Isabel da Nóbrega, cujo nome foi rasurado na dedicatória do Levantado do chão de José Saramago mas não da nossa história literária, é a autora de Viver com os outros. Este título é um achado, pois viver com os outros é o nosso maior problema. Gostaria de vos contar uma pequena história de proveito e exemplo.
Há 25 anos conheci uma escritora. Sobre alguns dos seus livros publiquei notas de leitura em jornais, em revistas e em blogs, além de crónicas na Rádio. Apresentei um seu livro no auditório da Antena 1 nas Amoreiras. Mais tarde escrevi o prefácio para uma sua antologia poética. Aqui há tempo, telefonou-me a pedir ajuda pois estava doente. Prontifiquei-me a levar umas coisinhas da mercearia próxima de sua casa e lá levei as Cerelács, os Nestums, o pão, o leite de soja, a manteiga e as bolachas. Depois de colocado todo aquele material na bancada da cozinha, e como sei que há mais mundo e mais coisas para fazer, comecei a prepara as despedidas.
Desejei as rápidas melhoras e ia para dar um beijinho na face, mas aí, terrível momento, a senhora fez um movimento brusco no cadeirão e a minha boca aproximou-se perigosamente da sua. Recebi um sonoro, adversativo e imperativo «Então?!!!». Como se estivesse a ser acusado de querer roubar um beijo a pretexto dos 16 euros que tinha pago pelas coisinhas da mercearia. Como se, com 56 anos de idade, eu não soubesse e não tivesse a obrigação de saber que os beijos não podem ter preço; se o tiverem deixam de ser beijos. Desapareci daquele terrível momento de desencontro o melhor que pude e desci aquelas escadas em alta velocidade a lembrar-me de uma frase de Verlaine: «Tenho tanto medo dum beijo como duma abelha».
José do Carmo Francisco
Tens sorte meu rapaz,à uma que vai dire os nomes de todos aqueles que iam au seu bordel em Washinton.O teu nome nâo està là god boy!
Zé do Carmo,
Não vislumbro qualquer interesse para o mundo (mesmo o nosso pequenino mundo) no ficar a conhecer esse acto falhado que relatas. Íntimo, e equívoco, para mais.
Acho que, de modo totalmente gratuito, trazes para aqui uma intimidade que (falo por mim) me constrange e que preferiria não conhecer.
Se há nessa história algum «proveito e exemplo», como lhe atribuis, é que há coisas que nunca se contam. A ninguém. Baste o teu constrangimento. Não é preciso passá-lo a outros.
Coloquei o texto porque – por princípio – coloco tudo o que tu escreves. Mas quis ajuntar esta nota. Para ti. E para os nossos visitantes.
Assino por baixo, Fernando.
Abraço.
JCF,
É um passo da sua vida muito bem contado. Eu também ficaria alarmado se tivesse feito o que você fez por ela. Não se deixe intimidar por essas ameaças pueris do Fernando, com aviso aos visitantes. Pooh pooh…
Fernando,
Ages como se fosses a Presidenta das mulheres escritoras alérgicas a bafos de homem. Tão afectado na área da virtude!
Confúcio Costa,
Isto aqui não é um abaixo-assinado, seu chinês da pôrra, não reparou?
Lucia,
Eu publiquei o texto. Você reparou neste… pormenor?
Fernando, deixa-te de paternalismos, filho. Publicaste…como se tivesses a fazer uma concessão, a usares da condescendência dum imperador do Aspirina. O Nero também tinha jeito para a declamação e poesia, sabias?
Se quizeres dar-te ao trabalho, irás encontrar
muita obra tua neste blogue que roça o briquabraque mexeriqueiro que não interessa a ninguém neste mundo. Mas deixamos passar porque te adoramos nas tuas fases lunares gramaticais. Por favor, já é tempo de largares a batina de chefe dos correios!
Eu também não assino por baixo, caro FV. O texto do JCF mostra, claramente, que “viver com os outros também cansa”.
Será que conhecemos bem aqueles com quem convivemos diariamente? Os amigos?
O que se passou nesta historieta, serve para analisar o comportamento alheio, quando sabemos ser solidários, simples, generosos. São estas pequenas/grandes coisas do dia-a-dia que se reflectem aqui como num espelho.
Escrever textos sobre as últimas (ou não) novidades literárias (sobretudo estrangeiras) ou os últimos discos (sobretudo estrangeiros), não chega. É quase uma obrigação falar destes desenganos, destas desilusões, destas verdades que “cansam”!
