito de outro modo, o preço do sonho é a vida. E o facto de sabermos que o sonho, como o futuro, nunca o alcançaremos, só torna mais bela a nossa dádiva».
Seja como for a Poesia está sempre presente («O poema é uma escala que os olhos descem enquanto a alma sobe») tal como os poetas: «A diferença entre os pequenos e os grandes poetas é a que separa o ilusionismo da magia».
Entre o Eu e o Mundo, o autor não esquece o tempo dos outros («Se fosse proibido usar as palavras eu e não, a maior parte das pessoas permaneceria muda») nem a filosofia que toda a poesia subentende: «Quem acha que a vida é para levar a sério deve andar convencido de que a morte é a brincar».
(Editora: Tea for one, colecção: Matéria mínima, www.t41editores.blogspot.com)
O que separa o ilusionismo da magia é o mesmo que separa a pele dos ossos.
Eu acho notável como o título de um livro se pode (será defeito meu) converter numa metáfora da realidade política. Da minha leitura dos 30 e tal anos de história do PSD nasce a percepção de que está a disparar os últimos cartuchos. O que talvez permita finalmente por em ordem a democracia portuguesa (tese defendida em http://tinyurl.com/dj2lou).
Abraço,
Carlos
Obrigado.
Miguel Martins
Só de Restos se Consagra o Tempo
Só de restos se consagra o tempo, força
cerrada na inutilidade destas
cores campestres, quando o sol em Novembro
escurece os sobreiros. Só de restos me
espera a cerimónia de viver,
trânsito e transigência do silêncio,
ocultado no meu corpo. Só de restos
o trespassa o tempo, máscara e manto. Morro
muito antes da morte, sem saber se os anjos
foram gaivotas hirtas no piedoso
musgos dos rios ou se hão-de ser maçãs
ou ciência, loendros ou lembrança,
inocentes, lúcidos sonos ou oblata
de seda, a deus cedida, em pagamento
da paz. Só do que chega ao fim, se corrompe
e apodrece, se imagina o princípio,
a majestade das coisas, o silêncio
irrevelado que o corpo desconhece.
Orlando Neves, in “Mar de que Futuro”
O Tempo: tirano e vil (no meu modo de Sentir e Ser). Mas muito valioso: todos os bocados do Tempo devem ser lugar. Nunca ter lugar.
Não fica mal embora nada tenha a ver com… Conheci bem o Orlando Neves na sua casa da Rua do Sol ao Rato e li esses poemas ainda em «A4», é um poeta a inda a desocultar, como alguns outros…
vidéria e mortadeira. :-)
isto também não tem nada a ver mas sou gamado nestas coisas, e daí são marcas do Tempo,
Zzzzzzzzzzzzz