Canção breve para António Osório

Traz a casa das sementes

Com enxadas e forquilhas

Nos poemas diferentes

Foi casa de maravilhas

Entre a luz da Natureza

E o esplendor da Cultura

Seu poema é a incerteza

E não lhe cansa a procura

A raiz feita de afecto

Chegou à Academia

Na vindima do projecto

Faz falta a adega fria

Se a língua é um espanto

Milagre só igual à vida

Um voz que sobe ao canto

É clamor e terra erguida

Nas adegas e nos celeiros

Com sementes e cereais

Cabem precisos, inteiros

Os corpos dos animais

E se as palavras são pão

Dum forno de muita gente

Cada poema é um grão

E o campo quer semente

À porta dum hospital

Ou escondido na capela

Toda a clínica geral

Se fecha numa janela

Numa igreja londrina

Ou no museu madrileno

Mulher atrás da cortina

É um Vermeer sereno

Ou Goya de fuzilados

Corpos caídos sem luta

Quantos tiros disparados

Na infâmia que se disputa

Entre o nojo e o delírio

Entre a morte, seu mistério

Entre o hissope e o círio

Só um remorso é critério

Se a morte é ignorada

Surge o lugar do amor

A vida não vale nada

Se lhe falta esse rumor

Velásquez tinha meninas

El Greco perto do Tejo

No volume das esquinas

Um perímetro do desejo

Entre Palmela e Azeitão

No moscatel mais doirado

O poema dá uma razão

A quem o tem trabalhado

Poeta da arte e do ofício

Entre a pedra e a verdura

O poema é o precipício

Do que o sonha e procura

7 thoughts on “Canção breve para António Osório”

  1. Eu digo «Safa!» e até podia dizer «Livra!» mas não digo. O que alguém escreveu acima vale menos que o peido de um cigano. Menos que zero…

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