Impagável, a crónica de VPV hoje no Público, «Cavaco e Sócrates». É mais um daqueles paralelos arrepiantes que ele constrói com malvadez, embora este não arrepie tanto como o que ele fez, um dia, entre Cavaco e Eanes, e muito menos ainda do que aquele que traçou entre Cavaco e…Salazar.
Leia-se. Aqui vai o início do texto:
«O dr. Cavaco e o eng.º Sócrates são de certa maneira muito parecidos. Saíram os dois de um obscuro canto da província (um de Boliqueime, o outro da Beira) e em Lisboa, no Governo e, no caso de Cavaco, até em Belém, nunca verdadeiramente se adaptaram à cultura urbana. Vem neles sempre à superfície o constrangimento do estranho, uma certa reserva de quem não está em casa e uma atávica desconfiança da volubilidade e das maneiras de uma classe média e de uma burguesia com uma educação mais sofisticada e cosmopolita. Não “pertencem”. Mas, por isso mesmo, têm uma enorme vontade de poder, servida por uma enorme paciência e disciplina. É a velha história, que encheu dois séculos de literatura, do jovem que sobe à capital para a dominar, na sua variante moderna e portuguesa».
O resto é melhor ainda.
PS. A – encantadora – ilustração foi tirada de Imagens do Kaos graças aos bons serviços do Google Imagens.
Ah, Fernando Venâncio, esse texto é tão típico de uma certa Lisboa… nem queira saber o quanto essa crónica é ridicula e irrelevante.
Sobretudo ridicula…
Ah, António, eu admito que a crónica de VPV seja ridícula, admito mesmo que seja irrelevante.
Mas custava-lhe muito, a si, ter gasto duas ou três palavrinhas para no-lo explicar?
Porque, Fernando, e esta é a minha opinião, o António terá a dele, é uma crónica dum provincianismo (no que este tem de mau) atroz.
Além do mais, não passa de um lugar-comum. Mito urbano, no verdadeiro sentido da expressão.
Explicando melhor, a crónica do VPV faz ricochete e assenta-lhe que nem uma luva.
Só alguém movido por “uma certa reserva de quem não está em casa e uma atávica desconfiança da volubilidade e das maneiras de uma classe média e de uma burguesia com uma educação mais sofisticada e cosmopolita”, ou que isso sinta, já que isso nada quer dizer, escreveria algo assim.
Mas, afixe, muito do que afirmamos de outros é um simples auto-retrato.
Do próprio VPV, afirmei eu um dia (está em «Objectos Achados») que ele, falando de Eça, se estava, palavra por palavra, auto-retratando. Escreveu ele:
«A ‘esplêndida confiança’ [de Eça, em Uma Campanha Alegre] não conhece vacilações, nem limites. Sobre tudo e todos pronuncia uma sentença categórica e devastadora. […] Isto podia não passar de um exercício pueril e grotesco. Mas não. Eça ganha. Em cada palavra, em cada frase, em cada página, parece mesmo que por ele fala o inefável espírito da Verdade. […] Nunca duvidamos dele. […] Eça e nós que o lemos (e aprovamos) somos perfeitos e clarividentes: os desgraçados lá de fora meros objectos de irrisão. […] O mais convicto falhado ou o mais baço mentecapto não deixará de sentir que não merece tão má sorte.»
Importante é, pois, saber se o retrato de hoje quadra – também – a Cavaco e a Sócrates.
Não vais matar o mensageiro, pois não?
Em linguagem técnica é o chamado provincianismo de Oxford.
Claro que não, Fernando, estamos apenas a conversar.
Curioso teres falado do Eça, que já antes me havia lembrado d’ “O elogio da Beira”, de António José Saraiva, escrito nas Donas (as mesmas do Guterres), a 20 Km Covilhã (do Sócrates), em 1936. Publicado no Jornal do Fundão, esse mesmo, em Março de 2003. Tanto nos deu a “atávica desconfiança” do VPV.
Reza assim:
“Quem não viu Lisboa não viu coisa boa”, já diziam os nossos avós, deslumbrados pela enormidade babilónica da capital. E, fiada nisto, muito boa gente se deixa ficar pelas ruas da Baixa convencida que ver Lisboa é conhecer o país inteiro. Foi enganado por essa ilusão que um dos nossos maiores escritores, Eça de Queirós, nos classificou, portugueses, de “fadistas”…Que lho perdoem os beirões, porque ele próprio quando, por circunstâncias da sua vida, começou a a conhecer melhor Portugal, passou a fazer dos seus livros, como A CIDADE E AS SERRAS, cânticos de louvor à nossa Terra. Também já pensei como o grande escritor e tenho vergonha em o confessar. É verdade: julguei que os homens de Portugal eram aqueles rapazes enfezados, pálidos e tímidos que fumam pelos cafés, que as suas belezas se resumiam ao Terreiro do Paço e ao Rossio; e que a sua alegria estava naqueles sorrisos cansados, amarelos, que o fado dolente e lúgrube era o seu canto nacional…
Já assim pensei. Mas hoje dou graças Deus por ver que andava enganado.
Felizmente, Lisboa com os seus fadistas não é Portugal. Felizmente, para além de Lisboa, há muitas montanhas, planícies, horizontes e céus.”
Felizmente para Lisboa que Portugal não é só Lisboa, acrescento eu.
Certo que que se a história passa bem sem os VPV, passaria bem mal sem os da “atávica desconfiança” que o (resto do) país nos tem dado.
