Pega comigo e vai comigo num barco qualquer, a remos ou à vela, tanto faz, e vamos procurar a terra dos francos que nos espera no outro lado do mar. Para ganhar e aprender ou para levar no toutiço do juízo, como nos velhos tempos de Paris. Não temas vagas alterosas, nem ligues ao sal frio e liquefeito que inevitavelmente nos refrescará as caras e os corpos na viagem de quase-aventura. Não tenhas medo que não estás sozinha. Irei contigo duma margem à outra, haja o que houver. Os nossos corpos unidos em calor-paixão de procura de lazer-prazer (desnecessariamente caro, necessariamente defendido pelo poder fictício do cartão de crédito que o Big Brother nos pôs na mão) apertar-se-ão ainda mais se os perigos de navegação se apresentarem com caras sujas de ventos contrários à nossa intenção firme e jurada de vermos e compreendermos mais — intenção que força, como tu e eu muito bem sabemos, à limpeza de coisa antigas em caves e arquivos mentais onde se passeiam ratas velhas sob ruínas de teias de aranha dos tempos do Aprendizado.
Era assim que eu gostaria de ter atravessado o Canal da Mancha, com uma companheira presa ao meu destino, num bote ou lancha. Em vez disso, meti-me no ventre duma enorme toupeira sobre carris, que já ameaça desastre financeiro pelas bocas de alarmados e hipócritas Cityistas londrinos, em Folkestone e saí no outro lado, lá para as bandas de Calais, terra de muita cebola e gritos de cebolório!
Mas nada se passa, nem nas idas nem nas voltas, como a gente gosta, isto é, de como gostamos de ver narrado em poemas leves mas ricos em oxigénio e rabanadas de vento. Jubilante e comovedor e realmente gratificante seria eu chegar aqui todo ufano e a suar para contar aos rapazes e raparigas os resultados da Conferência de patriotas americanos em LA sobre a característica indesmentível e inegável de inside job que tresandou do churrasco humano em Nova Iorque há cinco anos. Do meu discurso, se lá tivesse ido a convite, se me tivessem dado importância, se soubessem que existo, sacaria seguramente as passagens mais relevadoras e reveladoras — as do tipo de entrar sem oposição de nenhuma espécie pelas cabeças dentro de qualquer nhurro português com preocupações verdadeiramente democráticas, e tenho a certeza que pasmaria alguns deles. Mas não, em vez disso, volto, como muitos outros voltam doutros lados onde vão esquecer dívidas e frustrações e dizer mal de patrões, cansado de duas semanas de férias self-catering numa manoir, num chateau, como o seu dono gosta de chamar-lhe para acentuar o seigneurismo que escorre dalguns cantos teimosamente escuros e impermeáveis aos olhares de estranhos.
TT
Tiozinho,
És um homem cheio de sorte. Vives num mundo glamoroso, vives provavelmente dele, e ainda tens estes luxos raros de o sobrevoares, cínico quando queres, bonacheiro quando acordas para aí virado. Eu gostava de ser assim, forço-me a sê-lo (tenho várias lotarias automáticas), mas começo a recear.
Folgo, todavia, por haver no meu género, o humano, gente que acertou tão bem com a história.
Pois alinho com o Fernando. E fico com apetite para mais pormenores, sejam os relativos às conspirações insidiosas, sejam os reveladores dos “chateaux” glamourosos.