Esta “intimidade que confrange”, como diz, para mim, tem outro sentido: é um alerta, um grito, um desabafo…Já tenho lido por aqui outras “intimidades” que me parecem, e desculpe-me a franqueza, essas sim, “não terem interesse para o mundo”!
Já agora, outra historieta: tenho um amigo de longos anos. Músico. Do norte. Vida estável. Mulher e filhas cultas e adoráveis. Visitas, trocas de presentes…Falávamos os dois pelo telefone por vezes mais do que uma vez por semana: trabalho, projectos, confidências. Há mais de um ano pediu-me 2.500 euros emprestados.
Já lá vão 5 meses e não voltou a ligar!
Quando se empresta dinheiro a um amigo, dizem «que se perde o dinheiro e o amigo». Não quero acreditar que seja verdade…Este amigo!?
Pensava que na blogosfera se podia publicar tudo o que nos apetecesse… mas parece que não.
Utilizando a linguagem futebolistica, Zé Francisco já tem um “amarelo”, calminha, cuidado com a expulsão!
É como diz o outro:
– amigos, amigos mas negócios…
Ainda bem que o tal José do Carmo não lhe deu o beijo… não fosse ela estar com gripe, ou pior do isso:
– ter um hérpes labial.
Contingências da vida!
Este blogue divulga textos que não precisam de agradar inteiramente aos responsáveis por ele.
No caso concreto, um dos responsáveis quis apor, a um texto de José do Carmo Francisco, uma anotação pessoal. Não é a primeira vez que o faz, de resto, a textos aqui divulgados.
Os nossos comentadores são livres de discordar da opinião expressa. Mas espera-se que nos reconheçam o direito de exprimi-la.
Faço minhas as palavras do Fernando. E acrescento: a liberdade não é fácil, o belo é difícil.
Ora que bela capicua, Valupi!
Liberdade, liberdade
Quem a tem chama-lhe sua!
Até agora FV respeitou ambas. Eu aplaudo.
Pois tá tudo muito bem (menos o José do Carmo ter escrito em blogs há 25 anos, ou pelo menos é essa a ideia com que se fica) e é a liberdade etc e tal, mas lá que a crítica foi deselegante, foi. Não há volta a dar-lhe.
Quanto às histórias que não se contam, desde que sejam bem escritas, venham elas.
…embora duvide que volte a ler o José do Carmo por aqui.
Triste realidade a de quem consegue a estranha proeza de maldizer a manta alheia que lhes sara as feridas.
Olha que lindo momento: o Fernando Venâncio publica o texto, mas avisa: não vejo qualquer interesse para os nossos leitores nisso que dizes. E a gente, os avisados leitores, agradecem o cuidado do Venâncio.
Catarina,
Duvida que volte a ler aqui o Zé do Carmo? Enquanto duvida, vá aparecendo. O Zé do Carmo há-de ter surpresas para si.
Surpresas com “interesse”, esperamos nós, e que não constranjam o Fernando Venâncio.
Pertence a FV a liberdade de comentar um texto que postou.
O resto é caminhar pela orla da coisa, com medo da água fria.
Ó Grande Provedor da Caixa de Comentários do Aspirina B, e não nos pertencerá a nós a liberdade de comentar os comentários?
Caramelo,
Desde que o Aspirina existe – e isso há uns tempinhos – que essa mesma liberdade existe também. E tem-se feito dela largo uso.
Não vejo, vai desculpar, o propósito dessa sua boca. Ou é só para desconversar – arte que você, de resto, domina bem.
Ó Fernando Venâncio, a boca do Provedor não era para si, era para o anónimo, e é ainda para ele que eu digo que a liberdade do Fernando Venâncio goes without saying. Por isso, eu é que não percebi a boca dele.
Fernando Venâncio, eu só achei o seu comentário ridiculo, só isso, nada de grave, e mandei umas bocas. É o meu direito a desconversar, ou coisa assim. Por acaso, está giro aquele poema ali em cima e assim.
Eu cá considero a atitude do Fernando corajosa. Eu, por exemplo, quando leio algo que não gosto ou que me deixa constrangido (não foi aqui o caso, confesso), opto sempre pelo silêncio (a não ser que seja algo do primo Valupi, aí caio-lhe logo em cima para ele depois aplicar-me um golpe de judo e deixar-me ko).
Gostei muito do comentário: «o resto é caminhar pela orla da coisa, com medo da água fria». Touché.
Caramelo,
Entendido, agora. E o poema é giro, é.
Faço minhas as palavras do primo Costa; menos no que concerne ao “ko”, pois sempre constatei que o rapaz fica invariavelmente “ok”. Mas “prontos”, como sói dizer-se…