Impostores sem credibilidade alguma.
«O eurodeputado Paulo Rangel considera que, neste momento, Portugal “tem uma credibilidade externa que lhe permite ser visto e compreendido pelos responsáveis pelo programa de financiamento de forma diferente daquela com que era visto em 2011”. »
Agora em francês: “Tiens!”
Insinua Rangel que, em 2011, presume-se que no primeiro semestre, claro, o governo português de então, esbanjador e sem tino, desrespeitava sistematicamente os programas de contenção orçamental e que a irresponsabilidade era tanta que o país perdeu a credibilidade (presume-se que a perda já vinha a acontecer desde 2005), não tendo os credores outro remédio senão fechar a torneira e pôr ordem no recreio, tal o desvario de gastos. Ora, quem melhor do que os estarolas da São Caetano, mancomunados com os patos bavos deste país e tranquilos com o estatuto de Vítor Gaspar, para a árdua missão, não é, Paulo Rangel? Agora sim. Com um milhão de desempregados, uma diminuição acentuada dos rendimentos das famílias, a fuga dos portugueses mais qualificados, a subida generalizada dos impostos e, apesar disso, uma quebra colossal na receita fiscal, tão colossal que a meta do défice não será cumprida, e ainda o agravamento da dívida muito para lá do esperado, a credibilidade é total. Somos finalmente credíveis! Não vamos reestruturar a dívida como os gregos nem desrespeitar as metas como eles nem adotar novas medidas de austeridade que agravarão a recessão. Nada. Somos credíveis, assistidos mas credíveis. Ou credíveis porque assistidos? A virtude que Paulo Rangel vê nesta situação escapa-me.
Pois bem, Portugal era um país totalmente credível em Março de 2011. Tão credível que a União Europeia aprovou o quarto plano de estabilidade do governo Sócrates e declarou-se disposta a apoiar o país por todos os meios de modo a que não seguisse o caminho da Grécia e se colocasse aqui uma barreira no dominó de países sujeitos a tombar. Quem destruiu a chamada credibilidade foi a oposição com o chumbo do referido plano e a instabilidade política criada antes disso, que se traduziu, por exemplo, no chumbo de toda e qualquer medida de contenção orçamental (recordo apenas o corte das transferências para a Madeira, a reforma da carreira docente, a subida do IVA para produtos excessivamente calóricos, como o leite achocolatado, mas o peru do festim foi muito mais recheado).
O que falta a esta gente para ser, ao menos, um pouco honesta? Porque não diz Paulo Rangel, um homem que se assume católico, que as condições em que Sócrates governou a partir de 2009, em minoria na Assembleia, sem coligação nem acordos de governo e sem o apoio de Cavaco, o principal urdidor do plano de assalto ao poder do PSD, tornou a redução da despesa literalmente impossível? E que tudo se deteriorou após o chumbo do PEC 4?
A única credibilidade do país neste momento em que todos os indicadores económicos se agravaram, com exceção das importações, que diminuíram, mas pelos maus motivos, ou seja, porque não há poder de compra, é a inventada por pessoas como Rangel e seus correligionários e sustentada pela Troika, que não tem qualquer interesse em reconhecer o fiasco do seu programa. Um programa que, convém referir, o primeiro-ministro assumiu como seu. O regresso aos mercados e a dispensa da Troika só será possível depois de uma reviravolta na política europeia e no papel do BCE, que era por onde se devia ter começado, poupando-nos a este triste espetáculo do Relvas e companhia, cuja única missão, essa sim, é entregar grandes empresas aos amigos e depressa, antes que o vento mude e os negócios fujam.