«Se o amor acabasse, todas as cidades se tornariam ilegíveis» – esta é, se não estou em erro, a ideia-chave deste livro de Teolinda Gersão, que junta 14 contos nos quais o amor e a morte são a paisagem e o povoamento das cidades.
As cidades deste livro são Nova Iorque, Lisboa e Berlim; mas podem ser também Roma ou Viena, e nestas histórias a morte de alguém é sentida como a da cidade onde esse alguém vive: «No Caneiro de Alcântara abriu-se uma cratera com dez metros de profundidade. Até que se abriu um buraco no chão e te engoliu. Pouco importa que o tenham tapado depois com terra e deitado flores.» A cidade é o lugar do ciúme: o viúvo procura sinais de infidelidade, mas só encontra bilhetes simples como Senhora Rosa lave por favor as janelas da marquise. Ou o lugar da vingança: a do homem que se vinga da ingratidão da mulher e da sogra, deixando a mulher cega no meio de uma rua onde um carro irá travar mas tarde demais.
Noutro conto é a angústia que surge quando a personagem perde os óculos e, com eles, perde o horizonte visual do neto na praia, acendendo de novo as memórias dolorosas duma morte na família: uma outra criança, muitos anos antes, a arder em febre no corredor sem fim dum hospital.
O conto que dá título ao conjunto acontece num hotel de luxo quando o viajante surpreende duas empregadas da limpeza a contarem uma história de África: numa terra onde uma mulher era acusada de ter «prendido a chuva», veio um homem novo que a visitou na cabana, dormiu e «fez amor com ela», mas, depois, matou-a. E só «então começou a chover». Entre o divórcio e a morte, entre a solidão e o ciúme, só o amor pode salvar as personagens destas histórias que habitam o outro lado das cidades.
Edições Sudoeste
Capa de Henrique Cayatte e Susana Cruz
José do Carmo Francisco
Belo livro, embora não me levasse ao extâse como a sua anterior recolha de contos.
O Venâncio também é um grande fã dela. :)
Sudoeste, não… Sextante.
A editora teve de mudar o nome por questões de registo, outra editora já tinha o nome registado.
isto dos ciúmes é lixado:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1297952
JP,
Essa memória, sempre em forma!
A capa lá está a dizer Sudoeste; a alteração foi posterior à edilão do livro. De qualquer modo a observação merece um registo; temos leitores atentos…
Excelentemente anunciada, a obra! :-))) Fiquei motivadíssima.