Die Grosse Stille — Philip Gröning

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Por vontade desse semideus chamado Paulo Branco, quem for ao NIMAS passar os 169 minutos de O Grande Silêncio, e ficar o tempo todo sentado naquelas cadeiras, vai sofrer mais do que os sacrificados monges cartuxos que cirandam pelo ecrã. Que é feito dos intervalos? Nem num filme de quase 3 horas se permitem 10 minutos para aliviar o stress muscular, metabólico e mental? A estupidez da ganância cega os distribuidores para as evidências. Há um público de milhões que pode frequentar os cinemas. Essa gente é constituída pelos mais díspares indivíduos, mas comunga de um desejo que a todos une: o gosto dos outros. Ir ao cinema, mesmo quando se vai sozinho, é uma experiência comunitária. Tem elementos rituais que são análogos aos das celebrações eucarísticas. Num lado como no outro, ficamos ao lado de estranhos, calados e reverentes. Uma corrente afectiva atravessa esses agrupamentos e todos se influenciam, todos se permitem ficar na dependência uns dos outros (e cada vez mais, por causa dos telemóveis que não se desligam). Ora, na missa católica há um momento em que somos convidados a cumprimentar e celebrar a presença de quem está à nossa volta. É sempre um momento forte; e, num certo sentido, é o que de mais importante acontece dentro do templo. No cinema, durante décadas, esse momento de celebração comunitária acontecia no intervalo. Corria-se para os cafés, para os lavabos, para os cigarros, para as conversas e para os olhares. Os intervalos eram ocasiões de sedução e de pães-de-leite com fiambre. Guardo recordações dos pães-de-leite com fiambre do TIVOLI que rivalizam em fervor religioso com descrições extasiadas da Capela Sistina.

Ir ao cinema, depois dos anos 70, perdeu glamour. Entra-se a correr, sai-se a correr, e em muitas salas fica-se refém das mandíbulas apipocadas. A redução da escala monumental das telas, que nos anos 80 e 90 ameaçou exibir os filmes em alguma coisa pouco maior do que o tamanho de um televisor, é um crime de lesa cinefilia. O mal que se fez à criação de um público fiel escusa de ser demonstrado. Contudo, ir ao cinema (e não só, como é óbvio, mas dele se trata nesta ocasião) é um acto que voltou a poder ser recuperado pela dimensão política. Agora, já libertos da chancela esquerdista que animou os cineclubes (embora com singulares excepções) e as elites da crítica durante os anos 60 e pós-25, o cinema oferece-se como manifestação de uma nova resistência. A resistência contra os imbecis.


Ah, em relação ao documentário de Philip Gröning, e embora seja um falhanço, se podes, seria imbecil não o ires ver.

18 thoughts on “Die Grosse Stille — Philip Gröning”

  1. PROSAICAMENTE…
    Não sabem que há (sobretudo depois dos 60 ou em grávidas ) bexigas que não aguentam 3 horas cheias sem causarem incomodidade incompatível com a apreciaçãp de um filme?

  2. Um falhanço?

    Tenho de ver…

    Quanto ao resto diria de acordo mas com o Valupi tem de se dizer tudo ao contrário, por isso é mentira.

    Agora essa do falhanço só vendo. Deve ser das raras coisas que não preciso que me ensinem. É de cinema e de popelinas.

    “:OP

  3. Quem escreveu um belo texto sobre o filme foi o Eurico de Barros. Que por acaso é um bom historiador de cinema (a palavra crítico é trapaça).
    Mas como toda a malta esquerdalha tem complexos em relação ao Eurico…

    É o único em que me fio, diga-se. Tirando ele so o Benard para o passado.

    Áh- excepção feita ao “Piano” de que o Eurico gostou e para mim serve para separar águas entre o que é cinema e que o não é.

  4. Filme falhado foi o Transe da Teresa Villaverde e não li ninguém a dizer isso. Podia ter sido um bom filme. Acaba no momento em que começa a história. Quando a rapariga é vendida. A partir daí tudo está a mais.

  5. Não somos nós que imitamos o cinema, é o cinema que nos imita a nós.
    Vamos ao Nimas? Era assim que se dizia, lá em casa, quando se queria ir ao cinema.
    O grande ecrã é absolutamente fascinante – é um mergulho no filme – ainda me recordo do voo que fiz com os flamingos do “Africa minha”, no São Jorge.

    Hoje os poucos cinemas que fazem intervalo têm um bar obsoleto, com prateleiras de vidro salpicadas de garrafas “para consumo da casa”, tabletes de chocolate sórdidas e uma máquina de pipocas plásticas e barulhentas.

    Mas sobra uma parte, a fatia maior e melhor, que foi o que nos levou ao cinema – o encontro com o filme e a partilha dessa descoberta com a nossa companhia. É o silêncio, o olhar, o sorriso, as gargalhadas e até as palavras que partilhamos, durante e no fim, a experiência que estamos de ter em conjunto e que continuamos a saborear no caminho para casa.

  6. Este filme só vou ver quando for mais crescido. O pão de ló do Quarteto é um Ti Piedade! Há no Pingo-Doce, mas convém comprar um garrafão de Vitalis…

  7. Estranho, porque o grande prazer so cinema é solitário. Só se partilha depois de se acenderem as luzes.

    Um “cinéfilo” vai sempre “sozinho” ao cinema e só “partilha” à saída. Ou até algum tempo depois.

    (os intervalos serviam para outra coisa mais de olhares e “papares” que de palrares, nisso o maluco do Oscar tem razão)

    Começar-se a falar mal acaba o fime é coisa tão incomodativa como alguém a palrar conosco mal acordamos.
    Para isso o melhor ainda é a talk pilloow

    “:O.

  8. queria dizer pillow talk. Baralhei-me à conta do pão-de-ló do py.

    Acho que o Py é estrangeiro mas não estou com ambições de também acertar no jackpot

  9. Anonymous

    Pois, isso também. E só isso já justificava.
    __

    zazie

    Lembras bem, o pão-de-ló do Quarteto. E as sextas-feiras com sessão dupla madrugada adentro. E os ciclos (marados) da meia-noite. E os aniversários com preços da inauguração. E aquilo tudo, quando aquilo tudo era tudo o que havia.
    __

    sininho

    Dizes bem. E muito bem.
    __

    Py

    Estás preocupado com a Bolsa?

  10. …estava a ver no que dava. Quando o Dow Jones cai muito activam-se logo planos de guerra, mas parece que depois do chilique de Xangai as principais senhoras lá sacaram da bolsa os sais e o leque e já se recompuseram…

  11. Senhor José do carmo Francisco adimiro muinto o seu trabalho sua escrita criativa seus poemas etc. Penso em escrever um livro mas não tenho ajuda não pretendo desistir irei lutar para isso poderia me informar como começar. Um grande abraço sua leitora.

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