Agradeço, afixe, o texto – para mim de todo desconhecido – dum velho amigo, o AJS, que, nesta Amsterdão (ao fim e ao cabo, dizem, uma aldeia), era ainda e sempre o douto e estimulante camponês das berças.
«Dou you speak english?»
«Yes», respondi de imediato, mesmo sabendo que sinto dificuldades em exprimir-me na língua de Sheakespeare. «Havemos de entender-nos», pensei, depois de saber que me esperava mais uma viagem turística ao Estoril, Cascais, Guincho, Cabo da Roca e Sintra.
Entendemo-nos mal – o casal sueco também não dominava a língua inglesa. Tomei uma decisão, no Estoril: «Vou ao Turismo e, assim, fico a saber melhor o que eles desejam visitar.» Afinal, não queriam visitar monumentos nem museus, apenas passear, almoçar (no Guincho) e… regressar ao hotel Altis.
[Senti alguma frustração… Ir ao Cabo da Roca e demorar escassos minutos no ponto mais ocidental da Europa, «onde a terra acaba e o mar começa»…; ir a Sintra e não visitar Monserrate, Seteais, a Pena… Não faz sentido!]
Almoçaram bem e beberam melhor, na Boca do Inferno. «Wine white!» Rumámos em direcção ao Cabo da Roca. Kurt e Kristina demoraram escassos minutos. Uma foto do Fernando Venâncio… dirigimo-nos ao bar mais próximo. Queriam «wine white»! Pedi duas taças de branco fresco e um café (taxista não bebe álcool em serviço…). «No! Bottle, please!» O empregado traz uma garrafa de vinho branco fresco e dois copos de plástico. Kurt pediu-me se podiam beber no táxi. E seguimos viagem…
[Casal sueco de reformados. Olhos azuis, bem dispostos. Nada de museus e monumentos – apenas viajar e… beber wine white! Espreito pelo retrovisor. Riem muito, enquanto saboreiam o néctar português. «White wine! Yes!»]
Passeio por Sintra. Nada de visitas. Já esvaziaram a garrafa de branco e nota-se que estão em paz com a vida. Preparo-me para rumar a Lisboa. Kurt quase me suplica, com uma boa gargalhada: «Wine white!» Kristina sorri, em jeito de consentimento. Dirijo-me a um restaurante, em São Pedro. Peço três taças de branco fresco. E brindámos!
– Obrigado!
– Tack myckcb!
Que diria Torga desta pobre criatura.
Fernando:
A crónica é uma primeiras publicadas nas “Crónicas de AJS”, edição QuidNovi – 2004.
(são mais de 1000 páginas de crónicas, escolhidas pela filha Maria José, vendidas a €11,25 – cortesia Floribela e Morangos com Açúcar)
Afixe, o livro está há muito no meu (virtual) cesto de compras. Na próxima descida à capital…, comprarei.
Ignoro se inclui (mas parece-me provável) as crónicas saídas no volume Filhos de Saturno, de 1980, essas terríveis vergastadas aparecidas no DN, entre elas – e decerto a mais terrível – «O 25 de Abril e a História». Ah, que homem corajoso!
José Veiga detido
Em causa a ida de João Pinto para o Sporting intermediada por José Veiga na qualidade de empresário do jogador.
O ex-dirigente do Benfica foi detido para prestar depoimento no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.
De acordo com a SIC Notícias, o ex-director do clube da Luz está a ser ouvido pelo juíz e só no final ficará a conhecer a medida de coação aplicada pelo tribunal.
Em causa está a ida de João Pinto para o Sporting através da qual José Veiga, alegadamente, se apoderou de um milhão de contos.
Na semana passada o ex-dirigente do Benfica foi alvo de uma acção de arresto de bens na sua residência em Cascais o que acabou por levar à sua demissão.
Olha que não, Fernando.
A crónica não está mas estão todas as consequências dela. As conferências, entrevistas, etc.
Ainda ai está Fernando Venâncio? Pede-me duas ou três palavrinhas para explicar porque é que a crónica é ridicula e irrelevante? Eu sei lá…, não sei bem explicar. Eu acho que há coisas que só as vivendo é que se percebem, nem sei se me entende. Mas que essa faz parte do mito urbano, como diz o afixe, é verdade e está bem visto. O VPV é quase, quase inteligente, mas não chega a ser. Tem assim um pensamento um bocado geométrico das coisas e percebe pouco do mundo em que vive. Mas escreve bem e sabe tudo sobre a Carbonária e o marechal Saldanha.
Sempre ouvi dizer que os portugueses mais provincianos são os lisboetas e como vivo em Lisboa à 4 anos posso dar o meu testemunho de que isso em muitos casos é verdade. Pensam que Portugal se resume a Lisboa, mais a norte existe o Porto, onde o Sporting e o Benfica ocasionalmente vão jogar e a sul está o Algarve para onde se deslocam no mês de agosto. Não fazem a mínima ideia de que os rodeia e por isso julgam que todos os que são de fora não passam de uns saloios meio apoucados que vivem à margem da civilização. O prof Cavaco e o eng. Sócrates são provincianos porquê?????? A nível de conhecimento e inteligência não são de certeza, porque senão não teriam chegado onde chegaram…Este sentimento do VPV era típico do independente quando era dirigido pelo Paulo Portas e acusava o PSD de ser o partido da meia branca(está à vista a capacidade política do senhor)