Quando lho pediu a juventude inventou-se nacional-revolucionário, um rótulo que parecia cabalístico mas não tinha segredo nenhum. Era o mesmo que ser nacional-socialista, sem o fardo de o parecer. Aqui há tempos andou na televisão, a falar duma ficção recente sua, o retrato retocado dum professor de Finanças muito antigo.
Ponderou-lhe os predicados pitorescos, os cinismos de farsante, as artimanhas de frade. E alargou-se então no que chamou a sua grande inteligência patriótica. Sublinhou que o professor conduzira Portugal à glória dos eleitos. E considerou natural que, durante o seu governo, metade do país passasse fome, e outra metade fosse imolada numa guerra demente.
Achou bem que o país todo vivesse numa escuridão medieval, porque um povo é invencível se tiver a coragem de ser pobre. Isto mesmo decretara o professor. Já existir na Europa, em 1954, um campo de concentração para enjaular adversários políticos, e onde não mais que trinta portugueses foram levados à loucura e à morte, era para o nacional-revolucionário uma simples questão de equilíbrio do mundo.
Dizia ele estas coisas, assim em frente da câmara, sem levantar os olhos do soalho. É de se compreender. Desplantes deste calibre deixam vergonhas na cara, que um verniz ligeiro não disfarça. Tal como as mós de moinho penduradas ao pescoço, fazem peso na cabeça. Mesmo a um confuso nacional-revolucionário.
Jorge Carvalheira
Se fosse só ele o “confuso”, ainda a coisa iria bem… mas, vá lá, poupou-nos um ataque de esguelha ribanceira abaixo na Cova da Iria.
eu sei que nem precisa. talvez o saiba, mas deixe que lhe diga. gosto,ainda não tenho exemplo contra, de tudo o que lhe leio…por aqui
Meu Caro Jorge
Muito bom, o texto.
Agora permite-me que ladeie pela última vez.
Fui sincero quando disse que o coice não doeu. Depois, pus-me a analisar os factos, e percebi que tinhas razão. Foi a vez de eu dar um coice em mim mesmo. Então doeu.
No entanto, um texto não vale apenas pelo que traz escrito, mas também pela imaginação a que leva. E o teu, do padre Júlio, por exemplo, fez-me pensar no “meu” padre Vicente e daí partir para a ideia de um romance. Que cada vez ganha mais consistência. E que, por ter nascido indirectamente de onde nasceu, te será dedicado. A não ser que mo proíbas.
Um fraternal abraço.
Daniel
Caro Daniel
E pois que nenhum de nós tem vergonha de ser gente, assim de cara descoberta, (esse estranho pudor que vitima os caras pálidas) acende comigo o cachimbo da paz. Mesmo se apanhaste por tabela.
Tanto destemor de cara destapada que até emurchece os testículos às testemunhas ó que lares dos teus escritos muito reveladores…
Vá, conta lá essa tua eventura de enfrentares um padre com um cajado e teres levado a melhor.
Somos todos oubidinhos…
Meu Caro e muito apreciado Jorge
Embora eu não tenha desenterrado o tomahawk (que Manitu me proteja!), com muito gosto fumarei do teu cachimbo ou um Português Suave.
Um abraço do recente, mas convicto admirador
Daniel