Litania para um domingo de Lisboa

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Dizem que é domingo
a graça desce
em seus roucos paramentos
e as gentes passam rebocando o tédio
o coração afeito à fuligem
que se derrama pelos vãos das coronárias

cobre a ferrugem
promessas de vão futuro
gravemente a natureza
(que é sempre verdadeira)
faz-se espelho de ausências

talvez seja domingo
com seu branco morno tinto
e seus pretos e seus ritos
e algum brando desatino

e desarvora o deus
a infindável rebentação
que sacode praias e ilhas
souvenir que me levasse
pela mão da sorte
aos céus dos anos moços

talvez seja outra vez domingo
na solidão vigiada pelo olhar da filha
pela cinza que enluva silos e guindastes
pelo metal da mágoa
atravessando os poços da alma

quisera já as penas de segunda
o débito que vence de rasgão
pois há sempre quem traz a alma
enroscado ao aro da incerteza
confiado que a manhã estende
uma carta de rumos até onde
o domingo é um tropo esvanecendo-se
num débil rufar de cinzas

José Luiz Tavares

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