Lamentação e pranto de Jill McBain em Sweetwater
para Cláudia Cardinale em ‘Aconteceu no Oeste’
Não tive tempo para nada.
A trompete ajudou com as suas notas sincopadas a simular os meus soluços que ninguém ouviu. Nunca tinha visto um banquete de morte. Lá longe, em New Orleans, as mesas servem sempre para as refeições e para a alegria dos encontros. Aqui de nada serviu a recomendação de Brett à filha para cortar as fatias do pão muito maiores que o habitual.
Não tive tempo para nada.
Nem para as lágrimas que são a água salgada da revolta perante a injustiça da morte. Nem para perceber quem mandou matar uma família inteira. Nem para perceber porquê. Ainda era cedo. Sei agora a diferença entre a água doce do meu poço e o sal da água azul do Oceano Pacífico que está num quadro da parede da carruagem de luxo de Mr. Morton.
Não tive tempo para nada.
Afinal ainda é cedo para saber de um homem, moreno e triste, capaz de, como quem cumpre uma sentença, matar a vários assassinos depois de tocar uma melodia vagarosa numa harmónica velha, presa ao pescoço por uma corda muito mais pequena e estreita do que a outra, a utilizada para enforcar o seu irmão mais velho numa infância já distante.
Não tive tempo para nada.
Aos poucos percebi como é possível construir um sonho em miniatura. A madeira está paga, os barris cheios de pregos estão à espera. É só contar os passos e marcar o perímetro das primeiras casas de Sweetwater. A Estação e a Igreja, o Banco e o Hotel, as primeiras lojas. O sonho de Brett McBain não pode ficar adiado. A roldana do poço espera por mim. Os primeiros operários do caminho-de-ferro acabam de chegar e estão mortos de sede.
José do Carmo Francisco
Aos interessados em comentar este post-puzzle, aconselho entrar em contacto com o departamento de decifração sob a chefia do João Pedro Costa. O Português está de gritos, mas o espírito do autor resiste ao mais teimoso dos broquins. O sangue deste blogue está a correr o risco de ser vendido com refresco em dias quentes.
Este é o caminho. A desenhar um claro risco na paisagem, por baixo dum céu onde a tensão se junta, e nuvens se acastelam.
Mas faltam marcas na berma. Um homem tem que saber para onde vai, quando se mete a caminho.
Desculpem na linha treze há um erro: é matar e não «matara» e na 14 é bem por uma corda e não por «um acorda». Se o Fernando Venancio puder alterar agradeço. Peço desculpa.
Obrigado pela belíssima foto que acompanha o texto. Assim vale a pena.
linda mulher! Bom mesmo é um homem não saber para onde vai, quando se mete a caminho.
Há caminhos e caminhos. Descaminhos, também se ouve.
Nuns convirá perder-se o caminhante. Concedo facilmente, ao reparar na amostra junta. Seja qual for o lugar de chegada, é sempre ganho.
Já noutros é diferente. Era a esses que me referia.
sim, ainda me lembro da melodia
Era mesmo deste texto que eu falava quando lhe falava do texto mais lindo que li.
Não teve tempo para nada porque o tempo estava suspenso até à palavra “FIM”
Joaquim Nacimento